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Cinema

- Publicada em 08 de Junho de 2017 às 23:13

Em busca do ouro

James Gray tinha 25 anos quando recebeu, em 1994, um Leão de Prata no Festival de Veneza por seu primeiro longa-metragem, Fuga para Odessa. Os filmes que realizou depois, mesmo não obtendo a mesma repercussão, revelaram um narrador seguro e empenhado em colocar na tela algo bem acima das propostas rotineiras. O novo filme do diretor, Z - A cidade perdida, coloca o nome do cineasta entre os merecedores de toda a atenção. O filme foi exibido oficialmente e fora do concurso no Festival de Berlim deste ano, o que certamente é um sinal de que o diretor começa a ingressar no grupo dos destacados pelas mostras internacionais, sempre um caminho para que realizadores de talento não sejam esquecidos. Numa época em que o cinema é dominado por concessões à superficialidade é importante que cineastas empenhados em manter o interesse por temas que permitam variações esclarecedoras sobre as complexidades da aventura humana tenham espaço e oportunidade. Relatando a trajetória do coronel Percy Fawcett, que desapareceu junto com o filho em 1925 na última tentativa de encontrar a prova de que na Amazônia existiu, antes da chegada dos europeus, uma civilização avançada, que estaria representada e sintetizada numa cidade dourada. O filme tem sido tratado apenas como se fosse uma biografia do cartógrafo e militar britânico, o que certamente não deixa de ser, mas permanecer apenas no conteúdo manifesto de tal narrativa é afastar-se do essencial e do que o filme tem de mais interessante.
James Gray tinha 25 anos quando recebeu, em 1994, um Leão de Prata no Festival de Veneza por seu primeiro longa-metragem, Fuga para Odessa. Os filmes que realizou depois, mesmo não obtendo a mesma repercussão, revelaram um narrador seguro e empenhado em colocar na tela algo bem acima das propostas rotineiras. O novo filme do diretor, Z - A cidade perdida, coloca o nome do cineasta entre os merecedores de toda a atenção. O filme foi exibido oficialmente e fora do concurso no Festival de Berlim deste ano, o que certamente é um sinal de que o diretor começa a ingressar no grupo dos destacados pelas mostras internacionais, sempre um caminho para que realizadores de talento não sejam esquecidos. Numa época em que o cinema é dominado por concessões à superficialidade é importante que cineastas empenhados em manter o interesse por temas que permitam variações esclarecedoras sobre as complexidades da aventura humana tenham espaço e oportunidade. Relatando a trajetória do coronel Percy Fawcett, que desapareceu junto com o filho em 1925 na última tentativa de encontrar a prova de que na Amazônia existiu, antes da chegada dos europeus, uma civilização avançada, que estaria representada e sintetizada numa cidade dourada. O filme tem sido tratado apenas como se fosse uma biografia do cartógrafo e militar britânico, o que certamente não deixa de ser, mas permanecer apenas no conteúdo manifesto de tal narrativa é afastar-se do essencial e do que o filme tem de mais interessante.
O painel criado por Gray, cujo roteiro foi escrito pelo diretor a partir de um livro do americano David Grann, é bem mais amplo do que uma reconstituição de fatos. O cineasta não esconde sua admiração por Aguirre, a cólera dos deuses e Fitzcarraldo, de Werner Herzog, e Apocalypse Now, de Francis Ford Coppola, e talvez tenha visto O abraço da serpente, do colombiano Ciro Guerra. Desses filmes derivam o tema do encontro do homem dito civilizado com suas origens e das descobertas e conflitos resultantes. A vida de Fawcett permitiu ao cineasta falar sobre isso de forma bem clara. O filme não se limita a focalizar a luta do protagonista na selva, enfrentando os mais diversos obstáculos, pois também dedica parte do tempo a encenar sua vida familiar e seu relacionamento com interesses britânicos na América Latina, entre eles, resolver, pela demarcação da fronteira, um confronto entre Brasil e Bolívia. O cineasta não desenvolve, como David Lean fez em Lawrence da Arábia, a manipulação por interesses de uma potência colonial das obsessões de um indivíduo, que pensa ser o protagonista, quando na verdade é um coadjuvante num palco erguido por interesses maiores. Gray desenvolve o tema de outra forma, transformando seus personagens em símbolos de algo mais amplo e profundo.
Gray sabe ver, no relacionamento do protagonista com a mulher e os filhos, os sinais de que o modelo da Ilíada e da Odisseia, certamente nunca terá suas sugestões esgotadas. A família e a luta pela realização plena de sonhos e ambições são temas claramente expostos e desenvolvidos. Entre a selva e a sociedade que parece desprezar um homem que não soube "escolher seus ancestrais", como observa com maldade e ironia um representante da classe dominante, o protagonista escolhe seu caminho e não vê na sociedade a que pertence como a sua Ítaca. A ilha do repouso para ele não existe. Na última expedição, Ulisses e Telêmaco estão juntos na última aventura. O filme chega ao final ligando pontos extremos, como se os personagens, em vez de realizar uma descoberta, tivessem voltado ao passado. Não é o ouro de uma cidade que encontram, e sim a verdade oculta. O epílogo é certamente um renascimento. Certamente não é por acaso que, para integrar a expressiva faixa sonora do filme o diretor tenha escolhido e empregado, de forma perfeita, em alguns trechos, o Amanhecer, trecho da música escrita por Maurice Ravel para o balé Daphnis et Chloé. Os sinais da sociedade à qual Fawcett pertence aparecem várias vezes durante a ação, outro sinal de que é impossível a fuga da realidade e de que também, como num filme de Kubrick, tudo é um círculo em movimento, e o ponto de partida é sempre reencontrado.
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