Entre as tantas medidas polêmicas defendidas e efetivadas pelo agora presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a que mais tende a impactar o Rio Grande do Sul é a saída do país do Tratado Transpacífico (TPP, na sigla em inglês). A boa notícia é que os desdobramentos devem ser positivos - ou, pelo menos, não mais tão negativos quanto desenhava-se antes da decisão de Trump, no fim de janeiro. Para que as oportunidades se concretizem, porém, especialistas defendem que o Brasil deve buscar acordos com os países afetados.
"Em um primeiro momento é bom, pois tirou-se o bode da sala. Com isso, diminui a possibilidade de perda para o Brasil no comércio exterior, especialmente para o agronegócio", argumenta a advogada Vera Kanas, responsável pela área de Comércio Internacional do escritório TozziniFreire. Os produtos agrícolas, que representam mais da metade da pauta exportadora do Rio Grande do Sul, temiam o TPP pela presença não só dos Estados Unidos, mas também de países como o Canadá e a Austrália (6º e 12º maiores exportadores agrícolas, respectivamente), que passariam a ter acesso livre a vários mercados.
A maior ameaça, porém, era mesmo o país governado por Trump, hoje o único que exporta mais produtos agrícolas do que o Brasil, além de ser nosso principal concorrente na venda de grãos. "Tivemos muita sorte de os Estados Unidos terem voltado atrás nessa posição", comenta o analista de Relações Internacionais da Farsul, Renan dos Santos. O especialista argumenta que, entre os produtos gaúchos, o milho teria sido um dos mais afetados por um TPP com a presença norte-americana. Mesmo que os Estados Unidos já vendam o grão aos países do bloco, o acordo praticamente fecharia as fronteiras para boa parte das poucas exportações do milho gaúcho.
Efeito semelhante aconteceria na soja, embora o principal comprador da oleaginosa gaúcha, a China, não faça parte do TPP. Já nas carnes, em especial a bovina, os efeitos ainda poderão acontecer, segundo Santos, embora muito menores do que poderiam ser sem a desistência dos norte-americanos. O motivo é a presença da Austrália, país exportador da proteína. "É ruim nesse sentido, mas, perto do que prometia ser, torna-se apenas mais um acordo entre vários outros que não participamos e que causam prejuízo na competição", argumenta o analista da Farsul.
Ambos defendem que, para ocupar o espaço, o Brasil negocie acordos comerciais com os demais países do TPP - que, sem os Estados Unidos, pode acabar nem saindo do papel. Vera cita o México, o Sudeste asiático e países americanos, como Chile, Peru e Colômbia, como alvos. "O que não pode é ficar parado", comenta. Já Santos avalia que, enquanto 13,8% das exportações agrícolas brasileiras têm como destino países do TPP (incluindo os EUA), esse mesmo montante representa apenas 3,8% das importações das nações que assinaram o acordo. "É um mercado muito importante", defende, lembrando que os números estão inflados pela participação dos Estados Unidos.
A incerteza quanto às decisões de Trump, porém, podem afetar o Brasil de outras formas. Na pauta do presidente está a reformulação do Nafta, acordo de livre-comércio entre os três países da América do Norte. Na visão do pesquisador da Fundação de Economia e Estatística (FEE), Bruno Jubran, o movimento pode ser benéfico a alguns setores, uma vez que os Estados Unidos poderiam se voltar com mais força aos insumos brasileiros. Outro ponto é que, ao contrário da esmagadora maioria dos países, o Brasil tem déficit na balança comercial com os Estados Unidos - importa mais do que exporta produtos para lá. "Por isso, a tendência é de não enxergarem o Brasil como um problema, e pode haver o interesse do País em buscar equilibrar essa relação", comenta Jubran.
Já quando se olha para o México, principal alvo dos ataques de Trump até o momento, a situação é mais complicada. "É um parceiro considerável, mas duvidoso", classifica o pesquisador da FEE. O motivo é que 90% das exportações do país tem o poderoso vizinho como destino. Sem o Nafta, portanto, é provável que o México perdesse capacidade financeira para importações. Por outro lado, é natural que os hispânicos busquem outros mercados.