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Teatro

- Publicada em 23 de Fevereiro de 2017 às 22:59

Pode ser sucesso, mas precisa ser repensado

Uma das estreias do Porto Verão Alegre foi O que terá acontecido a Baby Jane?, original de Henry Farrell (1960), logo transformado em filme, de Robert Aldrich (1962), com Betty Davis e Joan Crowford. No momento, o texto, enquanto peça teatral, cumpre temporada em São Paulo, nas interpretações de Eva Wilma e Nicette Bruno. O filme, em preto e branco, foi um sucesso inolvidável enquanto thriller psicológico e assim tem-se mantido.
Uma das estreias do Porto Verão Alegre foi O que terá acontecido a Baby Jane?, original de Henry Farrell (1960), logo transformado em filme, de Robert Aldrich (1962), com Betty Davis e Joan Crowford. No momento, o texto, enquanto peça teatral, cumpre temporada em São Paulo, nas interpretações de Eva Wilma e Nicette Bruno. O filme, em preto e branco, foi um sucesso inolvidável enquanto thriller psicológico e assim tem-se mantido.
O diretor Zé Adão Barbosa optou, para a sua releitura, em formar um elenco masculino, portanto, travestido, para as figuras centrais de Blanche (alguma alusão à peça de Tenesse Williams?) e Jane Hudson (Baby Jane), ao lado da arrumadora semanal da casa: João Carlos Castanha assumiu a figura sinistra de Baby Jane, enquanto Lauro Ramalho tornou-se a aparentemente indefesa Blanche, e Caio Prates incorporou a empregada, além de também interpretar o agente que vem visitar Jane. Ora, o simples fato de o diretor assumir uma versão travestida com os atores que são absolutamente conhecidos da plateia e que consolidaram modos de atuação conduz a receptividade do espetáculo ao nível da comédia, queira ou não o diretor. Então não adianta antecipar-se que é uma encenação a sério, dramática etc.
Claro que é a sério: comédia é coisa séria. E claro que é dramática: o enredo é tenso: trata-se de um embate de morte entre duas personagens radicalmente apaixonadas por si mesmas. Mas Zé Adão Barbosa, que se tem evidenciado tanto um excelente diretor de dramas sérios quanto de comédias escrachadas ou sutis, aqui ficou numa indecisão que, de certo modo, lhe é fatal. Ou melhor, é fatal para o espetáculo. Não há como se falar em drama sério com este elenco! Veja-se o exemplo que nos dá Hotel Rosashock, de Patsy Cecato. A dramaturga reescreveu seu próprio texto enquanto paródia da obra original. Zé Adão poderia fazer o mesmo a partir do texto-filme originais, com absoluta legitimidade. Aliás, Luís Artur Nunes e Caio Fernando Abreu fizeram excelentes experiências neste campo, com o chamado romance folhetim gótico, como em A maldição do Vale Negro. Isso não diminui em nada a qualidade de um trabalho. A paródia, pelo menos desde o início do século XX, e sobretudo depois da popularização dos estudos de Bakhtin, é reconhecida enquanto um processo altamente criativo e respeitável. Mas Zé Adão precisava definir-se claramente por uma linha de ação. Ao optar por um pretenso drama sério, mas trabalhado por um elenco travestido, ele criou dois registros de referência para o público. Ora, como assistimos ao espetáculo ainda nas suas primeiras apresentações, é possível que o trabalho ganhe ritmo e definição na linha dramática. Mas, do que assistimos, a impressão deixada foi de um ensaio canhestro em que os atores ainda não dominam completamente o texto, e a direção carece de controle do ritmo do espetáculo, que anda por vezes muito bem, mas que em outros derrapa e se perde, quase parando, como se numa gravação de 45 RP a gente a ouvisse em 33 rotações.
Farrell por certo descobriu um filão ao intitular uma obra como O que terá acontecido a Baby Jane?. Basta ver em sua biografia que este trabalho, de 1960, foi seguido, sucessivamente, por How awful about Allan? (1963), What happened to Cousin Charlote? (1964) e What's the matter with Helen? (1971). Do mesmo modo, Zé Adão tem obtido extraordinário sucesso com excelentes comédias e, muitas vezes, com pastiches ou besteiróis, sem que isso manche em absoluto sua história de direção ou de dramaturgo. O que não pode é ficar indefinido, e aqui, esta indefinição lhe custa caro. Isso pode ser reorganizado? Sem dúvida: acho que esta espécie de pré-estreia no Porto Verão Alegre garante tempo e espaço para um repensar o espetáculo. Sua linha geral está dada. Os atores têm definidas as suas personagens: há que repensar dramaturgicamente o espetáculo, e certamente teremos um extraordinário sucesso no palco. O enredo é excelente, os atores têm tradição e sabem como propor leituras ambíguas de certas situações. Aliás, o público sabe, tanto que, muitas vezes, num espetáculo pretensamente sério, a plateia caiu na gargalhada. Na atual situação, isso evidencia o equívoco do espetáculo. Com uma pequena correção, isso se transformará no sucesso absoluto do mesmo. Boa sorte.
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