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Mobilidade

- Publicada em 14 de Outubro de 2016 às 17:55

Usuários da Capital criticam o sistema de transporte coletivo

Passageiros reclamam de espera, superlotação e desconforto;  em 20 anos, 10 milhões saíram do sistema

Passageiros reclamam de espera, superlotação e desconforto; em 20 anos, 10 milhões saíram do sistema


MARCELO G. RIBEIRO/JC
Demora, superlotação, equipamentos que deixam a desejar e comportamento inadequado de parte dos profissionais são reclamações comuns entre usuários do sistema de transporte coletivo da Capital - motivos que explicariam, em parte, por que 10 milhões de pessoas deixaram de andar de ônibus em Porto Alegre nos últimos 20 anos. "Recentemente, houve aumento no preço das passagens, mas o serviço continua péssimo", observa a dona de casa Neiva Rosa Cardoso.
Demora, superlotação, equipamentos que deixam a desejar e comportamento inadequado de parte dos profissionais são reclamações comuns entre usuários do sistema de transporte coletivo da Capital - motivos que explicariam, em parte, por que 10 milhões de pessoas deixaram de andar de ônibus em Porto Alegre nos últimos 20 anos. "Recentemente, houve aumento no preço das passagens, mas o serviço continua péssimo", observa a dona de casa Neiva Rosa Cardoso.
"Uso transporte coletivo de uma a duas vezes por semana, para ir ao hospital, onde faço tratamento de reumatismo. Mas me estressa demais - imagina o que não sofre quem precisa ir trabalhar diariamente", completa Neiva. A maior queixa da dona de casa é ter que esperar cerca de uma hora e meia para embarcar em uma das linhas de ônibus que atendem ao bairro Lomba do Pinheiro, onde mora, rumo ao Centro da cidade. "Todas são muito demoradas", protesta.
Dona Neiva não está sozinha: a vendedora autônoma Janaice Gonsalves Franco, que enfrenta duas viagens de ônibus todos os dias, avalia que a passagem está muito cara, sem que tenha ocorrido de fato alguma melhoria no sistema de transporte coletivo. "As linhas não cumprem a tabela de horários, os ônibus estão sempre cheios de gente, e a grande maioria dos veículos não tem ar-condicionado, ao contrário do havia sido anunciado no início do ano." Moradora do Morro da Cruz, Janaice conta que é comum ela ter que aguardar mais de 40 minutos na parada até que venha um coletivo. "Depois que se entra no veículo, a viagem é sem nenhum conforto - definitivamente não vale o custo-benefício", opina.
Em 2016, apesar do aumento da frota - exigência da prefeitura por conta da licitação que definiu a atual participação das empresas privadas, responsáveis por 75% das linhas que atendem a população da cidade -, a queda do número de passageiros foi de 7,35% durante o dia (segundo as companhias - enquanto o índice da EPTC aponta 6%) e 14% à noite (a soma equivale a 5 milhões de pessoas) nos primeiros seis meses.
"Foi uma retração drástica", admite o engenheiro de transporte do Consórcio Viva Sul, Antônio Augusto Lovatto. "Desde 2001, o volume de usuários vinha diminuindo, em média, cerca de 1,5% por ano." Já os números da EPTC acusam que a insatisfação vem aumentando gradativamente, a contar pela debandada de passageiros dos últimos quatro anos: "Tivemos quedas variadas neste período: em 2012, a redução foi de 2,9% no volume de usuários, enquanto em 2013 esta perda representou 3,03%. Em 2014, a retração foi de 4%; e em 2015 caiu para 1,93%", diz o diretor-presidente da EPTC, Vanderlei Cappellari.
Crise econômica e desemprego seriam os principais motivos para a diminuição da demanda, visto que neste ano a baixa bateu recorde histórico, segundo avaliação do diretor executivo da Associação de Transportadores (ATP) de Passageiros, Gustavo Simionovschi. Considerando o recente investimento conjunto de R$ 120 milhões para a aquisição de 296 veículos novos, as empresas privadas - que tiveram que buscar recursos no mercado, segundo Simionovschi - sentiram o impacto na receita de janeiro a junho. Somente no primeiro semestre, o prejuízo chegou a R$ 52 milhões.
Deste montante, R$ 12 milhões são perdas de receita da Carris, empresa pública responsável por 25% das linhas de ônibus que percorrem Porto Alegre, que também perdeu passageiros pagantes. "Isso tem repercutido em prejuízos", confirma o diretor-presidente da Carris, Sérgio Zimmermann. "Além da crise econômica, também o medo gerado pela falta de segurança em toda a cidade tem contribuído para a queda do volume de passageiros que embarcam nos coletivos à noite"..
"A tarifa é abusiva", dispara o pedreiro Carlos Eduardo Brum, que não recebe nenhum subsídio para usar o sistema de transporte. Na opinião de Brum, os veículos adquiridos pelas empresas em fevereiro, que já circulam pela cidade, não passam de uma "maquiagem" no sistema. "Cada linha colocou no máximo dois ou três ônibus novos. É muito comum entrar em veículos com bancos soltos e sem ar-condicionado", reclama. Ele também observa que é comum a "falta de respeito" dos motoristas com os passageiros idosos. "Muitas vezes, mesmo com o usuário dando sinal na parada, eles passam reto e não param para que ocorra o embarque."

Para os empresários, tarifa está defasada em R$ 0,45

Passageiros reclamam de espera, superlotação e desconforto;  em 20 anos, 10 milhões saíram do sistema

Passageiros reclamam de espera, superlotação e desconforto; em 20 anos, 10 milhões saíram do sistema


MARCELO G. RIBEIRO/JC
Na opinião dos empresários do sistema de transporte coletivo de Porto Alegre, a tarifa está "defasada", porque atualmente 35% dos usuários não pagam passagem. "Devido às diversas isenções permitidas por lei, o valor da tarifa deveria ter um acréscimo de R$ 0,45 para cobrir os custos das empresas", argumenta o diretor executivo da ATP, Gustavo Simionovschi.
"Outro fator que gerou prejuízo para as companhias em 2016 foram os 97 dias em que fomos obrigados a cobrar valores antigos, devido a um processo que correu na Justiça", diz ele. "Isso não estava previsto no edital de licitação." Ainda assim, o presidente da ATP concorda que a tarifa atual pese no bolso dos trabalhadores.
Na prática, cada duas pessoas nos coletivos custeiam a viagem gratuita de uma terceira, explica Simionovschi. "É injusto mesmo. A legislação teria que indicar uma outra fonte de receita para cobrir esta isenção, para que a mesma ficasse de fora da tarifa. Neste caso, o valor da passagem poderia ser de R$ 2,75 ou R$ 2,80."
Enquanto a tabela do Sindicato dos Taxistas de Porto Alegre (Sintáxi) cobra R$ 2,59 por quilômetro rodado, com a bandeira 1, e R$ 3,36, na bandeira 2, as empresas de ônibus afirmam gastar R$ 6,78 por cada quilômetro rodado na Capital. "Os veículos ficam muito tempo parados no trânsito. A implementação de novos corredores otimizaria esse sistema de transporte", destaca o presidente da ATP.
"Impactaria positivamente a tarifa, pois o uso do corredor representa menos tempo no trânsito, menos necessidade de veículos e menos custos", concorda o engenheiro de transporte do Consórcio Viva Sul, Antônio Augusto Lovatto. Para ele, as muitas obras inacabadas na cidade e os diversos corredores interrompidos por reformas obrigaram que muitas linhas sofressem desvios.
"Entendemos que, nos próximos meses, vai melhorar. A zona Sul teve quatro anos de obras, e agora estão liberando aos poucos", pondera. Os problemas de demora no trânsito estão ligados diretamente à falta de corredores, reforça o diretor-presidente da Carris, Sérgio Zimmermann. "No momento em que tivermos mais corredores, o custo comercial vai baixar bastante, e iremos poder colocar os carros a cumprir corretamente os horários."
"Será uma economia comercial, afinal, quando a empresa atrasa, gasta mais combustível, e acarreta outros problemas, a exemplo da perda de passageiros", diz Zimmermann. O diretor-presidente da EPTC, Vanderlei Cappellari, descarta reajuste tarifário antes de fevereiro de 2017 e afirma que 24 ônibus já foram retirados das ruas, para adequar a grade de horários e assim reduzir os custos das empresas, sem prejuízos aos usuários.
O gestor lembra que existem 67 quilômetros de corredores de ônibus em Porto Alegre e projeta que, até o final do ano, devem ser inaugurados outros oito, distribuídos na zona Norte e Centro. Não é suficiente, admite Cappellari. "Após esta implementação, iremos avaliar como ficou o tempo de viagem, para contabilizar o que se pode reduzir de frota e, em seguida, realizar outro estudo que definirá o que será preciso adequar."

Novos corredores seriam uma solução parcial

Passageiros reclamam de espera, superlotação e desconforto;  em 20 anos, 10 milhões saíram do sistema

Passageiros reclamam de espera, superlotação e desconforto; em 20 anos, 10 milhões saíram do sistema


MARCELO G. RIBEIRO/JC
Atualmente, exatos 1.715 ônibus de linhas circulam na Capital. Segundo a ATP, a redução de passageiros e a defasagem no valor das passagens criaram um dilema para as empresas. "Esgotaram-se as fontes de recursos para ampliar as melhorias. Daqui a pouco, ou iremos pagar o diesel, ou funcionários", comenta o diretor da associação, Gustavo Simionovschi. "É uma incapacidade financeira que, em breve, nos impedirá de honrar com os compromissos assumidos."
O gestor afirma que, para não aumentar a tarifa, seria necessário, além de corredores, outras ações emergenciais para equilibrar este sistema, como dar prioridade para o transporte coletivo no trânsito, usando em cada vias com três faixas uma exclusiva para ônibus. "Por mais que tenhamos aumentado o número de veículos, continuamos perdendo passageiros. Antigamente, conseguíamos transportar mais pessoas com menos carros, porque o tempo de viagem era mais curto."
Simionovschi também sugere que a isenção para idosos e estudantes, por exemplo, seja custeada via cobrança de uma taxa nos parquímetros. "O automóvel tem um preço social mais alto que o ônibus, polui mais", justifica. "Outra solução seria cobrar pedágios urbanos para carros que passassem por avenidas, como a Mauá", completa o gestor, alegando que a medida pode parecer impopular, mas é justa. "O carro ocupa uma área grande, causando transtorno social. O ônibus transporta mais gente, poluindo menos, e com custo menor", defende.
O diretor-presidente da EPTC, Vanderlei Cappellari, concorda que as isenções prejudicam quando alguns cartões são utilizados erroneamente. "Também podemos discutir a suspensão de algumas isenções ou pelo menos a não concessão de novas gratuidades", considera. "A questão do transporte coletivo é bastante complexa", avalia o engenheiro de transporte do Consórcio Viva Sul, Antônio Augusto Lovatto.
"Tivemos em 2012 o aumento da integração - até então, em meia hora pagava 50% da tarifa; agora, neste período, o usuário que usar dois veículos está isento totalmente no segundo, o que eliminou 9% da receita do sistema", concorda Simionovschi, opinando que Porto Alegre "adotou medidas muito prejudiciais para a sustentabilidade do transporte, que está levando o sistema à falência".
O gestor da ATP alega que o que está na licitação, que foi construída em cima de uma planilha tarifária, foi realizado. "Ninguém previa a crise", emenda, explicando que o contrato prevê o equilíbrio econômico das empresas. O diretor da associação rebate as queixas de usuários afirmando que a EPTC realiza vistoria dos veículos, incluindo os novos, e afirma que o ar-condicionado não é obrigatório, mas que, ainda assim, em oito anos, toda frota deverá ter este equipamento.
A Carris, que adequou suas linhas, criando três novas transversais e excluindo cinco radiais, colocou 50 ônibus novos na rua. "Hoje, nossa frota é de 358 veículos padrão e 58 articulados", calcula o presidente da empresa, Sérgio Zimmermann. Destes, 232 têm acessibilidade universal, 207 têm ar-condicionado, e 276 motor traseiro e câmbio automático. "Com a renovação dos próximos três anos, estaremos atendendo todos os quesitos da licitação, ainda que a Carris receba concessão direta da prefeitura."