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Cinema

- Publicada em 22 de Setembro de 2016 às 22:43

Abandonadas

Há várias maneiras de expor na tela aspectos reveladores de uma sociedade. Entre elas está a de focalizar o universo dos adolescentes. Grandes nomes do cinema, no passado e atualmente, têm praticado a arte de captar perplexidades, dúvidas, anseios e revoltas de personagens em busca de caminhos e abalados pela agressividade e também pela indiferença do mundo adulto. Na essência trata-se do choque entre o novo e o já estabelecido, um conflito que nunca será interrompido e sempre terá como resultado a criação de novos valores.
Há várias maneiras de expor na tela aspectos reveladores de uma sociedade. Entre elas está a de focalizar o universo dos adolescentes. Grandes nomes do cinema, no passado e atualmente, têm praticado a arte de captar perplexidades, dúvidas, anseios e revoltas de personagens em busca de caminhos e abalados pela agressividade e também pela indiferença do mundo adulto. Na essência trata-se do choque entre o novo e o já estabelecido, um conflito que nunca será interrompido e sempre terá como resultado a criação de novos valores.
É fácil, diante de tal embate, falar em decadência e insolência. Mais difícil é a contemplação lúcida de um processo no qual surgem sinais reveladores e durante o qual o antigo cede lugar, sem deixar de ocupar seu espaço, e o novo, quando não se deixa levar apenas pela revolta, termina deixando sua marca. Anita Rocha da Silveira, em sua estreia no longa-metragem, com este Mate-me por favor, aborda tal tema de maneira até certo ponto inédita. Ela radicaliza ao retirar da tela a geração anterior e fazendo suas personagens moverem-se em um mundo que parece só a elas pertencer. Porém, não se trata de um recurso superficial. Tal exclusão exerce um claro papel numa trama durante a qual a violência do mundo exterior surge de forma a revelar uma agressividade que atinge um ponto extremo, aquele no qual a vida humana perde todo e qualquer valor.
Esta é a ideia que move o filme. Se o resultado não eleva o relato até a altura da obra excepcional, tal fato não deve impedir que o filme seja visto como mais um exemplar de uma tendência atual do cinema brasileiro, pelo menos daquele que procura escapar das facilidades e das grosserias. Eis mais um filme nacional que busca personagens reais, mesmo que, no caso, tal tendência seja perturbada por momentos em que alegorias se intrometem na ação e recursos artificiais sejam empregados em certas passagens. Importante ressaltar entre os méritos do filme a utilização do cenário. A Barra da Tijuca com seus prédios cercados pelo vazio se transforma no palco ideal para a história narrada. Os edifícios estão sempre distantes das personagens, pertencem a outro mundo. São edificações transformadas em monumentos que parecem simbolizar uma indiferença de concreto, um cenário desprovido de vida e no qual o único sinal de movimento é o dos carros que passam e expõem o lado mecânico de um mundo distante das personagens do filme.
Mate-me por favor, com suas qualidades e defeitos, é um filme que não deixa de ser um exemplo da importância do cenário quando é de cinema que se fala. É visualmente que o trabalho da realizadora se valoriza. Quanto à questão relacionada a determinado gênero cinematográfico, pode-se afirmar que ela é irrelevante. Qualquer gênero cinematográfico permite uma meditação sobre o mundo e as relações entre pessoas e gerações. Um musical, um drama, um western, uma comédia, um policial, qualquer forma de cinema pode resultar em uma obra de importância. Basta que o realizador tenha a lucidez entre suas virtudes. Se a partir de determinada situação é possível ser construída uma ideia, não importa a qual gênero a narrativa pertença. Interessante, também, no filme de Anita Rocha, é a identificação da personagem central com as vítimas, algo que coloca o filme acima da intriga banal e permite uma meditação sobre tumultos interiores da adolescência. Algumas cenas poderiam ser suprimidas em benefício do filme, pois soam repetitivas, e outras parecem seduzidas por uma irreverência vazia. Mas não há dúvida que estamos diante de um filme que, no lugar do discurso, procura a reflexão. Uma família na qual os pais estão sempre ausentes é um reflexo de um mundo imperfeito e no qual seus habitantes, ameaçados pela ação de um maníaco, procuram sem encontrar uma forma de auxílio. O plano final, mesmo cedendo espaço para a alegoria, deixa claro que a maior violência é aquela na qual o abandono e a indiferença são os males maiores. Um pouco mais de profundidade na criação das personagens e a exclusão de imagens alegóricas transformariam o filme em obra bem superior.
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