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Direito trabalhista

- Publicada em 14 de Julho de 2016 às 14:23

Processos de atuação por contrato verbal chegam a pagar R$ 1 milhão

Santos (d) relata que sofreu ameaça de morte do chefe após demissão

Santos (d) relata que sofreu ameaça de morte do chefe após demissão


MARCO QUINTANA/JC
Diariamente, o advogado Jamil Abdo recebe em seu escritório, Abdo Advogados, pessoas contando histórias semelhantes: trabalharam por um período a partir de contrato meramente verbal e não tiveram seus direitos garantidos pelo empregador. De um lado, encontra-se o empresário, buscando evitar o pagamento de impostos que dobram o custo de um funcionário para o estabelecimento. De outro, está o contratado, muitas vezes com recursos financeiros precários e urgência em ganhar dinheiro. O resultado dessa junção, muitas vezes, é um processo trabalhista que chega a gerar indenizações na ordem de R$ 1 milhão.
Diariamente, o advogado Jamil Abdo recebe em seu escritório, Abdo Advogados, pessoas contando histórias semelhantes: trabalharam por um período a partir de contrato meramente verbal e não tiveram seus direitos garantidos pelo empregador. De um lado, encontra-se o empresário, buscando evitar o pagamento de impostos que dobram o custo de um funcionário para o estabelecimento. De outro, está o contratado, muitas vezes com recursos financeiros precários e urgência em ganhar dinheiro. O resultado dessa junção, muitas vezes, é um processo trabalhista que chega a gerar indenizações na ordem de R$ 1 milhão.
"São processos polêmicos, pois precisamos provar o vínculo empregatício do cliente. Infelizmente, são muito comuns. Todos os dias, recebemos visitas de pessoas dizendo que trabalharam por um tempo determinado para fulano e que o acordo era verbal, o dinheiro era pago semanalmente ou mensalmente e não havia nenhum tipo de documento", relata Abdo. O funcionário só percebe o problema da ausência de garantias quando fica doente e precisa da Previdência Social, ou quando não tem condições de comprar comida e sente falta de um vale-alimentação, por exemplo.
Para o advogado, o trabalho informal, ou "frio", é prejudicial ao governo, que não tem condições de mensurar quantas pessoas trabalham de forma clandestina; ao trabalhador, que não conseguirá se aposentar devido à falta de provas de atuação profissional naquele período e não estará protegido por garantias trabalhistas; e à família do trabalhador, que não terá seus direitos assegurados caso aconteça algo com o funcionário. "É muito comum, pois os impostos pagos por um assalariado são elevadíssimos. Então, o empregador pensa: vou contratar essa pessoa informalmente, não recolho previdência e me custa muito mais barato. Porém, o dano social é muito grave", destaca.
Os principais alvos da sonegação de direitos em casos irregulares de trabalho informal são pessoas de classes mais baixas. "Há uns 15 anos, havia mais desrespeito, mas, com o tempo, a classe empresarial passou a assinar a carteira e respeitar as leis. É difícil hoje um empresário desrespeitar totalmente as leis trabalhistas, mas acontece, entre os mais desassistidos", observa Abdo.
Grande parte das pessoas não procura a Justiça - e, quando procura, é por questões pessoais. "Trabalho há 30 anos com isso e, quando pessoas sem carteira assinada e que às vezes trabalham até mesmo em regime de escravidão são demitidas, mas o empregador dispensou de forma educada, eles não colocam na Justiça, por simpatia. O trabalho de rescisão do contrato influencia na possibilidade de haver reclamatória ou não", aponta o advogado. O aspecto pessoal, envolvendo mágoas com o empregador, tem mais importância do que o técnico, na hora de o funcionário definir se entrará com processo ou não.
Essa visão é compartilhada pelo juiz Rodrigo Trindade de Souza, presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da IV Região (Amatra IV), que recorda um estudo feito pelo Sindicato das Secretárias em São Paulo, no qual foi constatado que 90% das profissionais já haviam sofrido assédio sexual. "Quantas delas de fato entraram com uma ação na Justiça e pediram indenização? Uma parcela muito pequena. O processo trabalhista é como iceberg: o que está fora d'água são os pedidos das partes, mas a mágoa, os problemas que elas enfrentaram ficam submersos. Quando essa parte submersa é muito grande é que sai para fora e se torna um processo trabalhista e, aí, surge a oportunidade de pleitear outras verbas que normalmente não seriam pedidas", avalia.
Devido ao baixo percentual de processos dentro do panorama total de casos de desrespeito às normas trabalhistas e também à dificuldade de provar assédio moral e sexual, Trindade considera fundamental que o Judiciário reprove a conduta e faça condenações exemplares, para dar o exemplo a outros empregadores.
"Assédios morais e sexuais não costumam ser documentados, pois sempre são feitos a portas fechadas. A prova se dá, normalmente, com documentos testemunhais. Quando conseguimos provar, é essencial haver uma reprovação coletiva, para inibir casos do tipo. Até por isso as condenações costumam ser tão altas", reflete.

Vendedor desenvolveu quadro de depressão por assédio moral

Um caso de processo em andamento que calcula indenização de quase R$ 1 milhão envolve o vendedor José Vilson Pereira dos Santos, de 53 anos. Entre 2011 e 2014, Santos atuou como trabalhador informal em uma empresa de venda de aparelhos de massagem, em Viamão. "Começou muito bem, com promessa de assinatura de carteira, mas, com o passar do tempo, as coisas foram piorando. Quando eu tinha uma semana com menos vendas, era julgado, comparado com outros colegas na frente deles. Muitas vezes, saí chorando", recorda.
Enquanto isso, o vendedor era enviado para viagens de até três semanas. Nesses períodos, preocupava-se com sua esposa, depressiva e esquizofrênica. Desde então, Santos passa por quadro de depressão e síndrome do pânico, tendo que ser medicado com Bromazepam e Pondera. "Era uma pressão muito grande, desumana, não só comigo, mas também com os meus colegas", ressalta.
Em outubro de 2014, o vendedor pediu demissão. Santos conta que chegou a ser ameaçado de morte por seu empregador, quando anunciou que entraria com um processo contra ele. Depois, ofereceu R$ 5 mil para a rescisão do vínculo empregatício. "Cogitei aceitar, mesmo sabendo que os valores seriam bem maiores, porque sei da morosidade da Justiça e tinha medo que ele fizesse algo contra mim. Mas, depois, resolvi enfrentar o processo. Ainda há muita ignorância do brasileiro sobre quais são seus direitos e os patrões aproveitam, isso não pode acontecer", critica.
O processo já dura quase dois anos e passou por duas instâncias, com Santos e Abdo, seu advogado, vencendo nas duas. Ficou comprovado que havia vínculo empregatício. "Conseguimos agora que fossem feitos os cálculos e estamos esperando que o juiz homologue os valores apresentados pelos peritos", relata Abdo. Feita a concordância, será iniciada a etapa de cobrança dos valores devidos.
Como o ex-empregador de Santos transferiu a empresa e suas posses para o nome de terceiros, será necessária a investigação do desvio de patrimônio, para partir para a penhora dos bens. "Chega a ser infantil essa atitude, pois é fácil de comprovar. Vai levar um tempo a mais, mas conseguimos arrecadar esse patrimônio", garante o advogado. A previsão é que a obtenção do montante leve mais dois anos para acontecer.