As marcas mais lembradas e preferidas de
gestores e formadores de opinião do RS.

Todas as marcas com prop�sito se parecem, cada marca sem prop�sito � despropositada a sua maneira



Felipe Schmitt-Fleischer Felipe Schmitt-Fleischer
Diretor de Branding da SPR Brand, [email protected]
Uma recente edição da Advertising Age alertou para uma mudança na temática das campanhas de grandes marcas. O exemplo foi a Coca-Cola. A nova linha de comunicação da companhia tem foco mais em produto (assinando "Taste the Feeling") e menos no conceito (o anterior "Open the Happiness").
Outras marcas vão na mesma direção: mostram o que seu produto faz pelas pessoas em detrimento do que a marca defende.
Esta discussão pode lembrar o livro Cachorros de Palha, de John Gray. Para ele,primeiro através da religião e depois do humanismo construímos uma (falsa) ideia de que os seres humanos são especiais e através do progresso e da ciência temos um propósito no mundo. Conforme o título, não passamos daqueles cachorros de palha utilizados em cerimônias chinesas. Assim que passado o ritual, todareverência que mereciam desaparece, não sendo mais necessários são pisoteados e jogados fora pelo planeta. Para Gray, o ser humano não precisa de propósitos. Nenhum outro animal, dos quais pouco nos diferenciamos, os tem. Não bastaria o propósito da vida ser apenas ver e contemplar, sem maiores pretensões?
E as marcas, será que elas precisam de fato de propósitos? A partir do pressuposto de Gray, parece que a resposta é negativa. Seriam elas também meros cachorros de palha? Uma abordagem mais pragmática, direta e sincera voltada ao produto bastaria. Afinal, a marca está aqui apenas para matar a sua sede, não para torná-lo mais feliz. No entanto, os propósitos das marcas surgiram para humanizar o branding e conquistar mais pessoas.
Qual a profundidade destes propósitos? Rasos ou intensos? Vernizes sobre estruturas voltadas ao lucro crescente ou mandatários nas decisões, inclusive as que envolvem ganhar menos dinheiro? Certa vez, durante uma entrevista, questionaram o empreendedor e alpinistaYvon Chouinard, fundador da marca Patagonia, se ele via algum paralelo seu com Steve Jobs, da Apple. A resposta foi direta:"Definitivamente, não!" Como poderia se comparar a uma empresa que faz um produto como o iPhone? Um telefone praticamente impossível de consertar, pois o que querem na verdade é que você compre um novo no ano seguinte. A Apple segue o mesmo "propósito"de muitas outras marcas, fazer você chegar logo na flagship store mais próxima para movimentar o consumo sem limites.
John Izzo defende que ter um propósito na vida é um dos cinco segredos que deveríamos descobrir antes de morrer. A vida se torna mais plena, rica e significativa. Talvez para as marcas o caminho seja o mesmo. Para algumas, os supostos "propósitos" nascem por crise de identidade (e consciência), em outras por necessidade de mimetismo da categoria (se o concorrente faz, digo eu também!). Por fim, em poucas, por formação, história e crenças profundas. Umas autênticas. Outras nem um pouco. Para estas qualquer balanço na tendência pode significar a adoção deuma outra abordagem. Para as convictas, o propósito precede o cenário, assim permanece. São semelhantes na força de suas crenças. Invariavelmente, todas marcas com propósito se parecem, mas cada marca sem propósito é despropositada a sua maneira.

Publicado em 28/03/2016.