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Direitos humanos

- Publicada em 16 de Março de 2016 às 22:44

Falta de identificação gera sofrimento a crianças negras

 ENTREVISTA COM OS FUNDADORES DO  PROJETO SURFAR.    NA FOTO: CRIANÇAS APRENDENDO A ESCREVER.

ENTREVISTA COM OS FUNDADORES DO PROJETO SURFAR. NA FOTO: CRIANÇAS APRENDENDO A ESCREVER.


MARCO QUINTANA/JC
Porto Alegre recebeu ontem o 4º Seminário Regional Direitos da Criança e do Adolescente e a Promoção da Igualdade Racial. As outras edições do evento ocorreram em Recife, São Paulo e Belém. As mesas de debates, realizadas no auditório do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), se propuseram a apontar os problemas por que passam as crianças negras e como promover a igualdade social entre elas. Segundo as entidades ali presentes, essas crianças não se identificam com o que é ensinado e mostrado a elas nas escolas, o que gera sofrimento.
Porto Alegre recebeu ontem o 4º Seminário Regional Direitos da Criança e do Adolescente e a Promoção da Igualdade Racial. As outras edições do evento ocorreram em Recife, São Paulo e Belém. As mesas de debates, realizadas no auditório do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), se propuseram a apontar os problemas por que passam as crianças negras e como promover a igualdade social entre elas. Segundo as entidades ali presentes, essas crianças não se identificam com o que é ensinado e mostrado a elas nas escolas, o que gera sofrimento.
A psicóloga Shirley Santos, do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), que organiza o evento, revela que a entidade considera discriminação racial uma forma de maus-tratos às crianças negras. "É importante fazer rodas de conversa e levar mais conteúdo sobre a história da África às escolas, para que a criança se veja de maneira mais positiva. Ela precisa desenvolver uma identificação mais positiva", explica.
O preconceito é reproduzido nas relações entre as crianças, segundo Shirley. "Às vezes, percebemos que crianças brancas têm uma relação mais autoritária com seus colegas negros. Em uma brincadeira, por exemplo, se há um médico e um empregado, ou um executivo e um motorista, as crianças brancas não deixam as crianças negras serem o médico ou o executivo", relata. O tratamento desigual e os casos de agressões físicas e verbais causam, conforme a psicóloga, danos psíquicos.
Susane Souza, representante da Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB), observa diferenças no cotidiano das crianças negras. "Elas sofrem muito com o racismo, pois impacta no seu dia a dia na escola e em casa, e também com a questão social, uma vez que muitas pertencem às classes pobres e vivem em locais extremamente vulneráveis, com pouco acesso à educação e à saúde", destaca.
O trabalho, na opinião da ativista, deve se dar em escolas, unidades de saúde, atividades de turno inverso e em casa. "As crianças não conseguem se ver, se identificar, e sofrem com isso. É importante que os pais digam: 'eu sou negro, e tu és meu filho, também negro. Tu és lindo, és inteligente e tens os mesmos direitos das outras crianças. A única diferença é a cor da pele, só isso'. Assim, a criança estará mais preparada para lutar contra todas as formas de preconceito que surgirão", pondera.
Respeitar a Lei Federal 10.639, que torna obrigatório o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas, também é considerado fundamental por Susane. "Esses pequenos detalhes, em um somatório geral, ajudarão a amenizar a dor da criança por não ver sua representatividade", opina.

Discriminação gera evasão escolar

Na opinião de Maria Regina Fay de Azambuja, coordenadora do Centro de Apoio Operacional Infância e Juventude do MP-RS, urge a necessidade de pôr em prática nos currículos escolares a questão da discriminação racial, já prevista nos planos nacional, estaduais e municipais de educação e na Lei de Diretrizes e Bases (LDB). "A falta dessa temática nos currículos gera problemas de abandono escolar, trabalho infantil e outras situações de exclusão. Felizmente, neste momento, sinto que a sociedade começa a voltar o olhar para essa parcela da população, até então um pouco esquecida", enfatiza. O MP-RS ainda não possui ferramentas para levantamento de dados específicos relativos a racismo, muitas vezes relacionados com violência física ou doméstica.
Para o secretário estadual de Educação, Vieira da Cunha, a escola é o local adequado para transmitir aos jovens, com sua personalidade em formação, princípios de boa convivência e respeito às diferenças. "O olhar atento do professor ao desempenho da criança pode revelar situações de discriminação e violência doméstica. Essa relação permanente da escola com a família é fundamental para a proteção das crianças. O racismo é uma forma cruel de maus-tratos, é submeter a criança a um processo discriminatório que a sociedade não pode tolerar", defende.