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Teatro

- Publicada em 07 de Março de 2016 às 18:22

Interpretação pontual e emocionante

Não é a duração do espetáculo que faz com que um trabalho cênico seja mais ou menos importante. A prova é Eu não dava praquilo, que o poeta Cássio Junqueira e o ator e diretor Cassio Scapin escreveram para a interpretação do segundo, com direção de Elias Andreato, e que teve sessões no Centro Cultural da Santa Casa, no último fim de semana. Scapin tem larga experiência de televisão e de teatro. Aqui, faz um papel solo, travestido de Myrian Muniz, atriz, professora de artes cênicas e diretora do teatro paulistano, que marcou época com suas atuações no teatro de Arena ou na direção do show Falso brilhante, de Elis Regina. Hoje, ela dá nome a um importante prêmio de fomento às artes cênicas do País.
Não é a duração do espetáculo que faz com que um trabalho cênico seja mais ou menos importante. A prova é Eu não dava praquilo, que o poeta Cássio Junqueira e o ator e diretor Cassio Scapin escreveram para a interpretação do segundo, com direção de Elias Andreato, e que teve sessões no Centro Cultural da Santa Casa, no último fim de semana. Scapin tem larga experiência de televisão e de teatro. Aqui, faz um papel solo, travestido de Myrian Muniz, atriz, professora de artes cênicas e diretora do teatro paulistano, que marcou época com suas atuações no teatro de Arena ou na direção do show Falso brilhante, de Elis Regina. Hoje, ela dá nome a um importante prêmio de fomento às artes cênicas do País.
O espetáculo, com cerca de uma hora, é seguido de um simples e simpático bate-papo do ator com o público. Na noite em que assisti, no sábado passado, as perguntas foram respeitosas, inteligentes e objetivas, permitindo que o criador (na medida em que ele é um dos roteiristas da peça), pudesse detalhar algumas questões de seu trabalho. Por exemplo, todo o material pesquisado vem de um único livro que contém uma espécie de história do Teatro de Arena, de São Paulo, em que Myrian viveu durante muitos anos; e um vídeo caseiro, feito por amigos, em que a atriz fala de si mesma e de sua carreira com absoluta informalidade, e que depois foi editado e distribuído a amigos. É a partir deste material que Cassio Scapin recupera a memória e a corporificação da personagem que encarna, com respeito, maestria e emoção. Os gestos, a tonalidade de voz, os estridentes da fala, tudo está recuperado cuidadosa e respeitosamente no espetáculo que traz, além do mais, falas e conceitos da atriz e diretora, que marcou o teatro paulistano dos anos 1960 e 1970. Mais que isso, o espetáculo é uma bela e emocionada reflexão a respeito da arte teatral, quer a partir das falas de Myrian Muniz, quer a partir da própria performance de Cassio Scapin. Assim, à teoria, o ator e diretor acrescenta a prática, o que melhor se traduz pela brincadeira de fazer o público cúmplice de uma pretendida aula de improvisação que a personagem teria realizado em São Paulo, em sua escola.
Cassio Scapin é um ator extraordinário: ele sabe perfeitamente como colocar a voz, sem afetação ou falsidade; quando faze rum silêncio (mais ou menos curto), quando enfatizar uma tonalidade ou buscar uma naturalidade. Por isso, sem qualquer afetação, sua encarnação travestida de Myrian Muniz não se coloca afetada ou artificial, pelo contrário. Diz ele que teria convivido, mesmo que à distância com a atriz. Mas sua performance é, antes de tudo, uma homenagem emocionada e emocionante, que nasce da correta seleção dos elementos biográficos da artista, e que se valoriza a partir da correta dicção de suas falas, calando ou sutilmente referindo fatos mais dolorosos, como a morte do primeiro filho, ou enfatizando seus conceitos a respeito do teatro e da encenação.
O título do espetáculo nasce da aludida IB competência da personagem a uma série de atividades que experimentou antes de, morando por casualidade frente ao prédio da antiga Escola de Arte Dramática (EAD) de São Paulo, ter-se filiado à mesma. É de acasos que se faz a vida, mas acasos que a personagem seja capaz de compreender e aproveitar, otimizando-os. Foi o caso de Myrian. Disso nasceu a atriz, a professora e a diretora. Embora não apareça este aspecto no espetáculo, Myrian Muniz foi, além do mais, uma espécie de militante convicta do então nascente movimento feminista brasileiro e, sobretudo, resistente à ditadura brasileira, então vigente. Estas questões são aludidas de passagem. Os roteiristas preferiam enfatizar a perspectiva existencialista da artista, valorizando, sobretudo, sua capacidade de intensa humanidade, o que a transformou numa espécie de referência do teatro paulistano.
O espetáculo abre, com chave de ouro, a temporada de 2016. Oxalá outros trabalhos que nos visitem ou venham a ser aqui produzidos consigam a mesma significação e referencialidade que este trabalho. Quem assistiu, foi premiado com um espetáculo raro e profundamente emocionante. Dado importante: parabéns à produtora local Bruna Paulin. Gradualmente, ela vem se tornando uma referência de qualidade quanto aos espetáculos que recebe em nossa cidade.
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