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Cinema

- Publicada em 25 de Fevereiro de 2016 às 22:16

A prisão e o mundo

Hélio Nascimento
Não chega a ser um fator de relevância Emma Donoghue, a autora do livro original e também roteirista de O quarto de Jack, ter visto ou não o filme Muito além do jardim, realizado em 1979 pelo diretor Hal Ashby, a partir de uma novela de Jerzy Kosinski, adaptada pelo autor. Coincidência ou não, o fato é que o filme dirigido por Lenny Abrahamson é descendente direto daquele, mesmo que influenciado também por outras fontes. Também é justo destacar que sequestradores e maníacos com diversas fixações têm merecido, dos meios de divulgação, o destaque que procuram e a repercussão que ambicionam. Portanto, coincidentemente ou não, o filme de Ashby pode não ter sido uma influência consciente, mas é a matriz deste filme por vários motivos admirável. E se o filme de Ashby tinha uma intepretação marcante de Peter Sellers, a obra de Abrahamson tem duas: a da atriz Brie Larson e a do menino Jacob Trembay, duas presenças que exemplificam com clareza absoluta o que é interpretação em cinema, uma ação que parece anular o aparelho de filmar e faz com que o espectador, em vez de contemplar um espetáculo, passe a ser um participante do drama que se desenvolve. O caso da atriz pode ser visto como exemplo de sensibilidade e profissionalismo, mas o do menino é realmente surpreendente, algo que nos faz pensar em alguns momentos do neorrealismo italiano. Mas essas duas presenças não são os únicos destaques deste filme, que possui muitos aspectos a serem realçados e elogiados.
Não chega a ser um fator de relevância Emma Donoghue, a autora do livro original e também roteirista de O quarto de Jack, ter visto ou não o filme Muito além do jardim, realizado em 1979 pelo diretor Hal Ashby, a partir de uma novela de Jerzy Kosinski, adaptada pelo autor. Coincidência ou não, o fato é que o filme dirigido por Lenny Abrahamson é descendente direto daquele, mesmo que influenciado também por outras fontes. Também é justo destacar que sequestradores e maníacos com diversas fixações têm merecido, dos meios de divulgação, o destaque que procuram e a repercussão que ambicionam. Portanto, coincidentemente ou não, o filme de Ashby pode não ter sido uma influência consciente, mas é a matriz deste filme por vários motivos admirável. E se o filme de Ashby tinha uma intepretação marcante de Peter Sellers, a obra de Abrahamson tem duas: a da atriz Brie Larson e a do menino Jacob Trembay, duas presenças que exemplificam com clareza absoluta o que é interpretação em cinema, uma ação que parece anular o aparelho de filmar e faz com que o espectador, em vez de contemplar um espetáculo, passe a ser um participante do drama que se desenvolve. O caso da atriz pode ser visto como exemplo de sensibilidade e profissionalismo, mas o do menino é realmente surpreendente, algo que nos faz pensar em alguns momentos do neorrealismo italiano. Mas essas duas presenças não são os únicos destaques deste filme, que possui muitos aspectos a serem realçados e elogiados.
O filme de Ashby tinha como protagonista um jardineiro adulto que havia passado toda a sua vida confinado a uma casa e vendo o mundo apenas através da televisão. Quando entra em contato com a realidade, sua primeira experiência é ser assaltado na rua. Com o controle remoto na mão procura, então, desfazer a imagem do assaltante, quando então constata que é agora impossível trocar de imagem e situação. O personagem do filme antigo tem um destino completamente diferente do menino Jack. Aquele chega a se transformar numa espécie de conselheiro presidencial. O protagonista atual passa a vivenciar algo que mostra que a prisão e as distorções causadoras de sofrimento não estão confinadas num cubículo ao qual apenas o sequestrador tinha acesso. Mas são tantos os significados que podem ser extraídos das duas situações básicas do filme que é possível dizer que o trabalho de Abrahamson é realmente um dos mais ricos dos últimos tempos, chegando mesmo a ser comovente em algumas passagens. E, além disso, no trecho da conquista da liberdade, depois das cenas do confinamento, o diretor consegue realizar um trecho que certamente merecerá um lugar em futuras antologias.
Na primeira parte, importa captar a sensação de confinamento do adulto, mas também a descoberta do mundo através da imagem e da palavra. Aquele não está apenas nos livros que a mãe lê para o filho, pois também surge através das imagens da televisão. É poderosamente dramático o momento em que que palavra e imagem se transformam em realidade. O tema do cachorro, várias vezes mencionado, se materializa. Primeiro, em forma de fantasia; depois, de maneira agressiva e finalmente simbolizando uma harmonia procurada. Este é apenas um dos tantos exemplos de cinema superior percebidos em O quarto de Jack. Quando o mundo real aparece, o cenário original já está desfeito. Se, nas cenas iniciais, temos uma caricatura dramática de uma família - o pai repressor, a mãe prisioneira, a criança mergulhada em dúvidas -, na segunda, o mundo se revela. O avô biológico, mais preocupado com seu trabalho e que é incapaz de olhar para o neto, é quase uma síntese de uma desumanidade que parece não estar limitada ao reduzido cenário da primeira parte. Quando o menino expressa o sentimento de que sente certa falta do primeiro cenário, pois nele tinha sempre a mãe ao seu lado, o filme se aproxima desse desconforto humano diante da realidade, desta carência que sintetiza o sentimento de abandono e solidão diante da agressividade. Deste filme sobre sequestro, prisão e descobertas, emanam situações e reações que deveriam ser, a todo tempo, objeto de atenção não apenas de espectadores de cinema.
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