Além das demissões que estão ocorrendo no estaleiro Brasfels, Angra dos Reis já havia sofrido um golpe na economia com a paralisação das obras da Usina Nuclear de Angra 3, no fim de setembro de 2015, após entrar no radar da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, em julho. A suspensão das atividades deixou aproximadamente 2 mil trabalhadores da construção civil de braços cruzados desde o início de outubro, segundo informações do sindicato local fornecidas à prefeitura de Angra dos Reis, no litoral Sul do Rio de Janeiro.
A história de Angra 3, a terceira usina nuclear do País, é repleta de idas e vindas. A obra foi paralisada, pela primeira vez, ainda na década de 1980. Com o aval para a retomada em 2007, o projeto teve aprovado empréstimo de R$ 6,1 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes) em 2010 e viu seus custos crescerem e o cronograma atrasar até virar alvo da Lava Jato.
O canteiro de obras de Angra 3 em dezembro passado mostrava guindastes e máquinas de grande porte parados. Apenas os funcionários que fazem a manutenção dos equipamentos continuam trabalhando. Algumas edificações, como salas de controle, estão prontas, mas o compartimento principal, onde ficará alojado o reator - coração de uma usina nuclear -, ficou pela metade. Outros prédios previstos no projeto estão apenas na fundação.
A previsão anterior de inauguração, 2018, torna-se cada vez mais inatingível. Segundo dados divulgados na internet pela Eletronuclear, subsidiária da Eletrobrás responsável pela operação das usinas nucleares, 58,4% do empreendimento foi concluído até setembro, ao custo de R$ 5,3 bilhões (o total do investimento deverá chegar a R$ 14,8 bilhões). A empresa afirma que a paralisação se deve à falta de recursos financeiros e não há previsão para a retomada das obras até que essa questão seja solucionada.
As obras já caminhavam a passos lentos quando a Lava Jato chegou à Eletronuclear. Segundo a Polícia Federal, um esquema de corrupção envolvendo ex-membros da cúpula da Eletronuclear e executivos das construtoras que integram o consórcio Angramon (Odebrecht, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Techint, UTC Engenharia e EBE) teria resultado em pagamentos de propina e favorecimento em licitações.
Entre os denunciados à Justiça está Othon Luiz Pinheiro da Silva, que presidiu a Eletronuclear até abril de 2015, quando foi afastado após as primeiras suspeitas. Ele foi detido em julho e passou a cumprir prisão domiciliar em dezembro. A Eletronuclear diz que sindicâncias internas não constataram envolvimento de atuais ou ex-funcionários no esquema.
Mais uma vez parada no tempo, a obra de Angra 3 também passou a abastecer menos os cofres da prefeitura de Angra dos Reis. Desde o início de 2015, a média mensal de ISS pago pela Eletronuclear caiu de R$ 2,8 milhões para R$ 2,3 milhões. No total, a Secretaria Municipal de Fazenda estima que deixou de arrecadar R$ 3,5 milhões até novembro passado.
"A gente vive aqui de Angra 3, da pesca, do comércio, da construção naval e do porto. Se uma dessas falha, com certeza há uma lacuna, e essa lacuna prejudica, e muito, nossa população", afirma o secretário municipal de Atividades Econômicas, Marcelo Oliveira.
Com duas das principais atividades econômicas dando sinais de curto-circuito, Angra teme trilhar o mesmo caminho de Itaboraí, na Região Metropolitana do Rio, onde a interrupção das obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) causou desemprego e um imenso problema social.