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Cinema

- Publicada em 28 de Dezembro de 2015 às 18:09

Crimes revelados

Hélio Nascimento
A narrativa é estruturada de maneira a não permitir que qualquer traço de ousadia formal desvie a atenção da plateia. O diretor Giulio Ricciarelli se mostra um adepto da tese de que nem sempre o academicismo é algo incapaz de despertar a atenção. Labirinto de mentiras aposta na relevância de seu tema para tentar se impor como um filme dotado de significação e importância. Ao abordar o crime maior, o extermínio de milhões de pessoas transformadas em vítimas de um ódio que sempre haverá de espantar por sua intensidade e pela meticulosidade com que atuou, o filme evidentemente não está à altura de documentários como Shoah, de Claude Lanzmann, e Noite e nevoeiro, de Alain Resnais. E também não se iguala a obras como Julgamento em Nuremberg, de Stanley Kramer, e A lista de Schindler, de Steven Spielberg. Porém, navegando entre o documentário e a ficção, esta descrição da luta de um jovem promotor público para prender, julgar e condenar centenas de indivíduos responsáveis pelas atrocidades praticadas em Auschwitz tem força dramática e, por vezes, a intensidade necessária para que sua proposta se imponha pela maneira como que, partindo de um fato histórico, é capaz de falar sobre algo que será sempre atual: a necessidade de que a justiça se imponha e toda a verdade seja revelada.
A narrativa é estruturada de maneira a não permitir que qualquer traço de ousadia formal desvie a atenção da plateia. O diretor Giulio Ricciarelli se mostra um adepto da tese de que nem sempre o academicismo é algo incapaz de despertar a atenção. Labirinto de mentiras aposta na relevância de seu tema para tentar se impor como um filme dotado de significação e importância. Ao abordar o crime maior, o extermínio de milhões de pessoas transformadas em vítimas de um ódio que sempre haverá de espantar por sua intensidade e pela meticulosidade com que atuou, o filme evidentemente não está à altura de documentários como Shoah, de Claude Lanzmann, e Noite e nevoeiro, de Alain Resnais. E também não se iguala a obras como Julgamento em Nuremberg, de Stanley Kramer, e A lista de Schindler, de Steven Spielberg. Porém, navegando entre o documentário e a ficção, esta descrição da luta de um jovem promotor público para prender, julgar e condenar centenas de indivíduos responsáveis pelas atrocidades praticadas em Auschwitz tem força dramática e, por vezes, a intensidade necessária para que sua proposta se imponha pela maneira como que, partindo de um fato histórico, é capaz de falar sobre algo que será sempre atual: a necessidade de que a justiça se imponha e toda a verdade seja revelada.
Procurando fugir das simplificações e do maniqueísmo, o cineasta não faz de seu protagonista um herói sem problemas. É justamente por isso que o filme se engrandece. Johann Radmann é uma figura que descende do juiz interpretado por Jean-Louis Trintignant em Z, de Costa-Gavras, na medida em que ambos, impulsionados pela integridade e por boa dose de coragem, enfrentam não apenas a ira como também todos os recursos com que contam os poderosos. No filme de Ricciarelli, o protagonista enfrenta igualmente dramas pessoais, que servem para realçar a intensidade de sua luta. É que o filme não apenas discute a necessidade de punição de criminosos: estamos diante de um ajuste de contas com o passado de uma nação. É durante sua pesquisa que o promotor termina descobrindo o passado do próprio pai e, num áspero diálogo com a mãe, seus conflitos se transformam em símbolo do próprio dilema enfrentado pelo país no qual nasceu e prosperou o nazismo. É quando, diante da mãe ou da nação, o ser humano opta pelo caminho tão doloroso como redentor. A presença paterna nas cenas de pesadelo reforça a ideia de que, além do processo judicial, haverá um rompimento com as origens mais profundas do nazismo.
E num filme tão marcado pelos diálogos é preciso prestar atenção a certos detalhes para que sua proposta seja entendida. O episódio do casaco rasgado é exemplar. Tudo começa quando ele se decepciona ao saber de detalhes do passado de um amigo. Essa marca não poderá ser removida. Mas isso não impedirá que o julgamento seja realizado. E há também a questão da burocracia. Os planos em que vemos o protagonista prisioneiro de milhares de pastas não necessitam de palavras para atingir seus objetivos. O filme de Ricciarelli tem igualmente o mérito de trazer para a tela um julgamento só iniciado em l963, quase duas décadas depois do final da Segunda Guerra Mundial, quando então muitos tentavam impor a ideia de tudo havia sido resolvido em Nuremberg. Mas havia questão de Auschwitz e também as experiências de Joseph Mengele. No caso do médico, o filme não hesita em focalizar a rede de proteção montada para protegê-lo. Por vezes, o cinema necessita de filmes assim: obras quase didáticas, que servem para exaltar combates travados em nome da dignidade. Esconder atrocidades é conviver com o perigo. Ignorar o crime é permitir que ele seja repetido. Essa obra, que a Alemanha indicou para representar sua cinematografia no Oscar, é, antes de tudo, um ato de honradez e integridade. O cinema alemão começou a se impor, entre outros motivos, pela forma como nas décadas de 1910 e 1920 e também nos anos anteriores a 1933, mostrou as ameaças representadas por assassinos que agiam em vários cenários, numa antecipação do que estava por vir. Labirinto de mentiras reconstitui o capítulo final do mais terrível dos dramas.
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