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Cinema

- Publicada em 17 de Dezembro de 2015 às 23:01

Pai, patrão

Ao contrário dos adeptos das simplificações, o diretor Pablo Trapero, um dos nomes destacados do cinema argentino, aprecia decifrar enigmas propostos pelas complexidades criadas pela realidade. Não há nada pior para uma nação do que uma ditadura, venha ela de onde vier. Os regimes autoritários deixam marcas indeléveis e também costumam abrir espaço para a ação de elementos reprimidos pela civilização, utilizando-os em seu benefício e neles vendo preciosos auxiliares para suas ações repressoras. O cineasta de O clã, outro filme notável de uma cinematografia que vem se destacando de forma bastante expressiva nos últimos anos, parte de um fato verídico: as atividades de Arquímedes Puccio, agente da ditadura militar argentina, especialista em sequestros e em extorquir dinheiro das famílias das vítimas e que depois do fim do regime, quando a Argentina iniciava novo capítulo de sua história, continuou em suas atividades, nelas vendo uma preciosa fonte de renda. Terminada a ditadura, que começou a ser sepultada com a derrota na guerra de 1982, Puccio, com sua experiência adquirida, continuou nas mesmas atividades, por vezes concentradas em pessoas conhecidas de sua família, todas assassinadas após o recebimento do dinheiro. Trapero soube ver em tal episódio não apenas uma das marcas de um regime de força, nele encontrando, além disso, as forças contidas pelos rituais e pelas imposições e que podem ser liberadas pelo autoritarismo para ações destinadas a manter o terror.
Ao contrário dos adeptos das simplificações, o diretor Pablo Trapero, um dos nomes destacados do cinema argentino, aprecia decifrar enigmas propostos pelas complexidades criadas pela realidade. Não há nada pior para uma nação do que uma ditadura, venha ela de onde vier. Os regimes autoritários deixam marcas indeléveis e também costumam abrir espaço para a ação de elementos reprimidos pela civilização, utilizando-os em seu benefício e neles vendo preciosos auxiliares para suas ações repressoras. O cineasta de O clã, outro filme notável de uma cinematografia que vem se destacando de forma bastante expressiva nos últimos anos, parte de um fato verídico: as atividades de Arquímedes Puccio, agente da ditadura militar argentina, especialista em sequestros e em extorquir dinheiro das famílias das vítimas e que depois do fim do regime, quando a Argentina iniciava novo capítulo de sua história, continuou em suas atividades, nelas vendo uma preciosa fonte de renda. Terminada a ditadura, que começou a ser sepultada com a derrota na guerra de 1982, Puccio, com sua experiência adquirida, continuou nas mesmas atividades, por vezes concentradas em pessoas conhecidas de sua família, todas assassinadas após o recebimento do dinheiro. Trapero soube ver em tal episódio não apenas uma das marcas de um regime de força, nele encontrando, além disso, as forças contidas pelos rituais e pelas imposições e que podem ser liberadas pelo autoritarismo para ações destinadas a manter o terror.
O filme começa no período de transição para a democracia, quando a casa de Puccio é invadida por policiais, depois que a justiça tinha acumulado provas necessárias para incriminar aquele pai de família. Esta cena é repetida nos momentos finais e entre um ponto e outro há vários momentos que a explicam, tudo formando um painel que, para os que não acompanharam os acontecimentos como a população argentina o fez, é algo impressionante e revelador. O filme, que ganhou o prêmio de direção no Festival de Veneza, tem alcançado repercussão em vários países, algo que o próprio Trapero atribui ao universalismo de sua proposta, pois O clã, segundo o cineasta, trata basicamente do choque entre pai e filho. A cena mais notável do filme, marcado por sinal por momentos impactantes, é aquela do diálogo e da agressão na cela, quando Puccio, interessado em passar por vítima de violência provoca o filho até que este, percebendo então a intensidade de sua participação na trama organizada por Arquímedes, se descontrola e, mais uma vez, termina obedecendo as ordens do chefe. O filme certamente trata dos males da ditadura, mas não vê esta como um elemento isolado. O cineasta sabe colocar com precisão na tela os conflitos gerados dentro da estrutura familiar, vista aqui como um microcosmo. A família é focalizada pelo diretor de maneira a ressaltar que por vezes sua integridade pode ser erroneamente defendida pela forma mais condenável. Tudo o que o pai havia feito foi para o bem dos filhos, diz a mãe numa cena. Os ditadores costumam dizer isso, só que para as nações que dominam.
Trapero, assim como outros de seus colegas argentinos, acredita em personagem. Focalizando figuras reais, essa forma correta de fazer cinema se torna ainda mais poderosa. Basta ver o que ele consegue extrair do ator Guillermo Francella, cuja presença em cena é um exemplo eloquente de como em cinema são desnecessários exageros e artificialismos. As cenas da família à mesa são reveladoras. Já na primeira delas, quando se fala do irmão que se encontra no exterior, a figura do chefe se impõe de forma definitiva. Estamos diante de uma figura que sabe impor sua autoridade e disfarçar sua verdadeira índole. Este homem é, na verdade, a síntese da prepotência habilmente disfarçada. Trapero, em vários momentos, o filma varrendo a frente da casa, como uma criatura comum. Num filme que é visto pelos olhos do filho, este tema da agressividade oculta é também desenvolvido nas cenas em que vemos o jovem praticando o seu esporte. E a cena de sexo no carro é filmada paralelamente a um sequestro e parece comandada pela mesma violência. Sem dúvida, Trapero está muito distante dos panfletários e simplificadores.
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