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Moradia

- Publicada em 23 de Dezembro de 2015 às 15:05

Novo código trará mudanças na política habitacional

Até hoje, não há números concretos sobre a quantidade de áreas ocupadas existentes no Estado

Até hoje, não há números concretos sobre a quantidade de áreas ocupadas existentes no Estado


JONATHAN HECKLER/JC
A partir de 17 de março deste ano, com o novo Código de Processo Civil (CPC), quando houver pedido de reintegração de posse em ocupações com posse antiga, o juiz fará uma audiência de mediação de conflito, conciliatória ou de mediação, na qual serão chamados os órgãos públicos envolvidos com a política habitacional, mesmo quando se tratar de área privada. Atualmente, as audiências envolvem apenas o magistrado e o proprietário do terreno.
A partir de 17 de março deste ano, com o novo Código de Processo Civil (CPC), quando houver pedido de reintegração de posse em ocupações com posse antiga, o juiz fará uma audiência de mediação de conflito, conciliatória ou de mediação, na qual serão chamados os órgãos públicos envolvidos com a política habitacional, mesmo quando se tratar de área privada. Atualmente, as audiências envolvem apenas o magistrado e o proprietário do terreno.
"Será adotada praticamente a mesma sistemática que existia antigamente para as ocupações de áreas da ouvidoria agrária", explica Heriberto Maciel, promotor da Promotoria de Justiça de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística do Ministério Público do Estado (MPE).
Atualmente, o CPC já indica que, se o cidadão não paga o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) relativo a uma propriedade durante três anos consecutivos e não exerce posse sobre o imóvel, morando nele ou executando ali alguma reforma ou construção, o local é considerado abandonado e pode ser arrecadado pelo município. "Em Porto Alegre, eu tenho um inquérito civil instaurado para podermos estabelecer o fluxo, o cronograma e a forma como o município arrecadará esses bens, para depois ou vendê-los e utilizar o valor no Fundo Habitacional de Interesse Social, ou aproveitar o terreno para a construção de moradias, diante desse déficit habitacional que temos", aponta Maciel.
Além desse instrumento, o promotor cita o artigo 182 da Constituição Federal, no qual está definido que, no caso de imóveis subutilizados ou não utilizados, o Executivo municipal tem a obrigação de estabelecer uma legislação de acordo com o Estatuto da Cidade, com três etapas gradativas. Primeiro, notifica-se o proprietário para edificar o terreno e este possui cinco anos para construir ou ao menos apresentar um projeto de construção de ocupação do imóvel.
"Caso o proprietário venda a área, o prazo se mantém. Por exemplo, se alguém comprou o imóvel dois anos depois da notificação, terá três anos para construir", explica. Se, após esses cinco anos, nada tiver sido feito, a prefeitura pode se valer do IPTU progressivo no tempo. Ao contrário do IPTU normal, o progressivo no tempo serve como sanção e é uma alíquota que vem crescendo, até chegar à terceira etapa do processo: a desapropriação sancionatória, para quitar a dívida com o poder público. "Os principais municípios das regiões metropolitanas e capitais do Brasil estão legislando sobre o assunto. Porto Alegre precisa criar a sua legislação também sobre o tema, que é mais um instrumento que pode ser utilizado depois para se captar recursos para a política habitacional", observa Maciel.
A promotoria tem dialogado com o Executivo e o Legislativo municipais, para estabelecer mecanismos de como arrecadar os imóveis abandonados. A Procuradoria-Geral do Município (PGM) está iniciando um projeto-piloto na zona Norte de Porto Alegre, identificando esses imóveis.

Ocupações urbanas aumentaram nos últimos três anos

A defensora pública Adriana Scheffer do Nascimento coordena o Núcleo de Defesa Agrária e Moradia (Nudeam) da Defensoria do Rio Grande do Sul. Em todo o Estado, os defensores ajuízam ações de reintegração de posse e fazem a defesa das pessoas que ocupam as áreas.
"Em Porto Alegre e Região Metropolitana, a atuação acaba se sobressaindo, pois as comunidades nos procuram para auxiliá-los, realizando reuniões com os órgãos públicos, os proprietários de áreas que eles querem comprar e falando com o Judiciário ou com o MPE para tentar um prazo maior para evitar reintegração de posse", relata.
O Nudeam tem ganhado força nos últimos três anos, com o aumento de ocupações urbanas no Estado. Entretanto, até hoje, não há números concretos sobre a quantidade de áreas ocupadas existentes. "É uma incógnita. Temos um grupo para dialogar sobre os conflitos fundiários e falar sobre a possibilidade da instituição de uma vara especializada, mas não há um mapeamento de quantas reintegrações de posse temos. O único dado disponível é o de mandados judiciais enviados à Brigada Militar. Segundo esse levantamento, temos por volta de 40 mandados expedidos à corporação", informa a defensora.
Adriana verifica uma sobreposição do direito à propriedade sobre o direito à moradia. "Ambos são direitos constitucionais, ou seja, fundamentais. Infelizmente, a propriedade tem sido privilegiada, porque a liminar é deferida sem se ouvir a parte contrária, então, muitas vezes, o juiz não sabe se há duas pessoas ou 500 famílias em uma ocupação e não pensa na alternativa de local para essas pessoas irem e na falta de habitações de baixa renda disponíveis", ressalta.
Normalmente, os pedidos de audiência de mediação são negados, conforme a defensora, devido à formação formalista dos juízes, amarrada ao direito à propriedade. "Os direitos sociais que eclodiram no século XX não são balizados. Eu sempre digo que propriedade nós podemos ter de várias coisas, mas morar, só moramos em um lugar", observa.
Na opinião de Adriana, quanto menos o poder público se preocupar com o tema, mais espaço estará dando para os aproveitadores. "Sempre se fala que há grilagem nas ocupações, que quem vem ocupar são pessoas de outras cidade, que as pessoas devem levar suas demandas ao Orçamento Participativo ou aguardar uma residência pelo Minha Casa Minha Vida. Há muitas falhas nesse discurso, pois, para não haver grilagem, é fundamental que a prefeitura vá ao local para ver quem são os aproveitadores", recomenda.
O argumento usado pelos municípios é de que os terrenos estão muito caros. "Hoje, Porto Alegre tem vários projetos prontos, mas o Minha Casa Minha Vida 3 não foi lançado. Contudo, não compete ao município depender apenas de recursos federais. Como se fazia antes de 2009, sem o Minha Casa Minha Vida? Temos 20 anos sem uma política sólida de habitação. Isso faz com que as pessoas acabem se organizando, identificando áreas e ocupando, por necessidade, política ou interesse. Isso só mudará com a atuação do município nas áreas ocupadas", opina a defensora.