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Tráfico de Seres Humanos

- Publicada em 09 de Novembro de 2015 às 14:28

Da proibição nasce o tráfico de seres humanos

Economia dos países de origem e destino é o fator principal para o crime

Economia dos países de origem e destino é o fator principal para o crime


MARCO QUINTANA/JC
A nacionalidade pode garantir mais direitos ao cidadão? A fronteira de um país desenvolvido é mais importante do que a de um subdesenvolvido? As pessoas invadem o território de outras ao viajarem? O direito de ir e vir existe? Diante de tantos questionamentos, cabe ao Direito Internacional, em parceria com os Direitos Humanos já consagrados, proporcionar uma legislação eficiente e humana.
A nacionalidade pode garantir mais direitos ao cidadão? A fronteira de um país desenvolvido é mais importante do que a de um subdesenvolvido? As pessoas invadem o território de outras ao viajarem? O direito de ir e vir existe? Diante de tantos questionamentos, cabe ao Direito Internacional, em parceria com os Direitos Humanos já consagrados, proporcionar uma legislação eficiente e humana.
Mesmo com os avanços sociais e jurídicos, ainda é possível perceber que as diferenças, como as de nacionalidade, interferem no modo como casos iguais são tratados. "Se um norte-americano for deportado do Brasil haveria uma movimentação midiática muito maior do que se fosse um angolano deportado da Inglaterra”, salienta o professor de Direito Internacional na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) e advogado do Grupo de Assessoria a Imigrantes e a Refugiados (Gaire) da Universidade Federal do Rio grande do Sul (Ufrgs) Gustavo Oliveira de Lima Pereira.
De acordo com o artigo 13 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, todos têm o direito de circular, podendo deixar o país em que se encontram. Contudo, o Direito Internacional estabelece que nenhum país é obrigado a aceitar estrangeiros em seu território. Com a proibição, a atividade de facilitar a entrada de pessoas, por vontade própria ou a obrigando, acaba sendo estimulada. “Da proibição nasce o tráfico”, afirma o professor de Direito Internacional na Faculdade de Direito do Sul de Minas, Cicero da Luz. “É necessário pensar à frente, não apenas criar mecanismos de perseguição de traficantes. É preciso ir além, promover políticas públicas que facilitem o recebimento de pessoas, assim acabaríamos de fato com o tráfico humano”, aconselha.
As legislações vigentes no País tipificam e punem a questão do tráfico. O Código Penal brasileiro determina no artigo 206 que o aliciamento para fins de emigração consiste no recrutamento de trabalhadores, mediante fraude, com o fim de levá-los para território estrangeiro. A pena para quem incorrer no crime é de um a três anos de detenção e multa.
O Estatuto do Estrangeiro, Lei n° 6.815/80, por sua vez, penaliza, através do artigo 125, o indivíduo que ingressar no território de forma clandestina, sujeito a deportação; demorar-se no território após esgotado o prazo legal de estadia; transportar para o Brasil estrangeiro que esteja sem a documentação em ordem; empregá-lo em situação irregular ou impedido de exercer atividade remunerada; introduzir estrangeiro clandestinamente em território nacional, entre outras ações. “Essa lei tem uma série de problemas, pois foi sancionada na ditadura militar. Precisamos de uma legislação migratória diferente. A nova lei de migrações, tramitando no Congresso Nacional, é melhor, mas nada seria pior que a lei em vigor”, critica Pereira.

Conservadorismo dificulta recebimento de estrangeiros

Economia dos países de origem e destino é o fator principal para o crime

Economia dos países de origem e destino é o fator principal para o crime


MARCO QUINTANA/JC
A sociedade é conservadora em seus costumes e cultura. Para muitas pessoas, ainda é complexo compreender que a distinção étnica não faz alguém ser inferior ao seu semelhante. "O primeiro passo é desenvolver o paradigma da nacionalidade e das barreiras, pois elas são uma ficção. Não existe diferença entre um francês, um alemão ou um argentino", diz o professor de Direito Internacional Gustavo Oliveira de Lima Pereira.
Quanto mais dificuldades há na entrada de estrangeiros, mais a atuação de facilitadores se faz necessária. Para coibir a atuação, o Brasil, em 2012, criou o visto humanitário. A modalidade é expedida na embaixada do Brasil em Porto Príncipe (Haiti) e em Quito (Equador). Com ele, o ingresso no país é facilitado. Porém muitos imigrantes, por não saberem da existência do recurso, não o solicitam no país de origem e só o recebem ao chegar no destino, com o trajeto tendo sido intermediado pelo contrabandista.
Outra dificuldade é a inserção do estrangeiro na sociedade. A população atual do Rio Grande do Sul, por exemplo, tem em suas origens imigrantes europeus que vieram para cá em busca de uma vida melhor. Entretanto, multiplicam-se os casos em que esses mesmos descendentes de imigrantes hostilizam pessoas vindas de países mais pobres, principalmente se elas são negras. " Quando vieram para cá, os italianos não eram pessoas ricas e abastadas. Vieram por necessidade", ressalta Pereira. O preconceito histórico alimenta as redes de contrabando e exploração, pois, se um cidadão não tem saúde, emprego e educação na região em que reside, ele irá procurar outra. Geralmente, o destino mais desejado é a Europa onde há mercado de trabalho, mas, no trajeto, os imigrantes estão sujeitos há vários modos de coação e exploração.
A situação econômica dos países de origem e destino é preponderante no tráfico de seres humanos. Pessoas que querem órgãos, que, na maioria das vezes vêm da América Latina ou da África, pagam para obtê-los. "(Os países mais ricos) acabam alimentando o tráfico por terem uma moeda mais forte, por isso, hoje em dia o alvo é na Europa em relação à prostituição, e remoção de órgãos", salienta Pereira. 
Outra violação cometida por empresas, é o ato de ir ao país onde a economia é precária para explorar a mão de obra dos habitantes, que Submetem-os a condições de trabalho desumanas, com carga horárias excessivas e baixo salário. O cenário é semelhante ao período da Revolução Industrial. "Assola muito fortemente o Brasil, a América Latina e muito drasticamente a China, que tem um contingente populacional gigantesco." 

A legislação é o reflexo da sociedade

No século XXI surgiram iniciativas globais de coibir o contrabando humano. As informações começaram a circular de maneira mais rápida, mas a mobilidade não seguiu em mudança positiva, pois esforços foram concentrados em fronteiras mais bem cercadas. As fronteiras que antes eram imaginárias tornaram-se um empecilho aos que buscam uma vida melhor e um mercado vantajoso aos que proporcionam a passagem.
O Brasil avançou no que diz respeito a leis específicas para tratar do tráfico de pessoas. O Decreto n° 5.948/06 aprova a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. A iniciativa visa à prevenção do crime. Para o propósito ser alcançado, informações sobre o crime e sobre a legislação são disponibilizadas e campanhas que fortaleceram a rede de combate ao tráfico humano brasileiro foram desenvolvidas.
As medidas adotadas pelo País estão de acordo com os iniciativas internacionais. Contudo, o professor de Direito Internacional Cícero da Luz alerta para inconsistências nas normas brasileiras em relação aos tratados supranacionais. Uma delas estaria no Projeto de Lei 3842/12, em tramitação na Câmara Federal e já aprovado na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento Desenvolvimento Rural. O texto estabelece que o trabalho análoga à escravidão ocorre "quando o trabalho for forçado ou obrigatório ou serviço exigido de uma pessoa sob ameaça, coação ou violência, restringindo sua locomoção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente". Com isso, jornada excessiva não configuraria exploração de mão de obra. "Podemos apontar como uma regressão e um alerta para o Brasil. O PL está em desacordo com os pactos internacionais", destaca Luz.