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Teatro

- Publicada em 21 de Setembro de 2015 às 14:34

Em cena: do bom e do ótimo teatro

Encerraram-se as atividades de mais um Porto Alegre em Cena. Alguém resumiu este ano dizendo que teve mais espetáculo bom e que por isso teve mais público. Luciano Alabarse entende que foi a crise que fez com que as pessoas fossem mais ao teatro. Eu fico no meio termo: sim, houve uma quantidade maior de espetáculos mais interessantes, por suas temáticas e qualidade. Mas no quesito temática, o que foi importante é que tivemos peças que, de maneira objetiva, dialogaram mais com o público em termos de temas oportunos em nosso contexto. Claro, como todo o festival, houve também decepções, mas isto deve fazer parte obrigatoriamente de um festival, porque o festival precisa mostrar o que vem sendo feito, independentemente de gostos particulares.
Encerraram-se as atividades de mais um Porto Alegre em Cena. Alguém resumiu este ano dizendo que teve mais espetáculo bom e que por isso teve mais público. Luciano Alabarse entende que foi a crise que fez com que as pessoas fossem mais ao teatro. Eu fico no meio termo: sim, houve uma quantidade maior de espetáculos mais interessantes, por suas temáticas e qualidade. Mas no quesito temática, o que foi importante é que tivemos peças que, de maneira objetiva, dialogaram mais com o público em termos de temas oportunos em nosso contexto. Claro, como todo o festival, houve também decepções, mas isto deve fazer parte obrigatoriamente de um festival, porque o festival precisa mostrar o que vem sendo feito, independentemente de gostos particulares.
Por exemplo, para mim, foram absolutamente decepcionantes os dois espetáculos baseados em Shakespeare, que de Shakespeare só ficaram com a atribuição do texto ao dramaturgo inglês. O Ricardo III de Gustavo Gasparani, com a direção de Sérgio Módena, é um arremedo de Shakespeare, sobretudo quando o ator resolve "modernizar" o texto, dialogando diretamente com a plateia. Alguém vai querer dizer que a redução de intérpretes faz parte da própria estética de Shakespeare e, aliás, se encontra expressivamente discutida na encenação mesma de Ricardo III. Isso é verdade, mas reduzir mais de meia centena de personagens a um único intérprete, convenhamos, nem Shakespeare ousaria... a impressão que fica é de vaidade, o que pode até ser injusto para com o ator. Mas não convenceu, e a encenação toda se reduziu à performance, aliás, muito boa, do intérprete.
Pior, contudo, foi a experiência com o Rei Lear do diretor Moacir Chaves, na interpretação de apenas três atrizes que mais se preocupavam em trocar as placas indicativas do personagem que fala do que propriamente desempenhavam seus papéis. Foi daquelas raras ocasiões em que fiquei louco para sair do teatro. Uma das peças mais poéticas de Shakespeare ficou reduzida a um conjunto de fofocas e boatos de corte, desaparecendo a emoção e a profunda reflexão que o dramaturgo faz a respeito da amizade e do amor filial.
Agora, em compensação, entre segunda e terça-feira, assistimos a um dos melhores espetáculos de muitos e muitos anos. Felizmente, cada festival traz, vez ou outra, um trabalho impactante, inesquecível, que a gente fica querendo ver de novo. Luiz Antonio, Gabriela, ao lado de Incêndios, por exemplo. Neste ano, foi a vez de Contrações. Trata-se de original do dramaturgo inglês contemporâneo Mike Bartlett. É uma peça de 2008, e praticamente foi a estreia de dramaturgo do jovem artista que, antes, pensara em ser ator ou mesmo diretor. Contrações aborda uma situação tão simples quanto radical: o quanto as relações de trabalho, em uma empresa capitalista, afetam a vida privada de seus funcionários.
No caso da peça, a situação é mais radical, porque a gerente é uma mulher (Yara de Novaes) que exerce tiranicamente seu controle sobre a funcionária (Débora Falabella), ambas em interpretações extraordinárias, com destaque, evidentemente, para Débora Falabella, não por ser da televisão, porque a outra também o é, mas porque sua personagem vive uma experiência radicalizada, que chega à morte e à reificação, conforme a velha teoria marxista. Mas o fantástico é que o texto de Bartlett não é discursivo, pelo contrário, é altamente dramático. Sua dramaticidade nasce da repetição, ad nauseam, da mesma saudação da gerente à funcionária, as mesmas perguntas, as mesmas tentativas de pressão. Procedimento normalmente cômico, aqui, levando à tragédia. Chega-se ao absurdo. Absurdo? Mas não é isso que vivemos diariamente numa empresa? Por que no teatro nos aparece como absurdo e na vida cotidiana, não? Porque o teatro concentra uma situação, e isso nos choca, porque nos revela a realidade. Eis a função do teatro. Simplesmente inesquecível, se mais não houvera nesta edição do Porto Alegre em Cena, teria valido a pena.
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