Muito se ouviu nos últimos anos sobre a revolução médica trazida pelas células-tronco ou, como também são chamadas, células-mães. Porém, a legislação precisou amadurecer para autorizar este tipo de estudo, tendo como objetivo principal projetar os benefícios e riscos desta inovação da medicina. Em 2005, com a Lei da Biossegurança (Lei nº 11.105), o Brasil permitiu pesquisas com células-tronco embrionárias. Entretanto, com algumas restrições.
A lei levou diversas áreas do conhecimento à discussão, tanto sobre o caráter científico das pesquisas quanto as implicações éticas e religiosas. Está expresso no texto que é permitida apenas a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento. Além disso, eles devem ser inviáveis, congelados há mais de três anos e com a autorização dos genitores.
O médico que dirige o Centro de Criogenia Brasil, Carlos Alexandre Ayoub, explica que a importância destas pesquisas deve-se às características da célula-tronco, que pode se dividir e dar origem a qualquer um dos 216 tipos de células que formam o nosso organismo. “Elas têm essa capacidade que as outras células não têm. Uma célula de pele só se reproduz em uma de pele, uma do coração só se reproduz em célula do coração”, exemplifica.
Ayub trabalha com a retirada de células-tronco do sangue do cordão umbilical do bebê e da placenta, na hora do parto. Assim, o material é armazenado em temperatura de 196 graus negativos. Segundo o médico, esse processo faz com que o material possa ser guardado infinitamente. As células são 100% compatíveis com o bebê doador e altamente compatíveis com os pais e irmãos.
“Se esse indivíduo tiver uma doença degenerativa de algum órgão, você descongela estas células, injeta nele e elas, sozinhas, procuram o órgão que está degenerado, se instalam e começam então a se reproduzir”, observa.
O tratamento realizado para leucemia desde 1968 é com células-tronco injetadas no sangue. “O mesmo acontece com derrames, infartos, diabetes, cirrose, hepatite C e outras doenças”, acrescenta o médico. Ele revela que este tipo de tratamento não traz nenhum tipo de complicação, podendo apenas não ter o resultado esperado. Já as células embrionárias – e por isso a polêmica que as envolve – podem causar certos problemas, como até mesmo o aparecimento de tumores.
“No momento, as células embrionárias são usadas, em sua maioria, para pesquisa. Dificilmente se vai fazer algum tratamento com elas, mesmo porque a quantidade encontrada é muito pequena”, explica Ayub. Mesmo assim, os estudos são importantes, pois trazem novas possibilidades. Por exemplo: ao invés de injetar a célula em um paciente que teve infarto, transforma-se ela primeiro em músculo cardíaco e insere-se assim no corpo. “Com certeza os resultados seriam muito melhores, mas para fazer isso é preciso ter experiência”, prevê o médico.
O advogado José Amélio Ucha Ribeiro Filho, do escritório Ribeiro Filho Advocacia & Consultoria, acredita que a Lei da Biossegurança foi uma grande evolução na legislação e que o ordenamento jurídico deve ser ajustado à realidade da sociedade. “Vejo a aprovação da lei, no que tange às células-tronco, amplamente correta e devida, e na época certa, quando floresciam ainda mais as questões ligadas ao biodireito, à bioética e à vida humana”, justifica.
Filho ressalta que o Brasil está entre os cinco países do mundo que detêm a tecnologia. A prova disso é a instalação do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias (Lance), na Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Outro ponto importante é que o Ministério da Saúde financiou o estudo que levou à primeira linhagem de células-tronco pluripotentes induzidas.”
Mesmo frente aos benefícios que as pesquisas podem trazer, alguns especialistas tentam provar que a lei é inconstitucional. Para o advogado, a legislação está em sintonia com os princípios e mandamentos constitucionais. “Os embriões humanos que são destruídos nas pesquisas com células-tronco não têm cérebro nem neurônios e, em virtude disso, não é lógico crermos que eles possam sentir qualquer tipo de sofrimento com a sua destruição.” Um dos pontos negativos que o magistrado levanta é a questão da burocracia, sobretudo por parte do Estado, para que cada vez mais cientistas e pesquisadores tenham acesso ao material para análise e pesquisas.
HemoCord é referência no armazenamento de células-tronco
Desde 2004 o HemoCord atua em Porto Alegre como banco de células-tronco do cordão umbilical. A diretora da clínica, Karolyn Sassi Ogliari, relata que a expectativa é de poder tratar doenças como insuficiência cardíaca, esclerose lateral amiotrófica, lúpus eritematoso sistêmico, diabetes juvenil, degenerações ósseas e de cartilagens, em um curto espaço de tempo – dentro de cinco a dez anos.
Segundo Karolyn, a empresa é procurada por clientes de todas as classes sociais. “O fator determinante é o interesse em assuntos relacionados à saúde e o alto nível de instrução e acompanhamento de assuntos científicos, como a evolução da medicina regenerativa”, avalia. Recentemente, o HemoCord e a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) firmaram parceria para o desenvolvimento de pesquisas na área de neurologia.