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50 ANOS DO GOLPE

- Publicada em 23 de Abril de 2014 às 00:00

Escola Paulo da Gama já foi presídio


CAROLINA HICKMANN/ESPECIAL/JC
Jornal do Comércio
O quadro negro, as classes e os alunos da Escola Estadual Paulo da Gama, no Partenon, em Porto Alegre, ainda dividem o espaço com as grades que impediam que presos políticos escapassem daquilo que, no início da ditadura militar, foi um presídio. “Eu nunca vi alguém construir uma escola e transformar em presídio”, desabafa um dos ex-presos políticos que estiveram em cárcere na Paulo da Gama, que prefere não ter sua identidade revelada. Para lembrar do episódio, o Movimento de Justiça e Direitos Humanos e a prefeitura de Porto Alegre, dentro do Projeto Marcas da Memória, realizam, hoje pela manhã, o descerramento da placa que assinalará o local onde funcionou o presídio.
O quadro negro, as classes e os alunos da Escola Estadual Paulo da Gama, no Partenon, em Porto Alegre, ainda dividem o espaço com as grades que impediam que presos políticos escapassem daquilo que, no início da ditadura militar, foi um presídio. “Eu nunca vi alguém construir uma escola e transformar em presídio”, desabafa um dos ex-presos políticos que estiveram em cárcere na Paulo da Gama, que prefere não ter sua identidade revelada. Para lembrar do episódio, o Movimento de Justiça e Direitos Humanos e a prefeitura de Porto Alegre, dentro do Projeto Marcas da Memória, realizam, hoje pela manhã, o descerramento da placa que assinalará o local onde funcionou o presídio.
De acordo com um documento encontrado em fevereiro deste ano, o local foi requisitado, da prefeitura municipal, pelo comando da 6ª DI para servir ao exército. O documento, datado de 27 e 28 de abril de 1964, é um boletim geral da Brigada Militar de nº 78 e 79. Ainda de acordo com o boletim, os administradores desse presídio eram o coronel Oscar Ávila da Cunha e o 1º tenente Anastácio José de Carvalho. O material histórico foi descoberto por Reginaldo Ives da Rosa Barbosa, que esteve preso no local e tem seu nome citado nesse arquivo junto a outros oficiais e praças.
“A Paulo da Gama começou, para mim, em 1961”, afirma Barbosa, referindo-se à Campanha da Legalidade, liderada pelo governador Leonel Brizola, que buscava assegurar o direito de João Goulart de tornar-se presidente. Na ocasião, ainda como sargento iniciante, aos 21 anos, Barbosa militou e, por esse motivo, diz ter ficado visado. “Nós ficamos marcados para o expurgo futuro de 1964”, enfatiza.
O documento aponta a transferência de Barbosa para a escola-presídio e é datado de 27 de abril do ano do golpe. O jovem recebeu voz de prisão no dia 1 do mesmo mês, por ter escrito um manifesto favorável a João Goulart. “Depois disso, começaram as agressões físicas e morais”, relata.
O sargento reformado conta que, ainda dentro do 1º Batalhão de Guardas, ao ser interrogado, sofreu torturas. “Tenho marcas de baioneta nas costas 50 anos depois, mas a maior marca é no meu ser”, enfatiza. Ele também relata que, ao deixar a sala em que prestava depoimento e onde foi torturado, militares, seus conhecidos, aguardavam-no na formação de corredor polonês empunhando cassetetes. Um desses objetos ele guarda em frente à mesa de seu escritório, como um símbolo de uma grande decepção. “Ser condenado e apanhar por crime de pensamento não se pode deixar de lembrar”, afirma.
Ao ser levado ao Presídio Militar, hoje a escola Paulo da Gama, “sempre em mira de baioneta”, Barbosa ficou preso em uma sala que, atualmente, funciona como uma sala de aula, junto a outros 30 presos, dos cerca de 80 que ele recorda ver por lá. “Em uma sala escura, eles acendiam refletores em meus olhos, jogavam gasolina e diziam que iriam me incinerar”, conta Barbosa, descrevendo a tortura sofrida. Ele também relata ter levado socos e pontapés. “Lá dentro não se respeitava mais a hierarquia militar, não importava quem era sargento e quem era coronel”, revela o sargento reformado ao falar sobre os abusos cometidos pelos militares.
O mais sombrio, lembra o sargento reformado, é que o presídio ficava em frente à casa de sua família. “E, mesmo assim, meu pai e minha mãe, que estava muito doente, eram proibidos de me visitar, sob pena de também serem presos!”, conta. “Na ditadura, nos acusavam de comunistas e diziam que nós matávamos até freiras, mas quem matava freira, padre, criança eram os coniventes com o regime!”, desabafa o ex-preso político. Barbosa permaneceu por oito meses no “presídio-escola” e seguiu sendo perseguido após ser liberado.

Documento de abril de 1964 solicita local para uso das forças militares |
REPRODUÇÃO MUSEU DA BRIGADA MILITAR/DIVULGAÇÃO/JC

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