Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Lazer

- Publicada em 26 de Abril de 2018 às 22:21

Viaduto do Brooklyn: um lugar dividido entre a arte e o ruído

Local é utilizado para eventos como rodas de samba; incomodada, parte da vizinhança decidiu acionar o MP

Local é utilizado para eventos como rodas de samba; incomodada, parte da vizinhança decidiu acionar o MP


/MARIANA CARLESSO/JC
Há cerca de dois anos, o viaduto Imperatriz Dona Leopoldina vem se tornando um ponto de atividades culturais e concentração noturna entre a Cidade Baixa e o Centro Histórico, em Porto Alegre. Rebatizado, de modo informal, como viaduto do Brooklyn, o espaço era, inicialmente, tomado por skatistas e, hoje, concentra também músicos, poetas, artistas de rua e boêmios no coração da Capital. Parte dos moradores, porém, organizou-se para reclamar do barulho gerado pelos grupos, ao ponto de acionar o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), que abriu um inquérito.
Há cerca de dois anos, o viaduto Imperatriz Dona Leopoldina vem se tornando um ponto de atividades culturais e concentração noturna entre a Cidade Baixa e o Centro Histórico, em Porto Alegre. Rebatizado, de modo informal, como viaduto do Brooklyn, o espaço era, inicialmente, tomado por skatistas e, hoje, concentra também músicos, poetas, artistas de rua e boêmios no coração da Capital. Parte dos moradores, porém, organizou-se para reclamar do barulho gerado pelos grupos, ao ponto de acionar o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), que abriu um inquérito.
A investigação está nas mãos da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente e foi aberta a partir de um abaixo-assinado, somando cerca de 80 assinaturas de residentes nas redondezas. As reclamações, segundo a promotora Ana Marchesan, têm origem em, pelo menos, dois grupos distintos de moradores, localizados tanto na avenida João Pessoa quanto na Sarmento Leite. O principal problema, segundo as queixas recebidas pelo MP-RS, é mesmo o barulho, que se propagaria mais facilmente na medida em que as atividades acontecem na rua, sem nenhum tipo de isolamento acústico. "Há vários focos potenciais de ruído, como os blocos (carnavalescos), os bares e os eventos de pré-Carnaval", enumera.
No momento da entrevista ao Jornal do Comércio, dois dos grupos responsáveis pelas atividades culturais na região já haviam sido ouvidos. Outro coletivo, que a promotora não quis nomear, teria se ausentado na data marcada, e outras pessoas ainda estão sendo contatadas. Também está sendo aguardado o resultado de laudos que vão medir uma eventual poluição sonora no viaduto. Após ouvir as partes, a primeira tentativa será de um acordo com os segmentos, além de, na medida em que for constatado que o barulho passa dos limites, uma intimação à prefeitura para que amplie a fiscalização na região. Embora não descarte o arquivamento, Ana considera esse desenlace "meio difícil" de ocorrer, na medida em que a simples presença das reclamações indicaria uma situação de conflito em andamento.
A visão dos artistas e coletivos que fazem uso do Brooklyn é outra. Para eles, a presença de pessoas teve efeitos positivos na revitalização de um espaço degradado e inseguro, além de transformá-lo em um dos principais vetores de efervescência cultural na Capital. Em resposta conjunta, o coletivo Bloco da Laje, que reúne artistas porto-alegrenses para eventos de preparação para o Carnaval, confirmou ter comparecido em audiência proposta pela promotoria, no final de março, que também contou com a presença de moradores, comerciantes e representantes da prefeitura. "Nessa audiência, recebemos uma reclamação formal por termos ensaiado três vezes no local. Vale dizer que nenhum desses ensaios foi divulgado externamente e que foi respeitado o horário de silêncio. Ao fim da reunião, perguntamos se poderíamos voltar a ensaiar lá, e a resposta foi negativa, por parte da promotoria", afirma o coletivo.
Os integrantes do bloco consideram "grave" a proibição, na medida em que o poder público deveria "promover e facilitar esses eventos que tanto contribuem em vários níveis para a saúde da cidade". "Porto Alegre está carente de espaços de cultura, convívio e afeto. Entendemos que o bom senso e o diálogo são fundamentais para chegarmos em um denominador comum, no qual todos possam usufruir do viaduto de maneira saudável. É uma pena que um coletivo com sete anos de trabalhos na rua seja coagido dessa forma", diz a resposta escrita do grupo. O Bloco da Laje garante que vai "buscar dialogar com outros grupos que ocupam o espaço para chegar a soluções para o impasse".
No momento, os movimentos socioculturais que frequentam o Brooklyn buscam se organizar para contrapor as denúncias. Para esta sexta-feira, estava prevista uma reunião aberta de diferentes segmentos, tentando construir um posicionamento coletivo em torno da questão. De acordo com Diego Silva, um dos músicos do grupo Encruzilhada do Samba, um segundo abaixo-assinado está sendo preenchido com assinaturas coletadas entre os frequentadores e os moradores da região, favoráveis à utilização atual do viaduto.
"Hoje, o Brooklyn é o principal espaço cultural de Porto Alegre, não tenho dúvidas. Espaços como este, que surgem espontaneamente, dão conta de uma demanda que não pode ser ignorada. Há locais públicos abandonados pela gestão, e há uma população carente de espaços para realizar atividades culturais", argumenta.

Para músico, há disputa entre os usos privado e público do viaduto do Brooklyn

Há cerca de quatro meses, o grupo Encruzilhada do Samba promove, todas as terças-feiras, rodas de samba no viaduto do Brooklyn. Segundo o músico Diego Silva, a mudança foi em busca de um espaço mais amplo, já que o viaduto Otávio Rocha, onde as rodas aconteciam anteriormente, estava ficando pequeno para o público crescente das apresentações.
"Sabíamos que havia outras questões em disputa naquele espaço. A vizinhança utilizava para estacionamento, arrancava as placas de proibido estacionar e deixava os carros ali. Quando o espaço sagrado dos automóveis foi violado por milhares de pessoas em busca de cultura, alguns proprietários ficaram incomodados. Então, desde sempre, foi uma disputa entre o uso privado e o público", afirma Silva.
Segundo ele, alguns moradores já vieram conversar informalmente sobre a situação, reclamando de alguns eventos específicos que usam equipamentos potentes de som e/ou avançam madrugada adentro. "Aparentemente, para a maioria dos moradores, o que falta é bom senso em um ou outro evento, mas, de um modo geral, há o apoio à continuidade dos eventos por ali", opina.
Os integrantes da Encruzilhada do Samba ainda não foram chamados pelo MP-RS, mas Silva diz esperar, de forma positiva, que isso aconteça. "O MP investiga porque houve denúncia. Se há uma investigação, parece adequado que todos os lados sejam ouvidos. Não há, aqui, vítimas e criminosos, mas dois lados disputando o direito de utilizar um espaço que é público", afirma o músico.

Realização de atividades culturais divide opiniões entre os moradores do entorno

Na terça-feira, cerca de 100 pessoas estavam presentes, durante boa parte da noite, na roda da Encruzilhada do Samba. Há dois anos morando a poucos metros do viaduto do Brooklyn, o técnico eletrônico Vinícius Dias diz que a movimentação deixou a área mais segura em vários horários, ao menos para pedestres. "Os assaltos diminuíram muito, mas sinto que estão furtando mais carros e motos agora, aumentaram as reclamações", diz ele. Embora não se incomode com o som dos instrumentos elétricos e de percussão, alguns vizinhos reclamavam dos eventos, em especial, dos que iam até mais tarde. "De uns meses para cá, não tem passado da meia-noite, mesmo nos fins de semana", alega Dias.
Nenhum dos populares que conversaram com a reportagem do JC assinou ou mesmo tomou conhecimento do abaixo-assinado enviado ao MP-RS, mas estavam cientes das queixas sobre o barulho. "Não me estresso, já morei em tantos lugares. A galera está se divertindo, isso é bom para a cidade", diz o funcionário público Délcio Black, que reside em um apartamento da rua Tuyuti. "Mas muitos vizinhos, em especial os mais idosos, reclamam. Da minha parte, acho que tem problemas bem maiores que merecem abaixo-assinado", comenta.