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Tributos

- Publicada em 10 de Janeiro de 2018 às 11:34

Em 10 anos, Brasil perdoou R$ 176 bilhões em juros e multas

Mais de 40 iniciativas foram lançadas pelo governo federal, inclusive voltadas a bancos e clubes de futebol

Mais de 40 iniciativas foram lançadas pelo governo federal, inclusive voltadas a bancos e clubes de futebol


/FREEPIK.COM/DIVULGAÇÃO/JC
Nos últimos 10 anos, o Brasil perdoou R$ 176 bilhões em juros e multas de dívidas tributárias. Os devedores foram beneficiados por meio de nove programas de parcelamento de débitos com o Fisco nesse período. O valor é praticamente o mesmo do rombo nas contas da Previdência Social apenas em 2017.
Nos últimos 10 anos, o Brasil perdoou R$ 176 bilhões em juros e multas de dívidas tributárias. Os devedores foram beneficiados por meio de nove programas de parcelamento de débitos com o Fisco nesse período. O valor é praticamente o mesmo do rombo nas contas da Previdência Social apenas em 2017.
O levantamento foi feito pela Receita Federal. Esses programas, conhecidos pela sigla Refis, permitem que empresas refinanciem dívidas com descontos sobre juros, multas e encargos. Muitas vezes, os juros são maiores que o débito original.
Em troca, o governo recebe uma parcela da dívida adiantada, mas abre mão de uma parte do que ganharia com juros e multas. A renúncia fiscal é calculada a partir desses descontos sucessivos nos parcelamentos especiais.
Só no ano passado, foram cinco Refis diferentes aprovados pelo Congresso, inclusive para a dívida de estados e municípios. Dois dos programas aprovados em 2017 ainda estão em discussão: um para beneficiar pequenas e microempresas que declaram pelo Simples Nacional e o outro para produtores rurais. O presidente Michel Temer vetou o primeiro, na semana passada, mas um acordo foi costurado para a derrubada do veto assim que o Congresso voltar aos trabalhos depois do recesso de fim de ano. Temer também deve vetar parcialmente o parcelamento para produtores rurais. As negociações desses programas se misturaram ao longo do ano passado com a busca de apoio do Palácio do Planalto para derrubar as duas denúncias contra o presidente e aprovar a reforma da Previdência.
Pelo levantamento da Receita, a maior renúncia foi dada no Refis da Crise, lançado em dezembro de 2008, depois que as empresas brasileiras foram atingidas pelo impacto da crise financeira internacional. A renúncia fiscal chegou a R$ 60 bilhões. Esse foi o programa com maior adesão até agora, com participação de 886 mil empresas e pessoas físicas. O Refis da Crise acabou sendo reprisado depois com mais quatro reaberturas do prazo de adesão entre 2013 e 2014.
O apelido de Refis nasceu do nome do primeiro parcelamento especial, feito há 18 anos, durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na época, o programa foi destinado somente a empresas. De lá para cá, já foram 39 programas, segundo a Receita Federal, inclusive para bancos e clubes de futebol.
Para o professor de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP) Heleno Torres, os sucessivos Refis são consequência de uma cultura de litígio que motiva os contribuintes a questionarem os débitos na Justiça. "O sujeito, ciente de que o sistema de cobrança é muito falho, passa a ser um devedor e um litigante contumaz", diz Torres.
"Entre um contribuinte que paga os tributos em dia e outro que logra êxito nesses parcelamentos, o último sai com vantagem competitiva. O primeiro, então, não vê nenhuma vantagem em ser um bom contribuinte", pontua o especialista.
O Fisco calcula uma perda anual de R$ 18,6 bilhões de arrecadação decorrente de contribuintes que deixam de pagar suas obrigações tributárias à espera de um novo parcelamento. Para o secretário da Receita, Jorge Rachid, o grande número de parcelamentos provoca essa quebra da arrecadação futura.
Segundo Rachid, há casos de mesmas empresas terem participado de até cinco parcelamentos. "O Fisco acaba recebendo mais no ano (com os pagamentos à vista), mas o que está fazendo é abrindo mão de arrecadação no ano seguinte. E o contribuinte apostando que, no seguinte, ele vai poder deixar de pagar", lamenta o secretário.
Estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre parcelamentos em 26 países mostrou que, na maioria deles, o período máximo de parcelamento é de 12 ou de 24 meses. Só em casos especiais, esse prazo é alongado. E, nesses casos, é exigida garantia. Não são conhecidos parcelamentos em prazos tão alongados como os brasileiros, que variam de 60 até 240 meses.

Petrobras aderiu três vezes ao Refis, com economia de R$ 2,9 bilhões

Entre as empresas que receberam perdão de parte de suas dívidas no ano passado estão algumas das maiores do País, como Petrobras, Ambev, BRF e JBS. Só a companhia dos irmãos Wesley e Joesley Batista - que estão presos desde setembro sob acusação de uso de informação privilegiada e manipulação de mercado - anunciou, em outubro, que economizaria R$ 1,1 bilhão aderindo ao programa do governo.
Na Petrobras, foram três adesões, que resultaram em uma economia de R$ 2,9 bilhões - 30% das dívidas renegociadas. Já a BRF teve um impacto positivo em seu resultado financeiro de R$ 220 milhões com a adesão. A Ambev não informou quanto economizou, apenas que pagaria R$ 3,5 bilhões - R$ 1 bilhão no ano passado e o restante, em 145 parcelas mensais.
As companhias não comentam suas adesões, mas, segundo consultores da área, elas veem no Refis uma oportunidade para encerrar ações tributárias que correm na Justiça. "As empresas já contam com o fato de que o governo lançará, a cada três ou cinco anos, um programa de parcelamento de tributos. Elas enxergam nesse sistema uma política paliativa (ao complexo sistema tributário brasileiro) e uma oportunidade para limpar a casa", diz o diretor executivo de contencioso tributário da EY (antiga Ernest Young), Murillo Villas.
A advogada Cassandra Alcade, da Delloite, diz que há discussões tributárias que podem levar até 17 anos para serem resolvidas. Quando o governo lança um Refis, as empresas aproveitam para analisar se é mais vantajoso aguardar uma decisão da Justiça ou pagar a dívida parcelada e com desconto. "(O Refis) hoje faz parte da gestão de contencioso das empresas", afirma Cassandra.

Receita estuda promover mudanças no Código Tributário

Rachid explica que objetivo é restringir os parcelamentos

Rachid explica que objetivo é restringir os parcelamentos


/WILSON DIAS/ABR/JC
O número cada vez maior de Refis reacendeu o debate sobre a necessidade de botar freio legal nessas concessões. O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, salienta que o órgão está elaborando um projeto que altera o Código Tributário Nacional para restringir os parcelamentos.
Segundo Rachid, a proposta busca uniformizar os programas, nas três esferas de governo, e vedar a exclusão de juros e multas. "É justamente para evitar prazos alongados e reduções generosas", adianta o secretário. O prazo limite hoje dos parcelamentos convencionais é de 60 meses.
A proposta está sendo desenhada com estados e municípios. Os estados já aprovaram, em novembro de 2017, um convênio que estabelece as condições gerais para concessão dos parcelamentos de 60 meses.
O diretor de estudos técnicos da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Unafisco), Mauro Silva, defende também a alteração do Código Tributário. Segundo ele, projeto de lei do Senado impede que um contribuinte assuma obrigações tributárias já esperando por algum tipo de vantagem. "Tem que haver limite para os parcelamentos", defendeu Silva.
Para o relator do Refis dos pequenos negócios, deputado Otavio Leite, o problema só será resolvido com uma reforma tributária. "Chega de remendos tributários para validar puxadinhos fiscais. É hora de votar uma lei inovadora que unifique tributos e estruturas administrativas para permitir diminuição da carga tributária", determina Leite.

MPEs mantêm expectativa em programa para o segmento

Afif diz que objetivo é derrubar veto ao sistema para microempresas

Afif diz que objetivo é derrubar veto ao sistema para microempresas


/WILSON DIAS/AGÊNCIA BRASIL/JC
O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), parlamentares e organizações que congregam micro e pequenos empresários se reuniram na semana passada em Brasília para discutir estratégias com o objetivo de derrubar o veto à criação de um programa de refinanciamento de dívidas do governo federal para o segmento, conhecido como Refis das micro e pequenas empresas.
No dia 5 de janeiro, o presidente Michel Temer vetou integralmente o texto aprovado pelo Congresso que instituía benefícios nos termos de pagamento de débitos com a União, a exemplo do que já havia sido aprovado para grandes empresas. A justificativa para o veto é que a medida fere a Lei de Responsabilidade Fiscal ao não prever a origem dos recursos que cobririam os descontos aplicados a multas e juros com o parcelamento das dívidas.
A proposta concedia descontos em juros e multas para criar melhores condições de quitação dos débitos dessas empresas. Segundo o texto, 5% desses valores deveriam ser pagos em espécie em até cinco parcelas, e o restante poderia ser dividido em até 15 anos.
Durante a reunião, os participantes avaliaram que há clima para a derrubada do veto no Congresso, pois diversas bancadas apoiam a proposta. "A causa é abraçada por parlamentares de todas as linhas. É um tema suprapartidário, tratado por parlamentares do governo e da oposição e que, quando da votação, teve quase unanimidade", disse o deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), relator da matéria na Câmara.
Um dos desafios é conseguir incluir o tema na pauta do Congresso Nacional. Derrubadas de veto são temas de sessão conjunta do Parlamento, que precisa ser convocada pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Mas a pauta das duas casas deve ficar ocupada, neste início de ano, com a tentativa de votação da proposta do governo de reforma da Previdência.
A preocupação do segmento é com os impactos da ausência de um programa de refinanciamento para o setor na sustentabilidade das micro e pequenas empresas. De acordo com o Sebrae, mais de 600 mil empreendedores foram notificados pela Receita Federal por dívidas com o governo federal. Quem não fizer a regularização dos débitos corre o risco de ficar fora do regime de tributação simplificado, conhecido como Simples Nacional, o que pode gerar aumento de custos em razão da oneração maior.

Estimativa aponta que metade de quem adere ao Refis fica inadimplente

Metade das empresas e pessoas físicas que aderem aos programas de parcelamento de débitos fica inadimplente com as parcelas e deixa de pagar impostos, segundo a Receita Federal. A maioria dos contribuintes acaba sendo excluída por inadimplência e opta por incluir a dívida parcelada em outros programas. São os chamados "viciados dos Refis".
Para a área técnica do Fisco, a concessão reiterada de parcelamentos sob condições especiais criou uma acomodação nos contribuintes, que não se preocupam mais em liquidar suas dívidas. Pelos números da Receita, os contribuintes que aderiram a três parcelamentos especiais ou mais detêm um dívida de mais de R$ 160 bilhões. Desse valor, 68,6% são dívidas de contribuintes sujeitos a acompanhamento diferenciado dos fiscais da Receita Federal.