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Contas públicas

- Publicada em 17 de Janeiro de 2018 às 08:24

Regra de ouro reforça urgência de debate fiscal


JANNOOON028/FREEPIK.COM/DIVULGAÇÃO/JC
Diante da repercussão negativa provocada pela notícia de que a equipe econômica estaria estudando uma flexibilização da regra de ouro - que proíbe o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como folha de salários - o presidente Michel Temer decidiu adiar o debate. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, destacou que não há qualquer risco de descumprimento da regra em 2018 e que o foco agora tem que ser de trabalho pela aprovação da reforma da Previdência. Já o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, destacou que a dificuldade do governo para honrar a regra ocorre justamente porque o País tem despesas obrigatórias muito elevadas, especialmente com o pagamento de aposentadorias.
Diante da repercussão negativa provocada pela notícia de que a equipe econômica estaria estudando uma flexibilização da regra de ouro - que proíbe o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como folha de salários - o presidente Michel Temer decidiu adiar o debate. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, destacou que não há qualquer risco de descumprimento da regra em 2018 e que o foco agora tem que ser de trabalho pela aprovação da reforma da Previdência. Já o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, destacou que a dificuldade do governo para honrar a regra ocorre justamente porque o País tem despesas obrigatórias muito elevadas, especialmente com o pagamento de aposentadorias.
Na semana passada, Temer convocou a equipe econômica e mandou os ministros Henrique Meirelles e Dyogo Oliveira, darem dois recados ao mercado. O primeiro deles é que nada será discutido antes da reforma da Previdência. E o segundo é que qualquer mudança não envolverá uma simples suspensão da regra de ouro. Será preciso criar um mecanismo de ajuste automático nos gastos públicos quando a norma, que está prevista na Constituição, for descumprida. Com isso, o Palácio do Planalto espera acalmar investidores que ficaram preocupados com a gestão das contas públicas.
"A orientação do presidente confirma aquilo que já tínhamos adiantado, que não deve haver flexibilização ou suspensão pura e simples. O que podemos estudar, no momento adequado, são regras de autoajustamento, como, por exemplo, o que já foi colocado pelo teto de gastos. Acionamento automático de mecanismos ajustáveis", disse Meirelles em entrevista convocada depois da reunião com o presidente.
A Constituição prevê que as operações de crédito do governo não podem ser maiores que as despesas com investimentos. Isso serve justamente para que o governo não emita dívida para pagar despesas correntes. O problema é que a crise fiscal gerou um quadro em que o governo tem endividamento e gastos correntes elevados e investimentos baixos. "O que achamos é que (mudar a regra de ouro) não é uma discussão adequada para este momento. Agora, nós estamos focados na Previdência", disse Meirelles.
Já Dyogo Oliveira lembrou que a discussão deve ser retomada este ano por causa do Orçamento de 2019. "O que afeta a regra de ouro é o fato de que o nosso déficit fiscal é gerado pelo déficit da Previdência. O que temos que fazer é tratar da maior despesa do governo, que é a despesa com Previdência. É isso que ajuda a resolver o problema da regra de ouro", afirmou Oliveira.
A reunião de Temer com a equipe econômica também foi uma forma de colocar panos quentes sobre o mal-estar que a discussão fiscal gerou entre Meirelles e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), ambos interessados em disputar as eleições para presidente. Na semana passada, a equipe econômica chegou a começar a discutir ajustes na regra de ouro na casa de Maia com o deputado Pedro Paulo (PMDB), que trabalha numa Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para reduzir o engessamento do Orçamento no País.
No entanto, logo em seguida, Meirelles disse que o ideal não seria flexibilizar a regra. Maia interpretou isso como uma tentativa da equipe econômica de jogar o assunto no colo do Congresso e afirmou publicamente que, diante disso, não colocaria nenhuma alteração na regra de ouro em votação no Congresso.
Durante entrevista, Meirelles tentou afastar a ideia de que a equipe econômica está em conflito com o Congresso. Já Maia, perguntado se estaria orientando Pedro Paulo a não incluir a regra de ouro em sua PEC, afirmou que o tema jamais esteve na proposta de emenda à Constituição. "Nunca esteve. Foi coisa da equipe econômica. Como eles estão divididos, vamos tratar da PEC das despesas obrigatórias", destacou Maia.
O ministro do Planejamento explicou que o governo precisa debater a regra de ouro porque ela corre o risco de ser descumprida a partir de 2019. Segundo Oliveira, o desequilíbrio previsto no Orçamento do ano que vem está estimado entre R$ 150 bilhões e R$ 200 bilhões. Sem algum tipo de ajuste, o governo teria que encaminhar projeto de lei ao Congresso prevendo um corte de gastos nesse valor, sendo que isso é impossível. As despesas passíveis de contingenciamento (discricionárias) estão pouco acima de R$ 100 bilhões.
"Se você cortar toda a despesa discricionária do governo, ela é um pouco maior que R$ 100 bilhões. Se a gente cortasse tudo, ainda assim, não seria a solução", lamentou Oliveira. Meirelles e Dyogo Oliveira asseguraram que não há risco de descumprimento da regra de ouro em 2018, pois o governo já negociou com o Bndes a devolução de R$ 130 bilhões ao Tesouro. Esses recursos serão usados para reduzir o rombo nas contas públicas.
Diante do risco para o ano que vem, Temer pediu à equipe econômica que encontre alternativas para quando for enviado ao Congresso o Orçamento de 2019, o que tem de acontecer em agosto. Segundo interlocutores do Planalto, embora a equipe econômica tenha começado a debater o assunto com Pedro Paulo, Temer ainda não havia se posicionado sobre o assunto.
"Essa especulação sobre a regra de ouro começou sem que Temer tivesse fechado uma posição. Por conta disso, ele chamou uma reunião e pediu que a equipe econômica estude uma alternativa para cumprir o Orçamento de 2019, mas sem flexibilizar a regra", disse um aliado do presidente. Apesar do otimismo da equipe econômica em relação ao fechamento das contas de 2018, Pedro Paulo alertou que o adiamento do debate sobre a regra de ouro vai obrigar o governo a tomar medidas amargas ainda este ano. Segundo ele, não haverá problemas apenas em 2019.

Especialista alerta para o risco de um 'apagão' dos serviços públicos em 2019

Depois das críticas em torno da possibilidade de mudar a regra de ouro do Orçamento para evitar seu descumprimento, o governo decidiu adiar as discussões do tema para depois da reforma da Previdência. Ainda descartou flexibilizar ou suspender a norma constitucional, considerada vital para evitar a explosão da dívida pública.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que a orientação do presidente Michel Temer é apresentar uma proposta que crie mecanismos de ajuste nos gastos em caso de violação, mas que o assunto será debatido no "momento adequado". A Constituição hoje prevê que descumprir a regra de ouro é crime de responsabilidade, passível de impeachment.
Para a professora do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead/UFRJ), Margarida Gutierrez, o debate sobre a regra fiscal só reforça urgência de votar Previdência. Segundo Margarida, o que se discute é que não faz sentido flexibilizar a regra de ouro sem punição. A especialista indica, ainda, que sem a nova regra pode haver apagão dos serviços públicos e começar a não pagar aposentados, a exemplo do que já vem acontecendo nos estados. 
"A ideia do Meirelles é flexibilizar a regra de ouro e, cada vez que ela fosse flexibilizada, despesas obrigatórias deixariam de ser obrigatórias. Não sei até que ponto é boa, mas talvez seja viável. O risco dessa proposta é dizer que vai se comprometer e, na hora, acabar não conseguindo cumprir. Acontece a mesma coisa com a PEC do teto de gastos, que pode não ser cumprida em 2019", indica a especialista.
Para Margarida, a devolução dos R$ 130 bilhões do Bndes poderá dar uma folga, porque isso permite abater dívidas e, com isso, ganhar fôlego para a regra de ouro. "É uma receita que financia uma despesa. Mas depois não tem. O problema começa em 2019", sinaliza.
A alternativa, aponta, é fazer uso do caixa único do Tesouro, o que o governo já tem feito. "Uma parte dessa conta é dinheiro carimbado, mas uma parte significativa é formada por recursos que o governo pode usar para abater a dívida pública em determinados momentos e eventualmente pagar despesas correntes. Se o governo está tão preocupado com 2019 e quer flexibilizar a regra de ouro é porque provavelmente os recursos disponíveis hoje não serão suficientes para pagar a despesa corrente", prevê.
O fato é que a demora na implementação do ajuste fiscal e a incerteza política sobre as eleições presidenciais foram os principais fatores que levaram a agência de classificação de risco Standard & Poor's (S&P) a rebaixar, nesta quinta-feira, a nota de risco soberano do Brasil, de "BB" para "BB-". A perspectiva ficou estável, ou seja, não deve haver mudanças a curto prazo - a agência, porém, não descarta um corte no ano que vem, se o quadro fiscal não apresentar melhora significativa. A nota representa grau especulativo, ou seja, aponta risco para os investidores, e coloca o Brasil no mesmo patamar de Bangladesh e República Dominicana.

O que diz a lei

A regra de ouro está prevista na Constituição Federal e determina que as operações de crédito da União não podem ser maiores que as despesas de capital (essencialmente investimentos). Isso serve para evitar que o governo aumente sua dívida para pagar despesas correntes, como folha de salários e serviços, como luz e telefone de órgãos públicos. Quando a regra é descumprida, os gestores e o presidente da República podem ser enquadrados em crime de responsabilidade, o que poderia ser usado para pedido de impeachment.
A regra de ouro serve também para melhorar a qualidade do gasto público. O governo pode aumentar suas despesas desde que seja com investimento. Já para as despesas correntes, ela funciona como uma trava. Para especialistas, o formato faz com que o governo não possa jogar para gerações futuras o compromisso de arcar com despesas correntes.
É umas das três âncoras fiscais em vigor, ou seja, regras que o governo deve obedecer para equilibrar as contas e estabilizar a dívida do país. As outras são o teto de gastos (pelo qual as despesas primárias não podem crescer acima da inflação do ano anterior) e a meta de resultado primário, obtida pela diferença entre receitas e despesas primárias. Quando a diferença resulta numa sobra de recursos (superávit), é usada para abater juros da dívida pública.