Emancipar distritos criando novos municípios foi uma moda que vingou na segunda metade do século XX, inclusive no Rio Grande do Sul. Com o passar dos anos, isso, em muitas novas prefeituras, tornou-se um pesadelo para os administradores. Sem recursos, em meio à crise, o fato é que há encargos demais, alta carga de custeio, com Câmaras de Vereadores, secretários e todo o aparato burocrático, mesmo que necessário, para populações de 15 mil, 20 mil ou 30 mil habitantes.
Ora, é fácil de deduzir que manter coleta de lixo, ordenamento urbano, assistência à saúde e rede escolar custa caro. Como honrar essas obrigações é o trabalho, às vezes até insano, dos prefeitos eleitos após as precipitadas emancipações, com nítidos vieses populistas, político-partidários e sem um planejamento.
Há cidades no Nordeste em que nove em cada 10 trabalhadores com carteira assinada são funcionários da prefeitura. Com renda fixa e estabilidade, eles formam a elite de pequenas cidades. Quem não tem emprego na gestão municipal, trabalha no comércio ou tem como principal fonte de renda o Bolsa Família ou o Bolsa Safra, concedido aos agricultores que não conseguem fazer sua plantação, de feijão ou milho, vingar. Há cidades em que o comércio é pequeno, formado por padarias, botecos, pequenas lojas e mercados.
Desta forma, não surpreende quando se sabe que o Brasil tem 530 municípios onde mais de 80% do mercado de trabalho é bancado pelas prefeituras, segundo um levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), responsável pelo cálculo do Índice Firjan de Gestão Fiscal (IFGF). Ou seja, 10% dos municípios brasileiros bancam o mercado de trabalho local. Entre esses municípios, 96% estão em situação fiscal difícil ou crítica. Acontece que, desde a Constituição Federal de 1988, que alterou as regras de emancipação, o País ganhou mais de 1.500 novas cidades - o que representa custos mais altos para a manutenção de toda a estrutura municipal.
A grande maioria não tem arrecadação própria e depende das transferências estaduais e federais. As 530 cidades têm na prefeitura mais de 80% do mercado de trabalho e arrecadam apenas 3,5% de sua receita líquida. Isso é um percentual quatro vezes menor do que a média nacional. Há municípios emancipados de afogadilho em que a folha de pagamento corresponde a 58% das receitas, acima do limite prudencial de 57% estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Também os governos estaduais foram prejudicados com a paralisia econômica. Por isso, há uma instabilidade no recebimento do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) - que distribui uma parte da arrecadação do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a administração municipal.
Segundo o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, com a Constituição de 1988, várias obrigações, antes bancadas pelo governo federal, passaram para a esfera municipal, a exemplo de saúde, educação e assistência social.
Para ajudar nas despesas, foram criados vários programas de repasse de recursos para os municípios. Mas os valores, hoje, são insuficientes para cobrir os gastos. Aí, o sonho da emancipação político-administrativa tornou-se um pesadelo sem fim. E, sem dinheiro, não surpreende a instabilidade e o confronto costumeiro entre funcionalismo, setores da população e prefeitos. A insatisfação, natural, vem no rastro da falta de verbas.