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centenário da revolução russa

- Publicada em 23 de Outubro de 2017 às 22:19

A ascensão do stalinismo e a consolidação da URSS


STF/AFP/JC
Com a conquista do poder, os revolucionários tinham, agora, o mais duro desafio pela frente: consolidar um regime socialista em um país agrícola e com o resto do mundo do outro lado do campo político e econômico. Tendo um regime estruturado no grupo que promoveu a revolução, o novo governo tratou de avançar no sentido de garantir mais direitos às minorias. Em 1917, as mulheres passaram a ter direito ao voto, houve a facilitação do pedido de divórcio, o aborto foi legalizado logo depois, em 1920, e ocorreu a revogação da proibição de práticas homossexuais da legislação russa.
Com a conquista do poder, os revolucionários tinham, agora, o mais duro desafio pela frente: consolidar um regime socialista em um país agrícola e com o resto do mundo do outro lado do campo político e econômico. Tendo um regime estruturado no grupo que promoveu a revolução, o novo governo tratou de avançar no sentido de garantir mais direitos às minorias. Em 1917, as mulheres passaram a ter direito ao voto, houve a facilitação do pedido de divórcio, o aborto foi legalizado logo depois, em 1920, e ocorreu a revogação da proibição de práticas homossexuais da legislação russa.
Além disso, explica o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Paulo Fagundes Visentini, houve uma explosão de urbanização. A coletivização da agricultura visava aumentar e modernizar a produção agrícola para, com menos gente trabalhando, produzir mais para poder alimentar as cidades. Reorganizar essa produção liberava gente do campo e aumentava a população das cidades. A transição, no entanto, não foi simples, uma vez que os trabalhadores agrários tiveram certa dificuldade para se adaptar. "O camponês trabalha no ritmo da natureza; e o operário, no ritmo abstrato do relógio", compara Visentini. Aos poucos, a população teve acesso à educação, que passou a ser disponibilizada pelo Estado e obrigatória até os 12 anos.
As dificuldades internas não foram as únicas. A tomada do poder pelos bolcheviques não foi vista com bons olhos ao redor do mundo. Pela primeira vez, surgia um sistema pós-capitalista, que derrubou o capitalismo para criar um novo sistema, ainda desconhecido. Aos olhos das potências, era um mau exemplo. "Até a Igreja, que, durante a Revolução Industrial, perdeu fiéis, encontrou um novo campo de pregação: o diabo voltou e é vermelho. A reação do mundo, de modo geral, foi hostil", conta Visentini.
Depois da revolução, as conversações de paz entre alemães e russos se iniciaram, e, em março de 1918, foi assinado o Tratado de
Brest-Litovsk, para oficializar a saída da Rússia da Primeira Guerra, que vitimou cerca de 4 milhões de russos.
Mesmo que os bolcheviques tenham tido sucesso ao derrubar o governo provisório pós-czar, os ânimos não eram unânimes no país. De 1918 a 1921, militantes de diversos partidos se enfrentaram em uma Guerra Civil, cada um com intenção de implantar o próprio sistema. Nações estrangeiras intervieram, pois não queriam que as ideias comunistas se espalhassem pela Europa Ocidental. O Exército Vermelho, no entanto, se impôs.
A Rússia pós-Guerra Civil - economia, transporte e parque industrial - estava em ruínas. E, para completar o cenário, os camponeses estavam descontentes com as requisições de alimentos. Para conter os ânimos, Lênin lançou a Nova Política Econômica (NEP), que reintroduziu a moeda e o sistema bancário estatal, o trabalho assalariado, a transmissão hereditária da propriedade, o imposto em vez das requisições, o comércio interno privado e as privatizações de indústrias com menos de 20 operários. A intenção era estimular a produção agrícola e de bens de consumo.

A vitória do 'Socialismo de um Só País'

O ano de 1922 marcou uma inflexão na Rússia revolucionária. O afastamento de Lênin por condições de saúde reforçou tendências de burocratização, de abandono do debate teórico e de autoritarismo. De um lado, a oposição operária de
Trótski, que atacava a NEP, e, de outro, Stálin, que apoiava o campesinato. Também em 1922, nascia a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), que reunia Rússia, Ucrânia, Bielorrússia e Transcaucásia (depois subdivida em Geórgia, Azerbaijão e Armênia).
Com a morte de Lênin, em 1924, o confronto entre Stálin e
Trótski se agravou. Em 1925, Stálin formalizou a teoria do "Socialismo em um Só País", argumentando que a União Soviética teria de construir as bases econômicas do socialismo mediante um esforço próprio. "Não foi muito difícil esse grupo do Stálin ganhar a disputa. Embora fosse mais brilhante, o que Trótski propunha trazia uma grande oposição internacional", comenta o professor Visentini, autor do livro "Os Paradoxos da Revolução Russa" (Editora Alta Books, preço sugerido R$ 44,91).
A década seguinte foi de investimento na indústria de base, visando suprir um exército para uma hipotética guerra no futuro, que poderia dar fim à experiência comunista. Cumprindo-se as previsões, explode, em 1939, a Segunda Guerra Mundial. A URSS assumiu papel de protagonista do conflito e foi a nação que mais perdeu vidas: cerca de 20 milhões. Sob o comando com mão de ferro de Stálin, o Exército Vermelho derrotou o nazismo de Adolf Hitler no Leste Europeu, consagrando a União Soviética como uma potência mundial.
Foi só em 1945, quando do fim da Segunda Guerra, que a estrutura da URSS ficou completa, composta por 15 repúblicas federadas (ver mapa). "Era o ápice da URSS. Foi criado um superestado, que era associado ao partido. Tanto fazia o cidadão ser russo, ucraniano, desde que fosse favorável a essa transformação", explica Visentini.
Figura controversa, ao mesmo tempo responsável pela derrota do Terceiro Reich e um ditador cruel, Stálin é visto como oposição às figuras de Lênin e de Trótski - o qual foi assassinado por ordem de Stálin em 1940, no México. A postura de historiadores difere com relação ao papel deles na revolução. Comparado a Stálin, Lênin é visto como um líder moderado. "Lênin foi o grande artífice da revolução. Soube fazer a releitura do marxismo dentro das condições que eram possíveis naquele contexto", comenta o doutor em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Fabiano Mielniczuk.
No entanto, a avaliação da índole do bolchevique é questão de opinião. "Se você acredita que Lênin era bonzinho, vai identificar o leninismo como algo bom, e o stalinismo, como algo ruim. Mas se você acha que o que aconteceu não foi necessariamente uma revolução democrática, foi um processo de tomada de poder e de imposição de uma visão, Lênin e Stálin são iguais", argumenta o professor. Mesmo assim, é inegável que o governo de Stálin, primeiro-ministro da URSS de 1941 a 1953, promoveu um retrocesso conservador.
Com o cenário geopolítico polarizado entre URSS e Estados Unidos, as próximas quatro décadas foram de troca de ameaças e de provocações - a Guerra Fria. O equilíbrio de forças fez com que nenhum míssil tenha sido disparado no período. "A Guerra Fria tem mecanismos de acomodação entre as superpotências. Como existia a possibilidade de que alguém devolvesse um míssil, ninguém dá o primeiro tiro", pondera Visentini. Com o fim da URSS, em 1991, essa atmosfera equilibrada se desfez. A experiência comunista chegava ao fim.