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Judicialização da saúde

- Publicada em 17 de Outubro de 2017 às 09:17

Projeto do CNJ quer diminuir número de ações

Para Pinto Filho, há uma 'tendência natural' dos juízes a conceder as liminares

Para Pinto Filho, há uma 'tendência natural' dos juízes a conceder as liminares


UNIMED DO BRASIL/DIVULGAÇÃO/JC
Segundo dados do Ministério da Saúde (MS), cerca de R$ 7 bilhões são dispendidos, todos os anos, para atender ações judiciais envolvendo compra de medicamentos ou custas de tratamentos. Alguns casos envolvem supostas fraudes, como a compra do medicamento Soliris, para tratamento de uma doença dos vasos sanguíneos e alvo de investigação federal, que aponta prejuízo de até R$ 1,2 bilhão. Levando casos do tipo em conta, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está promovendo iniciativas com o objetivo de dar a juízes maior respaldo técnico em suas decisões. Depois de uma interrupção, causada pela renovação de cadeiras no CNJ, o projeto deve ser retomado ainda no mês de outubro. 
Segundo dados do Ministério da Saúde (MS), cerca de R$ 7 bilhões são dispendidos, todos os anos, para atender ações judiciais envolvendo compra de medicamentos ou custas de tratamentos. Alguns casos envolvem supostas fraudes, como a compra do medicamento Soliris, para tratamento de uma doença dos vasos sanguíneos e alvo de investigação federal, que aponta prejuízo de até R$ 1,2 bilhão. Levando casos do tipo em conta, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está promovendo iniciativas com o objetivo de dar a juízes maior respaldo técnico em suas decisões. Depois de uma interrupção, causada pela renovação de cadeiras no CNJ, o projeto deve ser retomado ainda no mês de outubro. 
Entre as medidas, está a criação de um banco de dados, no qual pareceres técnicos elaborados por especialistas em saúde estarão disponíveis para consulta. Dentro da lógica de medicina baseada em evidências, o magistrado que tiver uma demanda ligada à saúde em mãos poderá buscar auxílio na ferramenta antes de determinar que governos arquem com a aquisição de próteses ou medicamentos, por exemplo.
O projeto, desenvolvido em parceria com o MS e instituições médicas, prevê também a capacitação dos Núcleos de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NAT-Jus) para uso do sistema. Outros cinco núcleos de apoio técnico devem auxiliar os NAT-Jus em casos mais complexos. A articulação da rede fica a cargo do Hospital Sírio Libanês, de São Paulo, e a ideia é que as notas técnicas solicitadas pelos juízes sejam enviadas em um prazo máximo de 72 horas. 
Durante a Convenção Nacional da Unimed, em Foz do Iguaçu (PR), o conselheiro nacional do CNJ e supervisor do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde do CNJ, Arnaldo Hossepian, reforçou que o objetivo não é criar barreiras para o paciente que efetivamente precise da Justiça, mas garantir que essas ações ocorram "de forma episódica e com qualidade". "Qualificar a judicialização traz benefícios a todo o setor da saúde. Na medida que o juiz se utilizar dessas ferramentas, ele poderá decidir com mais segurança, dentro do universo de conhecimento da medicina", aponta.
Arthur Pinto Filho, promotor de Justiça do Estado de São Paulo e integrante do Fórum, diz que há uma "tendência natural" dos juízes a conceder as liminares, uma vez que a omissão pode acarretar danos irreversíveis em casos comprovados de enfermidade. Essa inclinação, porém, estaria sendo aproveitada por pessoas inescrupulosas. "Isso inviabiliza inclusive prefeituras, porque esse dinheiro não tem uma rubrica própria: ele sai do SUS, da verba da saúde pública. Ou vai tirar da assistência básica, ou da alta complexidade, mas de algum lugar vai sair", acentua.
As medidas atendem à Resolução nº 238 do CNJ, que prevê a criação de comitês estaduais de saúde nos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais. A principal função desses colegiados é incentivar a implementação dos NAT-Jus em tribunais onde ainda estejam ausentes. Esses comitês devem contar com magistrados, gestores em saúde, entidades do sistema de Justiça e representantes dos sistemas públicos e suplementar de saúde.
Atualmente, 20 estados brasileiros têm unidades do NAT-Jus, em diferentes estágios de funcionamento e implementação. Também integrante do Fórum, o juiz de direito da Paraíba Marcos Coelho Salles acredita que a autorização por parte da ministra Cármen Lúcia, presidente do CNJ, vai acelerar a consolidação desses espaços e o uso da nova ferramenta. "Era preciso algo mais concreto (do que a resolução). Nós (juízes) vivenciamos dramas humanos. Ninguém quer dormir à noite com a responsabilidade da perda de uma vida."

No Estado, comitê levou à queda de processos

Atuação no Estado busca conscientização de atores, diz Schulze

Atuação no Estado busca conscientização de atores, diz Schulze


MARCO QUINTANA/JC
Enquanto os índices de judicialização da saúde crescem em escala nacional, o Comitê da Saúde do CNJ no Rio Grande do Sul comemora uma diminuição. Quando da criação do comitê, em 2010, o Estado tinha 120 mil processos em andamento. Hoje, segundo o coordenador do comitê e desembargador do Tribunal de Justiça (TJ-RS), Martin Schulze, o número não chega a 90 mil. Em 2016, o órgão registrou redução de 17% nos gastos com judicialização individual, no comparativo com o ano anterior.
A atuação do comitê tem privilegiado o esclarecimento de diferentes atores, com a realização de workshops no Interior e o incentivo a processos de mediação, promovidos pela Defensoria Pública. Assim, é possível resolver a maioria dos casos antes da abertura de processos.
Outro ponto positivo, segundo Schulze, foi a informatização do Sistema AME, que controla o fornecimento de medicamentos, permitindo a otimização. "Muitas vezes, se dá liminar com urgência para compra de medicamentos que já foram adquiridos para outro cidadão e estão em estoque. Assim, é possível puxar esse medicamento para atender a demanda em tempo hábil", exemplifica.
Na visão de Schulze, quem sofre mais com a judicialização são as prefeituras. "Muitas vezes o município é condenado a custear um tratamento que cabe à União ou ao Estado e, às vezes, o custo equivale a toda a folha de pagamento da cidade", diz. O trabalho junto aos municípios, explica, é de orientação para que expliquem ao sistema de Justiça que os processos não cabem a eles. "A estrutura do sistema de saúde é mesmo bem complexa. O magistrado, uma vez esclarecido, pode direcionar a ação."
De qualquer modo, os processos acabam acarretando custos. Na média, 92% das liminares pedindo urgência em tratamentos são concedidas pelo Judiciário gaúcho. Dados da Secretaria Estadual de Saúde apontam que, em 2016, foram gastos mais de R$ 275,8 milhões com ações, a maioria (R$ 210 milhões) envolvendo compra de medicamentos não previstos no SUS. O valor equivale a cerca de 15% de todo o orçamento da pasta.

Maioria das ações não reflete melhor atendimento, diz Unimed

Na visão de José Cláudio Ribeiro Oliveira, assessor jurídico da Unimed do Brasil, criou-se uma cultura na qual pessoas inescrupulosas só precisam "entrar com a ação, dizer que é urgente e o juiz vai conceder". "A pessoa de má fé acabou sendo beneficiada (por essa tendência). A partir do momento em que o Judiciário passa a ser mais criterioso, você destrói essa cultura", acredita.
O presidente da Unimed do Brasil, Orestes Pullin, concorda. Segundo ele, o setor privado também é alvo de ações pouco criteriosas. Na mais recente avaliação da cooperativa, de 5% a 6% do total de gastos são oriundo de ações judiciais. "Existem ações que são boas, digamos, que precisam ser realizadas. Na nossa avaliação, porém, a maioria delas não têm relação com qualidade de atendimento", afirma.
A alegação de que parte das ações é causada por uma eventual demora das empresas em incorporar novos medicamentos e tratamentos é rechaçada por Pullin. "Esse processo precisa ser feito de forma crítica. Muitas novidades que surgem têm um fundo comercial. A partir da avaliação do Ministério da Saúde, que determina se essas tecnologias são de fato benéficas, elas são imediatamente somadas ao rol das operadoras", garante.