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Teatro

- Publicada em 20 de Julho de 2017 às 22:26

Parece antigo, mas é bem atual

Apesar - ou por causa - da crise econômico-financeira que temos enfrentado, a criatividade tem gerado propostas alternativas e relativamente inovadoras de espetáculos teatrais na cidade. É o caso de Das cinzas coração, resultado do projeto Noite no circo, da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre, oriundo do espetáculo da Quimera Criações Artísticas. Contemplado com o Prêmio Funarte - Caixa Carequinha de Estímulo ao Circo, o trabalho de Valquíria Cardoso e Jéferson Rachewsky (dramaturgia), para a direção de Jéferson Rachewsky e interpretações dos mesmos Valquíria Cardoso e Jéferson Rachewsky - o trabalho de pequena duração, pouco mais de meia hora de espetáculo, é um sopro de vitalidade e alegria em nossa cena teatral.
Apesar - ou por causa - da crise econômico-financeira que temos enfrentado, a criatividade tem gerado propostas alternativas e relativamente inovadoras de espetáculos teatrais na cidade. É o caso de Das cinzas coração, resultado do projeto Noite no circo, da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre, oriundo do espetáculo da Quimera Criações Artísticas. Contemplado com o Prêmio Funarte - Caixa Carequinha de Estímulo ao Circo, o trabalho de Valquíria Cardoso e Jéferson Rachewsky (dramaturgia), para a direção de Jéferson Rachewsky e interpretações dos mesmos Valquíria Cardoso e Jéferson Rachewsky - o trabalho de pequena duração, pouco mais de meia hora de espetáculo, é um sopro de vitalidade e alegria em nossa cena teatral.
Não sei se filiaria este trabalho ao circo propriamente dito: entendo mito mais próximo à experiência do cinema mudo e, por consequência, da tradição do mimo, que é a dramatização sem palavras. Tanto isso é verdade que ambos os intérpretes estão caracterizados como os antigos atores do cinema mudo, inclusive com a música ao vivo (piano) de Arthur de Faria, devidamente caracterizado, a lembrar aqueles pianistas que acompanhavam a projeção cinematográfica, debaixo ou atrás da tela, quando o cinema ainda não falava.
A cenografia de Alex Limberger, Diego Steffani e Valquíria Cardoso é extremamente simples e, ao mesmo tempo, prática: no início, uma cama de casal como se vista de cima, com o marido e a mulher a dormirem e experimentarem pesadelos. Na hora do café matinal, a cama é baixada e imediatamente se transforma em uma imensa cozinha dotada de enorme fogão. A iluminação de Daniel Fetter tem bom uso e faz passar as cenas, como verdadeiros quadros cinematográficos. O enredo é simples e rapidamente solucionado: o marido se queixa da mulher, chega mesmo a tentar espancá-la, insatisfeito com suas ações. Ela foge, depois trata de enfrentá-lo e, enfim, abandona-o. Tudo isso, num roteiro simples, de bom desenvolvimento lógico, com as cenas construídas quase que com autonomia, pois cada uma delas tem uma abertura, um desenvolvimento e um desfecho. Reunidas, depois, resultam no entrecho antes resumido. O público dá boas gargalhadas pelo excelente desempenho de ambos os intérpretes, dotados de máscaras faciais bem realizadas e expressivas.
Não é fácil um ator, acostumado, contemporaneamente, a fazer uso da voz, limitar-se ao gesto e à expressão facial ou corporal para fazer sua cena. Mais que isso, este tipo de espetáculo exige dos intérpretes um timing perfeito, porque qualquer atraso resulta num desencontro dos movimentos de ambos os atores, como nesta cena, eis que um movimento se imbrica necessariamente no outro. A inovação, digamos, está no fato de o enredo culminar com a saída da mulher do lar, situação que evidentemente quebra a tradição machista deste tipo de texto que, normalmente, culminaria cm um pedido de perdão do marido e a recomposição do casal para, logo ali adiante, tudo voltar a repetir-se, como ocorre na vida real, atestada pelo espantoso número de mulheres vítimas de maus tratos pelo companheiro, conforme os registros policiais. Das cinzas coração, neste sentido, subverte o gênero, o que fica sugerido já no título da obra, pois sugere que, após o final do romance, o que subsiste é o sentimento, neste caso, a liberdade que é assumida pela mulher.
Bem caracterizados, bem ensaiados, bem treinados em relação ao roteiro dramático a que dão vida, os dois intérpretes ainda enfrentam o desafio da proximidade da cena em relação ao público, pois o espetáculo foi apresentado na Sala Álvaro Moreyra, o que obriga ainda a uma maior atenção por parte dos atores. Mas tudo corre muito bem, a sala lotada ajuda na criação do clima, e a adesão do público ao código da encenação também contribui para esta mágica comunhão que só o teatro alcança constituir, e temos aí um belo espetáculo que, ao mesmo tempo, recupera a experiência da cena do passado e a renova, com novas perspectivas. O espetáculo, pois, que para muitos pode parecer antigo, mostra-se bem atual.
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