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Direitos humanos

- Publicada em 05 de Maio de 2017 às 16:05

Quilombo ainda aguarda certificação de posse

Falta da certificação inviabiliza a inscrição das mais de 60 famílias em editais de ações afirmativas

Falta da certificação inviabiliza a inscrição das mais de 60 famílias em editais de ações afirmativas


JONATHAN HECKLER/JC
Quem vê as paredes desbotadas dos prédios da avenida Luiz Guaranha - que é, na verdade, uma pequena rua sem saída entre os bairros Menino Deus e Cidade Baixa - não sabe que ali ficam os herdeiros do Quilombo Areal da Baronesa. Desde o século XIX, o terreno é reduto de ex-escravos e seus descendentes, mas foi apenas em 2015 que uma lei garantiu aos quilombolas a certeza de que jamais serão expulsos do local. O documento da posse do território, contudo, nunca chegou às mãos da comunidade.
Quem vê as paredes desbotadas dos prédios da avenida Luiz Guaranha - que é, na verdade, uma pequena rua sem saída entre os bairros Menino Deus e Cidade Baixa - não sabe que ali ficam os herdeiros do Quilombo Areal da Baronesa. Desde o século XIX, o terreno é reduto de ex-escravos e seus descendentes, mas foi apenas em 2015 que uma lei garantiu aos quilombolas a certeza de que jamais serão expulsos do local. O documento da posse do território, contudo, nunca chegou às mãos da comunidade.
A falta da certificação inviabiliza a inscrição das mais de 60 famílias em editais de ações afirmativas voltadas para quilombos. "Achávamos que nossa vida melhoraria muito depois que nossa área fosse reconhecida, mas não foi bem assim", lamenta a líder comunitária Fabiane Xavier. A quilombola tem 40 anos e morou a vida inteira no Areal, assim como sua avó e sua bisavó.
Para Fabiane, o documento só não chegou por falta de vontade política da prefeitura. "O governo anterior justificava que a burocracia era grande para fazer o termo de posse. O novo, aparentemente, não está nem um pouco preocupado com as comunidades quilombolas nem com nada que envolva a temática da cultura negra, basta ver o que fizeram com o Carnaval", critica. A posse está em análise no setor de Urbanismo do município.
A líder comunitária se refere ao enxugamento da estrutura do Carnaval deste ano, que dependeu de verba da iniciativa privada para ser realizado. O dia do desfile das escolas da Série Prata precisou ser adiado, devido à falta de alvará de Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI). "Eu não posso afirmar que a relação com o novo prefeito será difícil, mas, se outros setores da cultura negra não obtiveram apoio, não temos muita esperança", admite. Os quilombolas solicitaram reunião com o prefeito Nelson Marchezan Júnior e aguardam agendamento do encontro.
Além do documento de posse, um perfil social que está sendo realizado pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) ajudará, também, na busca por recursos e apoios oriundos de programas de ações afirmativas. "Precisamos, para melhorar nossa condição de vida, que o governo disponibilize qualificação, aprendizado, cursos profissionalizantes, tanto para adultos quanto para crianças e adolescentes", afirma Fabiane. Há crianças da comunidade, por exemplo, que passam de ano, mas permanecem sem saber ler.
Coordenada pela assistente social da Ulbra Jacicleia Storki, a pesquisa sobre o perfil social do Areal da Baronesa foi iniciada há cerca de um ano e deve ser finalizada até o final de 2017. Jacicleia entrevistou as aproximadamente 60 famílias que vivem no local aos sábados, quando a maioria dos moradores não trabalha. E já identificou algumas tendências. "Há muita gente desempregada, com trabalho informal e baixa escolaridade, mesmo entre os jovens, o que me preocupou. Muitos jovens estão em idade universitária e não acessam o Ensino Superior", avalia.

Parceria com universidade qualifica vida na comunidade

Shiva da Baronesa passou a ser reproduzida para ser vendida como porta-joias

Shiva da Baronesa passou a ser reproduzida para ser vendida como porta-joias


JONATHAN HECKLER/JC
Toda semana, um grupo de mulheres se reúne na sede da Associação Comunitária e Cultural Quilombo do Areal para fazer artesanato. Quando têm dúvidas, pedem ajuda aos professores da Ulbra, que, há mais de dois anos, oferecem aulas de Design e Moda para as artesãs se qualificarem.
No ano passado, as artesãs pediram auxílio para produzir dez troféus, a serem oferecidos a pessoas de destaque da comunidade durante a Semana da Consciência Negra. "A ideia era fazer com um material bem simples, aí fizemos de papelão. Fizemos um vulto e usamos os conceitos da dança, muito forte na cultura negra, e de fazer de forma tridimensional, para dar a ideia de movimento. Aí, surgiu o que chamamos de Shiva da Baronesa", relata Nairo Moleda, professor de Design da Ulbra.
A proposta deu tão certo que a Shiva da Baronesa passou a ser reproduzida para ser vendida como porta-joias. "Pensamos em criar um produto com alguma utilidade e escolhemos o porta-joias. Estabelecemos que cada um seria um orixá. As mulheres desse grupo já têm a técnica, mas ainda falta aprenderem a agregar o design, para poderem vender para as mais diferentes classes sociais", explica Débora Quaresma, coordenadora dos cursos de Design, Design Gráfico e Design de Moda na universidade. O porta-joias é feito de MDF reutilizado. Os retalhos usados para a vestimenta do vulto são recebidos através de doações.
Além desse projeto, outras ações de empoderamento da comunidade têm tido andamento, como a realização de uma pesquisa sobre o perfil social das famílias habitantes do quilombo, negociações para montar uma biblioteca e oferecer aulas de reforço para as crianças quilombolas.
Segundo a líder comunitária Fabiane Xavier, como todo o apoio obtido é voluntário, ainda não foi possível diversificar mais os tipos de qualificação oferecidos, mas os quilombolas buscam parcerias para envolver os homens em outras formações possíveis. "Ainda não conseguimos uma renda muito boa com os nossos artesanatos, mas já sentimos muita diferença em sua qualidade", observa.
No ano passado, a universidade também promoveu um curso aos adolescentes sobre como se portar em entrevistas de emprego e em ambientes de trabalho. Atualmente, os jovens estão engajados na gravação de um documentário sobre o cotidiano no quilombo, orientados pelos alunos de Comunicação Social da instituição.