Porto Alegre,

Anuncie no JC
Jornal do Comércio. O jornal da economia e negócios do RS. 90 anos.

Publicada em 26 de Março de 2017 às 17:26

Momento é de incentivar a experimentação

 Mauro Segura - Marcas de Quem Decide

Mauro Segura - Marcas de Quem Decide

JC
Compartilhe:
Jornal do Comércio
Mauro Segura, diretor de Comunicação e Marketing da IBM Brasil, é talvez o executivo mais conectado do Brasil. Em 2008, criou o blog A Quinta Onda, que em determinados momentos registrou dois mil visitantes únicos por dia. Tamanho sucesso acabou em livro lançado no final de 2012, resultado de uma compilação de posts do seu blog, intitulado também "A Quinta Onda". No início de 2017, mudou de nome e endereço, mas continua mais ativo do que nunca no www.maurosegura.com.br, ainda postando conteúdo e agora fazendo experiências com vídeos.
Mauro Segura, diretor de Comunicação e Marketing da IBM Brasil, é talvez o executivo mais conectado do Brasil. Em 2008, criou o blog A Quinta Onda, que em determinados momentos registrou dois mil visitantes únicos por dia. Tamanho sucesso acabou em livro lançado no final de 2012, resultado de uma compilação de posts do seu blog, intitulado também "A Quinta Onda". No início de 2017, mudou de nome e endereço, mas continua mais ativo do que nunca no www.maurosegura.com.br, ainda postando conteúdo e agora fazendo experiências com vídeos.
Ele ainda está no Linkedin, no Facebook, tem publicado vídeos no YouTube e é blogueiro ativo no Meio&Mensagem e Café Brasil. Segura reconhece que a grande maioria dos líderes empresariais não são atuantes nas mídias sociais. "Aliás, a maioria nem está presente", afirma.
Em um dos seus artigos, ele disse que a única certeza nessa loucura toda é que o marketing que fazemos hoje estará morto na próxima década. Para viver essa transição ele sugere a experimentação contínua.
Formado em engenharia e análise de sistemas, com pós-graduação em marketing, possui mais de 25 anos de experiência em comunicação, marketing e vendas nas áreas de tecnologia e telecomunicações. Nos últimos anos se especializou na implementação das mídias sociais e no uso do marketing analítico nas empresas. Além disso, neste ano, Segura foi vencedor do Prêmio Executivo de TI, na categoria Executivo de Marketing.
Marcas de Quem Decide - Em 2017, a International Business Machines Corporation (IBM) completa 100 anos de atuação no Brasil. Nos últimos anos ocorreu a migração de uma empresa fabricante de hardware para uma prestadora de serviços e criadora de softwares para o meio corporativo. No momento que a IBM se transforma e cria tecnologias para ajudar as pessoas, a tecnologia muda o mundo. O que podemos esperar da IBM nos próximos anos?
Mauro Segura - A IBM é uma empresa centenária, mas que se transforma continuamente. Isso está no DNA da empresa. Não é meramente uma questão de sobrevivência, a transformação contínua está na essência do nosso propósito que é contribuir para o progresso da humanidade. Há 100 anos, a IBM começou vendendo relógios, balanças e até máquinas de moer café. Encontrou no seu caminho nas máquinas Hollerith, de perfurar, ler e tabular cartões de papel perfurados, que foi o início da empresa em lidar, produzir e gerenciar informação. Lançamos as máquinas de escrever elétricas e uma série de tecnologias inovadoras ao longo das décadas. A empresa protagonizou a era dos computadores. Também foi protagonista na era dos computadores pessoais. Também teve a coragem de se desfazer dos negócios que saíram do propósito de inovar e gerar progresso. Essa característica de inovar continuamente e abandonar o passado, produziu situações curiosas como a venda das unidades de computadores pessoais, de impressoras e das linhas de computadores médios - decisão tomada por volta dos anos 2000. A empresa se desfez dessas unidades, na época altamente demandantes pelo mercado, porque tinha a clareza que precisava fazer uma mudança de curso. Esses são apenas exemplos. Essa característica de se desapegar do passado está no perfil da empresa desde o início de sua trajetória. Desculpe a longa resposta, mas conto essa história para afirmar que a única certeza que tenho é que a empresa continuará se transformando aceleradamente nos próximos anos. No atual momento, estamos vivendo a chegada e a maturidade dos sistemas cognitivos que pensam, aprendem e raciocinam por eles próprios e de maneira parecida com os humanos. Isso é um salto enorme no que conhecemos como computação até agora, por isso chamamos da terceira era computacional, a era da computação cognitiva. Estamos apenas no início de um grande período de inovação disruptiva.
Abaixo, uma entrevista exclusiva de Mauro Seguro para o Marcas de Quem Decide.
MDQD - O sr. fez uma pesquisa sobre Valentim Bouças que, em 1917, tornou-se representante da IBM no Brasil, ainda funcionando com o nome de Computing Tabulating Recording Company. Ele é um exemplo lá no início do século 20 de visão de futuro, empreendedorismo, ao mostrar na prática que tecnologia traz progresso e desenvolvimento. O Brasil entendeu o seu legado?
MS - Valentim Bouças foi um sujeito obstinado. Com apenas 26 anos, partiu num navio a vapor para New York em busca de seu sonho. Isso aconteceu em 1917, em plena primeira guerra mundial. Ele não tinha dinheiro, apenas dívidas, mas conseguiu trazer a representação da IBM para o Brasil e o resto é história. Décadas depois ele se tornou um empresário e um líder brasileiro importante para nossa economia e para o desenvolvimento das nossas relações internacionais saudáveis com o resto do mundo, especialmente nas décadas de 40 e 50. A IBM Brasil foi a primeira unidade da empresa fora dos Estados Unidos e, até hoje, continuamos a ser pioneiros no grupo. Por exemplo, o Português (falado no Brasil) foi um dos primeiros idiomas que a nossa plataforma de serviços cognitivos IBM Watson aprendeu. Eu acredito que temos muitos empreendedores competentes no País. Eu sou privilegiado porque a minha posição executiva permite desenvolver relacionamento de todos os níveis. Garanto que temos excepcionais talentos e empreendedores no Brasil capazes de gerar inovação e transformação nos negócios e na sociedade como um todo. O caso do Valentim é uma bela história, mas pegue as histórias dos pioneiros que criaram grandes empresas nacionais no mercado e verá que as histórias desse pessoal são fascinantes, repleto de amor ao risco, paixão pelo país, ousadia, coragem, inovação e confiança num futuro melhor. Não olhe apenas as grandes empresas, veja negócios de qualquer tamanho ou segmento. O País está repleto de pessoas assim. Como povo, nós temos o perfil de se jogar nas coisas e fazer acontecer.
MDQD - A IBM promove startups por meio do IBM SmartCamp Brasil. Entre os pontos analisados pelo júri, estão questões que vão desde como as startups conseguem atrair e reter clientes, à forma como a solução é apresentada, o que ela traz de inovadora e se a mesma estaria preparada para um mercado competitivo. A partir desse evento, o que é possível dizer do potencial de nossas startups?
MS - Como disse anteriormente, acredito que temos muitos empreendedores competentes no País. No entanto, tenho uma visão muito pessoal em relação às startups e novos negócios. O fato mais que conhecido é que existem grandes obstáculos que prejudicam o potencial de crescimento de novos negócios no Brasil, que são: o acesso ao capital e ao crédito, a burocracia, os impostos, as leis protecionistas de mercado. Enfim, ao chamado "custo Brasil" que se impõe a qualquer negócio, seja ele novo ou já estabelecido. Nós não temos falta de talentos humanos, criatividade, iniciativa, capacidade de articulação, capacidade técnica, influência de mercado e outras condições essenciais para criação, planejamento e execução de novos negócios. Encontramos no mercado brasileiro um número enorme de empreendedores capazes e preparados para se lançar num novo negócio. O que falta são condições mais favoráveis para quem quer tomar risco e iniciar um negócio. Infelizmente, temos uma dependência muito grande de uma mudança de postura do governo, mas estamos evoluindo.
MDQD - Recentemente, o sr. disse que a maioria dos líderes empresariais não avalia as mídias sociais como um canal valioso de relacionamento e engajamento pessoal com clientes e sociedade. Ao mesmo tempo, entende que é uma ilusão imaginarmos um CEO pendurado em seu smartphone respondendo a mensagens e posts que chegam por todos os lados, o dia inteiro. Como achar o ponto de equilíbrio?
MS - Você fez a pergunta certa. O ponto de equilíbrio é a grande questão. Nessa discussão o que me incomoda é constatar que a grande maioria dos líderes empresariais não são atuantes nas mídias sociais. Aliás, a maioria nem está presente. Isso é um equívoco e uma percepção errada a respeito do mundo das redes sociais. Concordo em parte com o feedback que recebo de muitos líderes empresariais, quando eles dizem que as mídias sociais podem causar perda de tempo e distração. No entanto, não podemos generalizar, a decisão de como usar e se beneficiar é individual. Enfim, acredito que todo líder empresarial deveria separar algum tempo diário para viver a experiência em uma mídia social de sua preferência, lendo, comentando ou até criando algum conteúdo. Isso deveria constar na agenda do dia. Seria legal ele próprio identificar o que as pessoas estão falando dele, da empresa que lidera, dos negócios, o que desejar. Essas pessoas podem ser seus clientes, seus funcionários ou seus concorrentes. Para mim é incrível ainda ver líderes de organizações ausentes e isolados das mídias sociais. Vejo que essa situação mudará radicalmente com a nova geração que já está assumindo no comando das empresas. A liderança mais jovem é muito mais engajada no universo social digital.
MDQD - O sr. é muito atuante nas mídias sociais principalmente como articulista, com um blog de sucesso chamado A Quinta Onda, que durou de 2008 até 2016. Essa pode ser uma forma de estar nas mídias sociais sem ficar envolvido o tempo todo?
MS - O blog Quinta Onda começou como um projeto de vida curta. Era para durar alguns meses. Deu tão certo e eu curti tanto, que ele foi em frente e viveu todo esse tempo. Como tudo na vida, o blog ficou velho e amarrado a uma plataforma antiga. O blog não morreu, apenas mudou de nome e endereço. Continua mais ativo do que nunca. Agora estou no www.maurosegura.com.br, ainda postando conteúdo e agora fazendo experiências com vídeos. Pegando carona no que você afirma em sua pergunta, ter um blog é uma alternativa de você viver o mundo online social de um jeito onde você pode ter um pouco mais de controle nas coisas, mas não pense que a minha vida no mundo online se concentra apenas no blog. Como executivo de uma empresa, acho fundamental ser atuante no Linkedin, que é uma mídia que cresce exponencialmente em importância no mundo corporativo. Desde o ano passado que tenho publicado vídeos no YouTube, onde eu produzo tudo, sem ajuda de ninguém. Faço isso porque não dá para delegar quando você precisa aprender alguma coisa. Portanto, eu faço tudo. E, finalmente, o Facebook. Como ficar fora dessa mídia? Impossível! Por fim, sou blogueiro ativo no Meio&Mensagem e no Café Brasil, dois canais de produção de conteúdo riquíssimo onde me sinto honrado de contribuir regularmente. Algumas pessoas me perguntam como faço para lidar com todas essas mídias e todos os estímulos que elas nos proporcionam. Eu tenho uma rotina durante a semana que tento seguir. Eu separo um tempo diário na minha agenda para acessar as mídias sociais, olhar as notificações, curtir e comentar publicações. Fora esse tempo eu não acesso as redes, com exceção de pequenos momentos efêmeros, como dentro de um elevador ou num táxi, onde pego o meu smartphone e vejo as notificações recebidas. Além disso, eu estou sempre com um bloquinho de papel tomando notas e escrevendo rascunhos de posts para serem publicados nos blogs que participo.
MDQD - Antigamente o cliente ficava no sofá, agora está na nossa frente, virou o centro de tudo. Eles querem experiências individualizadas, personalizadas. No meio disso tudo tem as novas tecnologias. Para o sr., aí reside o desafio do marketing. Como trabalhar de forma correta com soluções Big Data e Analytics, inteligência artificial, realidade aumentada, drones, robótica e Internet das Coisas, as novas formas que os seres humanos se relacionam?
MS - Essa é uma excelente pergunta. Os CEOs, os profissionais de marketing, todo o ecossistema que orbita ao redor do marketing está passando por um tsunami. A impressão que temos é que tudo que aprendemos antes, que tudo fizemos antes, não vale mais no mundo que vivemos hoje. Todas essas tecnologias que você citou permitem alimentar duas necessidades fundamentais no consumidor atual: personalização e experiência. O consumidor não quer mais ser tratado como alguém pertencente a um segmento de mercado. Ele quer individualização, atendimento e produtos personalizados. Além disso, exige um tratamento diferente das marcas. Não quer apenas comprar ou consumir um produto, mas ele quer uma experiência diferente. Pode ser uma experiência no atendimento, o uso do produto ou até no momento que ele liga para um call center para pedir uma ajuda ou fazer uma reclamação. Tudo isso que falei só é possível com a adoção massiva de tecnologias. É nesse ponto que surge o maior desafio porque os profissionais e líderes de marketing não dominam tais tecnologias. Aliás, nem conhece todas elas. Tudo isso é muito novo, na verdade poucas pessoas dominam poucas novas tecnologias. Portanto, responder a sua pergunta é desafiador. Acho que a única recomendação que posso fazer aqui é incentivar a experimentação. Ou seja, os gestores de marketing e as marcas têm que tomar riscos, experimentar usar novas tecnologias, adotar as novidades tecnológicas como algo fundamental para os seus negócios. Não precisa fazer tudo junto e nem fazer loucuras, mas partir para uma jornada de adoção de novas tecnologias, lenta e contínua, é crucial para a transformação de qualquer negócio.
MDQD - O sr. tem afirmado que a única certeza nessa loucura toda é que o marketing que fazemos hoje estará morto na próxima década. Como fazer essa transição?
MS - Essa resposta segue a linha da resposta anterior: adotar a experimentação contínua. Para que isso ocorra dentro das empresas, é necessária uma mudança de postura. Alguns passos são evidentes. Eis alguns: O time de marketing das empresas precisa mudar de comportamento, sair da defesa e ir para o ataque. Precisa assumir riscos. Precisa se desenvolver em novas competências, especialmente marketing digital, novas tecnologia e técnicas inovadoras, como growth hacking. Precisa adotar massivamente ferramentas tecnológicas para automação do marketing, de análise de dados, de instrumentalizar ao máximo o relacionamento da marca com o consumidor. Para analisar dados, você precisa antes capturá-los, simples assim! Os profissionais de marketing precisam se apaixonar por métricas e KPIs. Marketing precisa se desapegar de dogmas do passado e de fórmulas que geraram sucesso anos atrás. Isso é uma mudança de postura radical, que nem sempre os líderes mais seniores de marketing sabem encarar. Eu conheço vários colegas profissionais experientes que voltaram para a escola, alguns estudando ciências humanas ou antropologia, outros estudando estatística ou matemática. Tenho dois amigos de marketing fazendo curso de gestão de projetos. O fato verdadeiro é que as marcas perderam a voz para os consumidores, portanto, o consumidor empoderado exige mudanças e as marcas precisam entender melhor os impactos desse novo contexto no marketing que fazem.
MDQD - Do que fazemos hoje, o que deve permanecer?
MS - Apesar do tom apocalíptico que falei acima, os alicerces do marketing não mudaram. Temos que continuar colocando foco no fortalecimento da marca, em estabelecer um relacionamento saudável com o consumidor, em desenvolver ofertas que atendam o desejo e as necessidades do cliente, em estabelecer uma comunicação clara e honesta, planejar muito, mensurar o que está sendo feito, etc. Tudo isso são pilares básicos do marketing tradicional que não mudaram, apenas estão inseridos em um contexto diferente, num mundo hiperconectado onde o consumidor ganhou poder e com um vasto número de ferramentas tecnológicas à disposição. Muitas das vezes eu tenho a impressão que os consumidores estão muito mais preparados tecnologicamente do que as empresas.
MDQD - Ao mesmo tempo que ocorrem profundas e rápidas transformações, em um mundo cada vez mais hiperconectado, o Brasil está paralisado economicamente. Como o marketing das empresas deve agir numa situação dessas?
MS - Acho que o marketing tem um papel que vai além daquele de fazer publicidade e promoção da sua marca e dos seus produtos e serviços. Aliás, essa expectativa adicional vem dos próprios consumidores. As marcas hoje têm um papel social importante. As empresas não são apenas participantes da sociedade, elas são agentes de mudança com uma missão de cidadania e propósito. O marketing, inquestionavelmente, tem responsabilidade nisso tudo. Portanto, acredito que o marketing das empresas tem um papel de dar esperança, de dar perspectivas de um mundo melhor, de mostrar otimismo e confiança de que podemos ter uma sociedade melhor do que temos hoje. Isso pode ser feito em diferentes dimensões nas atividades de marketing, de forma transparente ou mais sutil, mas esse é um papel que os gestores de marketing não podem abrir mão.

Notícias relacionadas