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Saúde

- Publicada em 12 de Março de 2017 às 17:52

Pequenos tabus impedem que o número de doadores de órgãos no Brasil seja maior

Rosana Nothen coordena o Sistema Nacional de Transplantes

Rosana Nothen coordena o Sistema Nacional de Transplantes


CLAITON DORNELLES/JC
As campanhas que estimulam a doação de órgãos no Brasil fazem com que os números cresçam, mesmo que a passos lentos. O Ministério da Saúde revelou que, no ano passado, o País bateu recorde nos transplantes de coração, com 357 procedimentos. Segundo a pasta, esse aumento se deu graças ao Decreto nº 8.783, assinado pelo presidente Michel Temer em junho, que estabeleceu que um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) deve estar sempre à disposição para atender aos chamados de transplante. Somando todos os órgãos transportados, houve aumento de 3.340%, saltando de cinco para 172 (coração, fígado, pulmão e rim), após a publicação da lei.
As campanhas que estimulam a doação de órgãos no Brasil fazem com que os números cresçam, mesmo que a passos lentos. O Ministério da Saúde revelou que, no ano passado, o País bateu recorde nos transplantes de coração, com 357 procedimentos. Segundo a pasta, esse aumento se deu graças ao Decreto nº 8.783, assinado pelo presidente Michel Temer em junho, que estabeleceu que um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) deve estar sempre à disposição para atender aos chamados de transplante. Somando todos os órgãos transportados, houve aumento de 3.340%, saltando de cinco para 172 (coração, fígado, pulmão e rim), após a publicação da lei.
No ano passado, foram registrados 2.983 doadores, o que representa uma taxa de 14,6 por milhão de habitantes, equivalente a 5% a mais em comparação a 2015. A taxa de aceitação familiar também cresceu, de 56% em 2015 para 57% em 2016. Rim, fígado, pulmão e medula óssea foram os órgãos mais doados. Além disso, entre 2010 e 2016 houve aumento de 18% no número geral de transplantes, com destaque para esses quatro órgãos. Também foi registrado crescimento de 103% no número de potenciais doadores no período, de 4.997 para 10.158. Em 2016, 41.052 pacientes estavam na lista de espera no País - cerca de 1,2 mil aguardavam no Estado. 
Os motivos para que o número de doações ainda esteja aquém do esperado são resumidos em três: manutenção do doador, falhas na notificação de morte encefálica e recusa familiar. "Ainda há muita resistência. Existem pequenos tabus, ideias de que o corpo será mutilado, a família pensa que não poderá fazer o velório adequado, ou teme que os órgãos não sejam devidamente encaminhados a outras pessoas. Falta de esclarecimento sobre a morte encefálica também trava as famílias", explica a coordenadora do Sistema Nacional de Transplantes do Ministério da Saúde, Rosana Nothen.
No ano passado, as doações bateram recorde no Rio Grande do Sul. Segundo o coordenador da Central de Transplantes da Secretaria Estadual da Saúde, Cristiano Franke, foram 284 doadores, contra 245 registrados em 2015. Além disso, também houve aumento nas notificações de potenciais doadores, que chegaram a cerca de 700 no ano passado. "É um trabalho de várias equipes de profissionais, que trabalham para acolher a família em um momento muito difícil, de perda", comenta Rosana. No Estado, a taxa de recusa familiar é de 40%, um pouco menor que a brasileira, de 43%.

Capacitação de profissionais e diálogo com familiares pode ajudar a diminuir a taxa de recusa

Referência mundial em doação, a Espanha possui uma taxa de recusa de apenas 15%. Segundo a enfermeira Carmen Segovia, da Organização Nacional de Transplantes da Espanha, a chave está na comunicação com os familiares. "Temos que retomar a humanização, a formação de profissionais de saúde que acolham essas pessoas desde a chegada ao hospital. Muito da decisão se dá por meio da percepção do trato que recebem desde o começo", diz Carmen.
Para ela, se receberem todas as informações acerca do processo, os doadores e seus familiares estarão recebendo a "oportunidade" de doar e serão completamente livres para tomar a decisão. "Essa comunicação se baseia em respeito, empatia e autenticidade. Um não pode existir sem o outro. Na Espanha, oferecemos cursos que ajudam nesse entendimento, porque, durante a faculdade, não recebemos (os profissionais da saúde) formação de relações humanas."
O superintendente de Educação, Pesquisa e Responsabilidade Social do Hospital Moinhos de Vento, Luciano Hammes, reforça a ideia de Carmen. "Essa ideia de que a doação é uma oportunidade é muito interessante. Não pode ser vista como uma punição", explica.
Mesmo que a pessoa que teve morte encefálica já tenha deixado claro o desejo de doar os órgãos em alguma eventualidade, a família pode, em nome dela, negar. "Em minha experiência, nunca vi ocorrer. A taxa de desrespeito à vontade de quem morreu é muito baixa. Isso também mostra como é necessário que mecanismos de registro de intenção sejam refinados no País, porque não temos nada oficializado", comenta Rosana Nothen.
A morte encefálica ainda é, no Brasil, a que proporciona o maior número de órgãos aptos a serem doados. No entanto, existem outras modalidades, como a doação intervivos de órgãos não vitais, como parte do pulmão e do fígado ou rim, que ocorre geralmente entre familiares, e também quando, mesmo que a pessoa esteja morta, os profissionais conseguem manter a massagem cardíaca. "Em casos de infarto fulminante, por exemplo, o transplante de rim costuma ser bem-sucedido. No entanto, acreditamos que devemos investir no procedimento de doação que envolve a morte encefálica antes de procurar meios mais complexos. Os países que realizam com mais frequência esses outros tipos de doação já esgotaram as possibilidades, já perceberam que não conseguirão aumentar os números", opina a coordenadora do Sistema Nacional de Transplantes.
A doação de órgãos foi debatida durante o Encontro Nacional de Investigadores do Estudo Donors, projeto que quer ampliar a prática no Brasil. O evento foi realizado nos dias 9 e 10 de março na Capital.