Michele Rolim
Construindo um jogo com o espectador a partir do limite tênue entre memória e a imaginação, estreia o monólogo Ícaro nesta sexta-feira, às 20h, no Teatro do Instituto Goethe (rua 24 de outubro, 112). Há sessões sábado e domingo, no mesmo horário. A temporada segue até 26 de março.
Na peça, não se sabe o quanto há de real e de ficção nas histórias, mas isso pouco importa. A montagem mostra seis cenas com depoimentos de cadeirantes. A inspiração partiu da experiência do autor e ator Luciano Mallmann e de pessoas que conheceu depois que passou a usar cadeira de rodas. As histórias abordam temas universais, como relacionamentos entre pais e filhos, resiliência, relações amorosas, suicídio, preconceito, gravidez e maternidade.
Em 2004, Mallmann sofreu uma lesão na medula ao cair durante uma acrobacia aérea em tecido no Rio de Janeiro - o episódio faz referência direta ao título da peça sobre a figura mitológica de Ícaro, conhecida pela sua tentativa de deixar Creta voando.
Não será a primeira vez que Luciano Mallmann subirá ao palco depois que se tornou paraplégico. Em 2011, ele produziu e protagonizou A mulher sem pecado, de Nelson Rodrigues. Pela montagem, levou o Prêmio Açorianos de Melhor Produção.
"Se eu não fizer a minha história e simplesmente esperar alguém me chamar para um trabalho não faço quase nada. Já é difícil para quem tem todas as possibilidades ser chamado...", desabafa Malmann. Em Ícaro, ele produz, interpreta e assina os textos.
A direção é da atriz Liane Venturella, que buscou valorizar o trabalho do ator. Liane já dirigiu outros trabalhos bem intimistas, como Brechó da humanidade (2015). "Ele começou a escrever e, quando li, percebi que era um teatro documental. Isso traz muita propriedade para a cena. É um trabalho de presença cênica", conta ela.
Durante todo o tempo, o intérprete dialoga com o público. A iluminação de Fabrício Simões e a trilha sonora de Monica Tomasi sublinham o clima de cada uma das histórias. "Tenho uma preocupação muito grande de não ser piegas. Não faço drama com a minha condição, muito pelo contrário", relata Mallmann. Na peça, trechos como "hoje a palavra cadeirante me dá sorte" ou "está tudo certo" estão presentes.
Luciano Mallmann iniciou sua trajetória na Cia. das Índias, dirigido por Zé Adão Barbosa em 1991. Participou dos espetáculos A gata borralheira (1991), Ai de ti, Dorothy Parker (1992), O despertar da primavera (1993) e Love hurts (1996). O ator mudou-se para o Rio de Janeiro em 1996, quando participou da Oficina de Atores da Rede Globo e do espetáculo A dama do cerrado, de Mauro Rasi. Seu mais recente trabalho é Bio (filme de Carlos Gerbase em fase de finalização).
"Ícaro é, acima de tudo, um espetáculo sobre pessoas. Somos todos iguais, cadeirantes ou não, temos dificuldades em relacionamentos, medos etc. Em algum momento, o público se identifica, mesmo quem não tenha nenhuma deficiência. Espero poder contribuir com essa peça para o debate", completa Mallmann.