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entrevista especial

- Publicada em 09 de Outubro de 2016 às 21:32

Nelson Marchezan Júnior fala em privatizar a Carris

'A prefeitura vai atrasar os salários dos servidores logo depois das eleições', diz Marchezan

'A prefeitura vai atrasar os salários dos servidores logo depois das eleições', diz Marchezan


fotos: MARCO QUINTANA/JC
Candidato mais votado no primeiro turno na eleição para a prefeitura de Porto Alegre, o deputado federal Nelson Marchezan Júnior (PSDB) não descarta privatizar a Carris, cujo prejuízo anual chega a R$ 50 milhões. "Ou a Carris se organiza, ou ela será privatizada", resume.
Candidato mais votado no primeiro turno na eleição para a prefeitura de Porto Alegre, o deputado federal Nelson Marchezan Júnior (PSDB) não descarta privatizar a Carris, cujo prejuízo anual chega a R$ 50 milhões. "Ou a Carris se organiza, ou ela será privatizada", resume.
Além de reduzir secretarias e cargos em comissão (CCs), o tucano também fala em cortes na Companhia de Processamento de Dados do Município. "A Procempa não pode prestar serviços tão caros. As mordomias vão ter que acabar", anuncia.
O tucano avalia que falta transparência na divulgação das contas da prefeitura e prevê que os salários do funcionalismo municipal vão atrasar já depois da eleição.
Marchezan é contundente nas críticas ao adversário no segundo turno, o vice-prefeito Sebastião Melo (PMDB). Diz reconhecer a contribuição que a administração atual prestou à sociedade, mas decreta que o grupo atual "chegou no limite de contribuição".
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Marchezan também explica como pretende dialogar com a Câmara Municipal, já que a maioria dos vereadores eleitos não integra sua coligação nem o apoia na disputa pelo Paço Municipal.
O deputado também comenta o fato de sua campanha ser a que mais doações recebeu, inclusive de pessoas físicas ligadas a grandes empresas. Sua coligação soma R$ 1,7 milhão de recursos até o dia 7 de outubro. "Se não é o empresário que vai ter dinheiro para contribuir para uma campanha, quem é que tu esperas que contribua? O que deve causar estranheza é quando alguém que não tem recurso doa para a campanha", afirmou.
Jornal do Comércio - Como avalia sua chegada ao segundo turno?
Nelson Marchezan Júnior - Eleição é eleição, e a gente nunca sabe o resultado. Sentíamos aquela perspectiva de crescimento, de um voto muito consolidado de esperança, de vontade de mudança muito forte, e claro que passar para o segundo turno foi bom, mas o melhor foi a forma como a gente passou, os acordos que a gente não fez, os conchavos que não existiram, a forma simples, transparente e verdadeira de ter como único comprometimento efetivamente atender ao interesse público. Serão anos muito difíceis, e isso nos traz uma grande responsabilidade. Logo depois das eleições, a prefeitura vai atrasar o salário dos servidores, mas quem pode fazer diferente somos nós, e se fizermos mais do mesmo, estamos acabados, não vamos atender à expectativa das pessoas.
JC - Como gerir as contas da prefeitura nesse contexto?
Marchezan - Temos uma crise brasileira que é econômica, social, de empregos. Provavelmente, teremos um déficit aqui na prefeitura, que até agora não foi apresentado, mas que deverá ocorrer. Isso é uma situação de muita dificuldade. A gente vai ter que viabilizar que a Carris, por exemplo, pare de dar prejuízo de R$ 50 milhões por ano. Isso não é aceitável, alguém ganha com esse prejuízo. Ou a Carris se organiza, ou ela será privatizada. E se não for eu quem vai privatizar, será o outro prefeito, porque a sociedade não aguenta mais pagar isso. A Procempa não pode prestar serviços tão caros. As mordomias da Procempa vão ter que acabar, e ela vai ter que ser uma empresa competente, sem pagar salários que são fora da realidade brasileira e da realidade porto-alegrense. Vamos ter que diminuir secretarias, enxugar cargos em comissão, ver qual é a situação real e viver dentro dela. É impossível funcionar uma prefeitura que tem 27 secretarias, 36 com status de secretaria, e dentro de cada há duas ou três divisões de poder.
Confira trecho da entrevista:
JC - O que imagina que seja uma gestão com transparência?
Marchezan - Se a gente tivesse que resumir em uma palavra a nossa gestão, seria transparência, que é a grande ferramenta para buscar o apoio da sociedade, para combater a corrupção, os privilégios, a ineficiência e irresponsabilidade da máquina pública. Hoje, o adversário da sociedade brasileira é a estrutura pública corrupta, ineficiente e cheia de privilégios. E a ferramenta para combater isso é a transparência, é tornar o setor público realmente público, para que as pessoas possam dizer "isso aqui eu não aceito", para que a imprensa possa se manifestar. E para que, assim, a sociedade vença as corporações, públicas e privadas, que têm interesses lá dentro e que são atendidos sempre antes dos interesses dos cidadãos. A transparência é uma gigantesca ferramenta que fica facilitada pela tecnologia e que não usamos, porque o setor público não quer ser transparente. Se a sociedade não se organizar, não tem como não mudar o setor público.
JC - O senhor cita uma possível privatização da Carris...
Marchezan - Não tenho preconceito com empresas públicas nem com empresas privatizadas. Eu tenho um conceito: o cidadão tem que pagar o preço justo pelo serviço público, e o que ele paga de tributo tem que ser direcionado para atender a sua demanda, e não a demanda de uma corporação. E a forma de avaliar isso é se, na saúde, o paciente é atendido, se na educação o aluno está aprendendo. Hoje, todos esses indicadores são péssimos em Porto Alegre: de saúde, de segurança, de educação, de geração de empregos... Todos os critérios nos levam a uma cidade onde a gente tem pessoas empreendedoras e onde a prefeitura é o grande entrave. A máquina pública municipal é uma trava à geração de empregos, ao invés de ser o contrário, de ser a grande geradora disso.
JC - E como a prefeitura pode auxiliar os empreendedores?
Marchezan - Vou dar números que validam o que estou falando. Dos 200 municípios brasileiros que têm o maior número de empresas ativas, Porto Alegre está na posição 198. Ou seja, é quase o município que menos abre empresas entre essas cidades. Isso é notório. A Endeavor Brasil fez um estudo que constatou que Porto Alegre é a cidade que exige o maior prazo para a abertura de uma empresa. Na área de investimento imobiliário e construções, para a qual temos vocação e que gera muitos empregos, temos 7 mil normas para serem obedecidas pelos engenheiros e arquitetos que vão apresentar um projeto.
JC - Em suas falas sobre segurança pública há sempre a questão da tecnologia. Como isso pode se inserir em Porto Alegre?
Marchezan - A gente pode pegar exemplos, como Fortaleza, que é uma capital muito mais pobre que Porto Alegre. Ela conseguiu não só ter as câmeras da prefeitura, mas colocar um software inteligente e "linkar" as câmeras privadas, que são geridas pela Guarda Municipal e pela Polícia Civil. A Polícia Rodoviária Federal já utiliza câmeras de monitoramento, onde pega todas as placas e automaticamente, no próximo posto rodoviário, consegue saber se aquele veículo participou de algum crime, de alguma ocorrência, se é roubado ou furtado, se tem algum problema, se tem impostos atrasados. É uma tecnologia que já existe. Os pardais em Porto Alegre são usados para multar, quando eles poderiam, com a mesma ferramenta tecnológica, identificar se aquele veículo tem alguma ocorrência.
JC - E é possível fazer isso com a atual estrutura existente?
Marchezan - Porto Alegre tem um Centro Integrado de Comando, só que ele não é integrado, porque não tem um espaço para a Polícia Civil e a Brigada Militar. E isso não é dito por mim, e sim pelos delegados que comandam a Secretaria Estadual (de Segurança), e pelos comissários que pedem as imagens, o zoom, a informação. Eles tinham que estar lá dentro para trabalhar de forma integrada. Hoje, as câmeras do município trabalham separadas das câmeras controladas pelo Estado, das particulares; os pardais são inutilizados, e as nossas pouquíssimas entradas e saídas da cidade não são monitoradas. Toda estrutura natural, geográfica e de ferramentas que existem em Porto Alegre são desperdiçadas quando o assunto é segurança pública.
JC - No segundo turno, o candidato Sebastião Melo está usando o argumento de que o senhor não conhece a cidade.
Marchezan - Eu deixo para os cidadãos porto-alegrenses me dizerem se os problemas que eu estou vendo são invenções ou se eles existem mesmo. Talvez o Melo ande muito e não esteja enxergando bem, ou talvez enxergue e não esteja sabendo como resolver. Eu acredito que eles existem. Aí, a palavra está com cada porto-alegrense.
JC - Que tom pretende usar com Melo no segundo turno?
Marchezan - O Melo tem adotado um tom acima do recomendado. Eu sei que é difícil, depois de 12 anos numa estrutura pública, ter de imaginar que pode sair, que é natural que mude. Mas é justamente por isso que precisa mudar. Já se acostumaram que são donos da estrutura pública e aí a gente começa a viver uma inércia. É óbvio que contribuíram, é óbvio que 12 anos de gestão trazem uma contribuição. É obvio que 16 anos de gestão do PT fez alguma coisa por Porto Alegre. Mas chegou no limite de contribuição. Os problemas atuais ficam evidentes nos índices de segurança. Nós pioramos em homicídios, latrocínios, roubo de carros, Porto Alegre piorou mais que todo o Estado e todo o Brasil. E não temos um protocolo de ação conjunta da prefeitura com a Polícia Civil. Isso é inercia, é falta de atitude, ou não é? 
JC - Parte da sua coligação fez parte do atual projeto de governo e ainda se encontra na gestão. O que você acredita que pode ter sido essa contribuição, e o que pode se aproveitar do que está sendo feito para os próximos anos?
Marchezan - A contribuição do PSDB foi muito pequena e sempre se baseou na troca por cargos. A realidade era essa, até que a gente teve que, de alguma forma, intervir e trocar a direção. O Partido Progressista tem uma realização maior, porque tem mais vereadores. Agora, participar de um governo não é ser escravo do próximo governo. Essa é uma mentalidade da política velha, da política antiga, em que cargos compram compromissos de apoio. Senão Porto Alegre estaria fadada a um destino, a escolher entre o presente, que é por Melo e a atual gestão, ou escolher pelo passado, porque não teria uma outra alternativa. Essa escravidão de cargos não me parece ser saudável para a democracia, os partidos e nenhuma estrutura pública. E o Partido Progressista tem seus compromissos com o prefeito Fortunati, que eles apoiaram até o final da sua gestão. E se o prefeito Fortunati achar que alguém não deve estar lá, que ele demita. Agora, sobre o vice-prefeito Melo, o PP achou que não vai ser um bom caminho para Porto Alegre e teve a liberdade de dizer "não, eu não quero". Agora, dizer "não, mas tu estás aqui, no cargo, eu sou vice-prefeito, e tu tem que me obedecer", isso é conversar com as pessoas? Isso é o mais saudável para a democracia? Não me parece que seja.
JC - Da maneira como estão colocados os vereadores eleitos atualmente, o senhor não teria maioria na câmara. Como se daria a negociação em busca de apoio?
Marchezan - Vamos fazer o projeto de governo com uma reorganização das secretarias, dos cargos em comissão. A ideia é que a gente consiga avançar muito, antes de assumir, em um planejamento dos quatro anos, com o que se quer fazer, aonde se quer chegar e deixar isso o mais mapeado possível. E apresentar para a Câmara de Vereadores, perguntar se querem participar do projeto. Acredito que vai dar certo. Sabemos que as dificuldades serão gigantescas, mas acreditamos que conseguiremos superá-las. É por isso que estamos nos colocando como candidatos. E vamos contar com a compreensão dos vereadores.
JC - A sua coligação recebeu recursos de pessoas ligadas a grupos empresariais. Como foi buscar esse apoio?
Marchezan - Quem tem mais dinheiro precisa de menos troca (de favores). O que não é imaginável é que as pessoas mais pobres fossem contribuir. Essa troca existe quando o servidor que tem cargo em comissão dá dinheiro para a campanha. O candidato tem obrigação de manter esse cargo lá. Um fornecedor contribuindo com o candidato, esse sim tem compromisso. O meu compromisso com a sociedade, e com cada um que está contribuindo com a minha campanha é de mudança, é de fazer diferente, e que eles mantenham o seu apoio, para a gente fazer diferente pelos próximos quatro anos. Eu reitero, eu não quero nem um voto de quem não vai estar junto nos quatro anos para mudar. Porque não vai ser fácil, as pessoas têm que estar conectadas para entender as modificações que precisam ser feitas, senão a gente não consegue vencer as corporações. Se as corporações estão do outro lado, contribuindo para a outra campanha, é nessas que vocês deveriam ficar surpresos. Se não é o empresário que vai ter dinheiro para contribuir para uma campanha, quem é que tu esperas que contribua? O que deve causar estranheza é quando alguém que não tem recurso doa para a campanha. Eu quero reiterar que tenho absoluto orgulho do desprendimento desses empresários que estão se expondo e acreditando na mudança.

Perfil

Nelson Marchezan Júnior está na sua segunda disputa à prefeitura de Porto Alegre. Em 2008, ficou na sexta colocação no pleito. Natural de Porto Alegre, nasceu em 30 de novembro de 1971. É advogado formado pela Unisinos e pós-graduado em Gestão Empresarial pela Fundação Getulio Vargas. Exerceu a advocacia por oito anos e deixou a atividade para entrar na vida pública. Foi diretor de Desenvolvimento, Agronegócios e Governos do Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul) no governo Germano Rigotto (PMDB, 2003-2006). Em 2006, se elegeu como o deputado estadual mais votado pelo PSDB. Em 2010, elegeu-se o único deputado federal do partido e conquistou a reeleição em 2014. Na Câmara dos Deputados, foi vice-líder da Minoria e vice-líder do PSDB. Participou como titular das comissões de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, de Ciência e Tecnologia, e de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Candidato à prefeitura nesta eleição, foi o mais votado no primeiro turno - 213.646 sufrágios.