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- Publicada em 22 de Setembro de 2016 às 17:24

História, aventura, espionagem e imaginação prodigiosa

Homens elegantes (Editora Rocco, 576 páginas, R$ 54,50), romance de Samir Machado de Machado, nascido em Porto Alegre em 1981, marca sua estreia na Rocco e o confirma como um dos autores brasileiros mais interessantes da atualidade.
Homens elegantes (Editora Rocco, 576 páginas, R$ 54,50), romance de Samir Machado de Machado, nascido em Porto Alegre em 1981, marca sua estreia na Rocco e o confirma como um dos autores brasileiros mais interessantes da atualidade.
O fluente e caudaloso romance se passa a partir de 1760, quando o soldado Érico Borges é enviado, a mando de um poderoso conde de Portugal, a Londres com uma missão: investigar uma rede de contrabando de livros eróticos para o Brasil. Érico nasceu no Brasil, mas foi criado em Portugal.
Samir Machado de Machado, desde 2007, organiza as antologias de contos Ficção de Polpa, dedicadas ao gênero, é autor da novela O professor de botânica (2008 - finalista do Açorianos de Literatura) e do romance Quatro soldados (2013), que, a exemplo de Homens elegantes, teve os direitos para o cinema adquiridos pela RT Features.
Homens elegantes vai muito além de romance histórico e de literatura de entretenimento. Como já fez com seu romance anterior, Quatro soldados, Machado mescla história, espionagem, mil aventuras, traições, assassinatos, personagens reais e criados numa trama onde a imaginação prodigiosa não é economizada. A cultura gay europeia de meados do século XVIII está retratada com vivacidade, e o autor, evitando recair nos desfechos trágicos, satiriza as sombras da intolerância que, como se sabe, insistem em andar por aí em pleno século XXI. A formação de identidades é um dos temas centrais da obra. Não apenas a nacional, mas também de gênero e de classe, num período em que o código moral da nobreza cedia espaço aos valores da burguesia emergente. Paralelos com o Brasil de hoje restam explícitos.
Dividido em três atos, com dois intervalos, com estrutura baseada na da ópera, o texto se mostra contemporâneo na forma e no conteúdo, com toques pós-modernistas, e evoca Thomas Pynchon, Erico Verissimo, videogames, James Bond, a alta sociedade londrina do século XVIII, as aventuras de capa e espada e também uma análise das contradições do Brasil colônia e de sua tumultuada relação com Portugal.
Na narrativa, Érico revela que pode ser provinciano, mas não bobo. Leitor perspicaz, hábil espadachim e orgulhoso de seus dotes de espião, logo se insere na avançada sociedade londrina, disfarçado de barão de Lavos. Vai fazer amigos e aliados como Maria de Almeida, a sobrinha do embaixador, e William, dândi lascivo, que o inicia nos costumes da corte europeia. O conde Bolsonaro, fanático com planos de invadir o Brasil e erradicar os sodomitas da face da Terra, será seu mais perigoso e desagradável inimigo. Um jovem padeiro entra na vida de Érico junto com o amor, mas aí a vida de Érico vai correr enorme risco? Leia para saber, leitor, que não vou te tirar este enorme prazer.

Lançamentos

  • Investigação Filosófica sobre a origem de nossas ideias do sublime e da beleza (Edipro, 160 páginas, R$ 39,00), do filósofo e político anglo-irlandês Edmund Burke, trata de estética e explora dois termos frequentemente confundidos, neste clássico da estética moderna.
  • Qualidade do lugar e cultura contemporânea: modos de ser e habitar as cidades (Editora Sulina, 400 páginas), de Paulo Rheingantz, Rosa Maria Pedro e Ana Maria Szapiro, traz 17 artigos deles e de especialistas sobre Arquitetura, Urbanismo, Psicologia, Filosofia, Psicanálise, Arte, História e Linguística.
  • Sabores da Itália - Antipasti, Verdure, Primi&Secondi Piati (Araucária, 264 páginas), do professor, tradutor e escritor Darcy Loss Luzzatto, traz belas histórias e receitas a partir de viagens à Itália, bem como textos sobre cultura e gastronomia da terra de Dante, de tanta e gostosa tradição culinária.

Ninguém vai roubar nossos sonhos

Quando o genial escritor argentino Jorge Luis Borges já estava no fim da vida, nossa grande escritora Lygia Fagundes Telles disse: "Mestre, que palavra, que mensagem, que herança final nos deixa?". "Lygia, querida, não esqueça dos sonhos, nunca te esqueça dos sonhos", ele respondeu apenas, sorrindo.
Nossas utopias já foram para o espaço, enterradas junto com o livro de Thomas Morus, o autor da coisa. A História não acabou, as utopias, sim. Direita, esquerda, Estados Unidos, União Soviética, Europa... tantos caminhos, tantas discussões, tantas divergências, tantos imigrantes, bom, vá lá, temos os Nórdicos, que, humanos, não são perfeitos mas são bons exemplos.
Adolescente baleado no aeroporto, assassinatos e violência 24 horas por dia, em todo lugar, intolerância de vários tipos, problemas econômicos e financeiros de nosso Estado, hoje no almoço me contam sobre mais uma agressão brutal de um jovem de classe média alta à namorada também de classe média alta. Se os amigos não apartam, poderia ter ocorrido morte. Atentados, guerras, terror, mundozinho sem porteira. A mídia deve noticiar. E aí quanto mais notícia, mais crimes ainda. Complicado calcular o espaço de cobertura do assunto de todo dia.
Tentamos, apesar de tudo, ainda ser pessimistas na avaliação e na inteligência e otimistas na vontade e na ação. Precisamos levantar da cama na segunda, na terça e no resto da semana e ir atrás.
Escrevo neste feriado de 20 de Setembro, depois de assistir pela TV às belas comemorações de nossas tradições. Não está morto quem peleia, dizia o lambari na boca da baleia. Não podemos nos entregar, mesmo com esse frio, esse vento, essas eventuais desavenças, essa geada e essa Federação que segue levando demais nossos suados pilas. O Rio Grande tem de ser maior que todos, que tudo e hoje tem sol. E daqui três dias começa a primavera, e aí é "meu Rio Grande do Sul/céu/ sol/sul/ terra e cor/ onde tudo que se planta cresce e que mais floresce é o amor". Tudo vai desabrochar. Somos baguais que não se entregam assim no más.
Madame Elisabeth Roudinesco, historiadora, psicanalista e escritora prendada da França, ligeira da cabeça e amiga dos estudos e dos livros, esteve entre nós, no Fronteiras do Pensamento e nos disse, falando sobre história, psicanálise, política, desigualdade (10% com 80% das riquezas), progressos e retrocessos: "o sonho de um futuro ainda não circunscrito. Esse é o verdadeiro nome da aspiração a uma outra vida que reatualiza os ideais da Revolução Francesa. Saber ao menos sonhar antes de qualquer ação. Saber ao menos sonhar com a ideia de que outra vida é possível. E nós temos que contribuir para isso sem otimismo excessivo e sem pessimismo destruidor, resistir pelo espírito, pela vontade e pelas ações positivas às ideologias destruidoras do mundo contemporâneo. Nos apoiando e nos baseando sobre o presente e também em uma herança do passado para pensar o futuro. Transformar a desesperança em esperança, mesmo se soubermos que é preciso tempo".

a propósito...

É isso. Nossos sonhos ninguém pode roubar, ninguém pode destruir. Porque, se nos matam, outras pessoas levam eles adiante. Mas temos todo o direito de sonhar em vida, dormindo ou acordados, em dias de chuva ou de sol. Temos o direito de sonhar, ao menos, em não ser assaltados ou mortos daqui a pouco. Melhor seria poder sonhar com outros sonhos. Melhor se pudermos ser pessimistas na avaliação e na inteligência e otimistas na vontade e na ação e de preferência para ontem, que a vida e o tempo não gostam de esperar. E boi lerdo, como se diz por aqui, acaba bebendo água suja. (Jaime Cimenti)