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Cinema

- Publicada em 28 de Julho de 2016 às 21:49

O passado

É, certamente, mais do que uma injustiça acusar Pedro Almodóvar de copiar a si mesmo em Julieta, seu novo filme. Manter-se fiel a um estilo e seguir empenhado em descobrir em temas semelhantes novas possibilidades e valores ainda não devidamente clarificados não é repetição: é coerência. Em qualquer arte, o verdadeiro criador tem esta característica de mover-se pelo mesmo universo e, portanto, por cenários que se assemelham, mas não são iguais. Porém, é verdade que o cineasta andava necessitando de uma reabilitação depois do evidente equívoco que foi a comédia Amantes passageiros, mesmo assim, ainda melhor que alguns exemplos lamentáveis produzidos nos últimos tempos em tal gênero por diversas cinematografias.
É, certamente, mais do que uma injustiça acusar Pedro Almodóvar de copiar a si mesmo em Julieta, seu novo filme. Manter-se fiel a um estilo e seguir empenhado em descobrir em temas semelhantes novas possibilidades e valores ainda não devidamente clarificados não é repetição: é coerência. Em qualquer arte, o verdadeiro criador tem esta característica de mover-se pelo mesmo universo e, portanto, por cenários que se assemelham, mas não são iguais. Porém, é verdade que o cineasta andava necessitando de uma reabilitação depois do evidente equívoco que foi a comédia Amantes passageiros, mesmo assim, ainda melhor que alguns exemplos lamentáveis produzidos nos últimos tempos em tal gênero por diversas cinematografias.
E Julieta, sem qualquer dúvida, é filme bem mais do que um título de reabilitação: é obra que confirma que o cineasta ainda permanece entre os mais importantes realizadores contemporâneos. As fontes continuam as mesmas. Almodóvar sempre foi um diretor fascinado pelos excessos do melodrama e pelas propostas de alguns cineastas americanos do período clássico. Até no título de alguns de seus filmes, a segunda tendência se torna bem clara. Um de seus trabalhos anteriores se chamava Tudo sobre minha mãe, referência a um dos maiores filmes de Joseph L. Mankiewicz, que foi exibido no Brasil com o título de A malvada. E a utilização do trem revela a admiração do cineasta por Alfred Hitchcock, mais precisamente por um de seus grandes trabalhos, Pacto sinistro, que parte de um encontro decisivo em tal cenário.
As cores saturadas também revelam a admiração e o fascínio de Almodóvar pelo auge do Tecnicolor. Numa fase em que o cinema, para lembrar uma constatação de Federico Fellini, tinha o monopólio da imagem em movimento, a utilização das cores extremamente valorizadas era um dos recursos que esta arte-indústria utilizava para fascinar os espectadores. E há também a questão do melodrama. Almodóvar é um narrador cinematográfico que percebeu, desde seus primeiros trabalhos, que muitos filmes espanhóis e mexicanos dos anos 1930 e 1940 eram a forma diluída e simplificada da tragédia grega. Sua intuição o levou a um tipo de cinema que mesclasse todas essas influências e colocasse na tela temas e situações antes vetadas pelo regime fascista espanhol. Almodóvar foi um dos que se destacaram no período no qual, após a morte de Franco, o cinema da Espanha passou a ter acesso a temas antes proibidos. Houve, antes, alguns desafiantes, como Juan Antonio Bardem, Luis Garcia Berlanga e Carlos Saura, sem esquecer Luis Buñuel, cuja obra foi quase toda realizada no exílio. Mas Almodóvar, sem dúvida, se transformou numa espécie de símbolo da democratização, nas telas, de uma cinematografia quem que se agigantou beneficiada pelos novos tempos.
Em Julieta não é a primeira vez que Almodóvar recorre a uma autora estrangeira, no caso Alice Munro, pois um de seus melhores filmes, Carne trêmula, foi inspirado em narrativa de Ruth Rendell. O diretor percebeu, em contos da primeira autora, a possibilidade de criar um roteiro que falasse de seus temas preferidos. O que vemos então é uma narrativa sobre uma família que se desfaz num processo no qual elementos ocultos passam a agir depois que certos acontecimentos possibilitam a ruptura. Dentre de seu estilo de narrar uma história, o realizador começa o filme numa fase em que acontecimentos passados permanecem na sombra e só aos poucos vão sendo revelados ao espectador. A personagem da mãe vai sendo desenhada a partir de uma carta. Quando tudo é conhecido, quando sabemos o que havia acontecido na vida da protagonista, surge uma possibilidade de recomeço. A viagem de Ulisses, o retorno à família, deixa de ser uma aula sobre uma epopeia: a protagonista, de certa forma, refaz tal trajeto, mas não sabemos qual será o ponto final da viagem. E aqui Almodóvar se aproxima, também, do grande John Ford, cujos filmes, de uma outra forma, sempre trataram desta volta ou desta tentativa de recomeço.
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