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- Publicada em 28 de Junho de 2016 às 17:38

Uma cultura a ser combatida

Maria Eugenia Bofill
Em 1993, a Conferência de Viena declarou a violência contra a mulher como uma violação dos direitos humanos. A Conferência salientou a importância da eliminação de todas as violações sistemáticas, a escravatura sexual, a gravidez forçada e, especialmente, os homicídios. Entretanto, a violência contra as mulheres segue vitimando milhares de brasileiras.
Em 1993, a Conferência de Viena declarou a violência contra a mulher como uma violação dos direitos humanos. A Conferência salientou a importância da eliminação de todas as violações sistemáticas, a escravatura sexual, a gravidez forçada e, especialmente, os homicídios. Entretanto, a violência contra as mulheres segue vitimando milhares de brasileiras.
O Mapa da Violência de 2015 aponta que, entre 1980 e 2013, morreu um total de 106.093 mulheres, vítimas de homicídio. O número passou de 1.353 mulheres em 1980 para 4.762 em 2013. A taxa, que, em 1980, era de 2,3 vítimas por 100 mil, aumentou para 4,8 em 2013. O Brasil ocupa a 5ª posição em um grupo de 83 países com os maiores níveis de homicídio de mulheres.
A naturalização da sociedade perante os comportamentos abusivos e criminosos relacionados à mulher é denominado cultura do estupro. O termo começou a ser utilizado em 1970 para apontar comportamentos, sutis e explícitos, que silenciam ou relativizam a violência contra a mulher. "A cultura do estupro é a normalização de determinados comportamentos e atitudes sociais que tem a ver com os gêneros feminino e masculino", explica a psicóloga e especialista em sexualidade e relações de gênero, Jane Felipe.
A cultura abrange desde atitudes sutis, como piadas que discriminam as mulheres, aos padrões impostos pela sociedade de que as mesmas precisam ter corpos esteticamente bonitos e estes são colocados sob um olhar crítico de julgamento. "Quando os corpos femininos são colocados como desejáveis e apreciáveis, como se fosse um corpo-objeto, passa a ideia de que esse corpo pode ser abusado, violentado e violado", afirma Jane.
A coordenadora do Coletivo Feminino Plural, Télia Negrão, ressalta que a sociedade se organiza, de maneira hierarquizada, entre gênero, raças, etnia, classe social etc. Entre estas formas de hierarquização, a mais comum é entre os sexos. "As relações de gênero desiguais nascem das percepções. O feminino, na nossa sociedade, de imediato, já é desigual. Elas vão ter papéis, lugares, posturas e regras morais predeterminadas. E isso nada mais é que cultura", aponta.
Segundo o 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2014, foram registrados 47.643 casos de estupro em todo o País. O dado representa um estupro a cada 11 minutos. Inserida na cultura do estupro está a culpabilização da vítima nos casos de violência, quando é questionada a roupa que a mulher está vestindo, o horário em que passa por determinado lugar e até mesmo a maneira como se comporta. A pesquisa Tolerância social à violência contra as mulheres, realizada em 2014 pelo Ipea, aponta que 58% dos entrevistados concordam, total ou parcialmente, que, "se as mulheres soubessem se comportar, haveria menos estupros". "Elas deveriam ter todo o direito de passar em determinado lugar a hora que bem entendessem, deveriam sentir-se à vontade e confortáveis com seu modo de se vestir. O problema é a cultura medíocre que vivemos e a educação violenta em relação aos homens, que ensina que eles têm esse direito", destaca a psicóloga.
O Mapa da Violência registrou que as vítimas, em sua maioria, são negras: enquanto o número de homicídios de mulheres brancas representou uma queda de 9,8% no período de 2003 a 2013, entre as negras aumentou 54,2%. A psicóloga e membro do instituto de pesquisa sobre relações raciais Sempre Mulher, Maria Luísa Pereira de Oliveira afirma que nem todas as mulheres conseguem ter acesso aos bens e serviços gerados pelas políticas públicas. "As mulheres não são todas iguais, e as mulheres negras têm determinadas vulnerabilidades e necessidades que exigem políticas públicas específicas, que essas políticas mais universalistas acabam não abrangendo."
Neste ano, a Lei Maria da Penha - voltada à proteção da mulher em situações de violência doméstica -, completa 10 anos. Para Maria Luísa, a formulação da lei é muito boa, porém, na prática, está longe de atingir a eficácia. "As instituições estão eivadas da cultura da discriminação, dos papéis de gênero, dos estereótipos do que é masculino e feminino, e, principalmente, do estereótipo de que as mulheres são quem provocam a violência. Nesse sentido, estamos muito longe, porém seria ainda pior se a lei não existisse", afirma.
Além das políticas públicas, é preciso uma educação geracional e educacional para o combate a essa cultura. O debate público em todas as esferas da sociedade, desde o ambiente familiar à escola. "Não se pode mais ocultar o que sempre esteve ocultado. E isso não basta apenas, é necessário enfrentar essa epidemia em que vivemos", ressalta Télia.
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