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Cinema

- Publicada em 23 de Maio de 2016 às 18:06

O poder e a máscara

Hélio Nascimento
É possível afirmar que o diretor Élie Wajeman perdeu a oportunidade de realizar um grande filme ao realizar este Os anarquistas, que é o seu segundo longa-metragem. Mas seria injusto colocar o filme entre os títulos sem importância. A obra tem méritos suficientes e não merece passar despercebida. Como realização, exibe várias virtudes, entre elas a de revelar um cineasta que trabalha sobre a influência de Jacques Becker, o realizador de Amores de apache e A um passo da liberdade. Como aquele, que foi um dos mestres do cinema francês, Wajeman pratica um cinema que privilegia personagens vitimados pela estrutura social e seus conflitos com a ordem estabelecida, com os valores impostos pelas engrenagens que sustentam a civilização. O realizador também coloca na tela personagens que, mesmo vivendo num mundo dominado pela rudeza, não deixam de expor seu desejo de viver uma existência distante de conflitos e imperfeições. Mas a narrativa não exclui figuras dominadas pelo rancor e movidas pela violência. E há também o poder que tudo controla e é capaz de criar personagens fictícios, mesmo que estes possam escapar do controle de seus criadores. Neste teatro no qual a maioria dos atores não tem consciência de seu papel, as máscaras escondem a verdade, e, quando tudo se revela, temas como o da vingança e o da esperança são tangenciados de uma maneira um tanto esquemática.
É possível afirmar que o diretor Élie Wajeman perdeu a oportunidade de realizar um grande filme ao realizar este Os anarquistas, que é o seu segundo longa-metragem. Mas seria injusto colocar o filme entre os títulos sem importância. A obra tem méritos suficientes e não merece passar despercebida. Como realização, exibe várias virtudes, entre elas a de revelar um cineasta que trabalha sobre a influência de Jacques Becker, o realizador de Amores de apache e A um passo da liberdade. Como aquele, que foi um dos mestres do cinema francês, Wajeman pratica um cinema que privilegia personagens vitimados pela estrutura social e seus conflitos com a ordem estabelecida, com os valores impostos pelas engrenagens que sustentam a civilização. O realizador também coloca na tela personagens que, mesmo vivendo num mundo dominado pela rudeza, não deixam de expor seu desejo de viver uma existência distante de conflitos e imperfeições. Mas a narrativa não exclui figuras dominadas pelo rancor e movidas pela violência. E há também o poder que tudo controla e é capaz de criar personagens fictícios, mesmo que estes possam escapar do controle de seus criadores. Neste teatro no qual a maioria dos atores não tem consciência de seu papel, as máscaras escondem a verdade, e, quando tudo se revela, temas como o da vingança e o da esperança são tangenciados de uma maneira um tanto esquemática.
O tema da infiltração de um policial num grupo voltado para ações que procuram atingir a sociedade e suas normas não é novo no cinema. Provavelmente, Wajeman seja um atento espectador dos filmes de Martin Scorsese e talvez tenha lido O agente secreto, de Joseph Conrad, romance que Alfred Hitchcock filmou em 1936 com o título de Sabotage. No ano em que a ação do filme Wajeman transcorre, 1899, Paris era palco de violentas ações praticadas por grupos de anarquistas. Para controlar tais ações, uma das táticas da polícia era infiltrar agentes em tais grupos. Um deles é o personagem vividos pelo ator Tahar Rahim. Quando o filme começa, o protagonista está recebendo as orientações de seu diretor de cena para o papel que lhe caberá viver: o de um operário que terminará se juntando a alguns anarquistas. O disfarce faz com que o espectador acompanhe o personagem no duro trabalho no que poderia ser visto como os bastidores do teatro social, o local onde se articulam e se movem os elementos que sustentam as estruturas visíveis do mundo cujas regras não são aceitas pelas figuras humanas a serem vigiadas.
O mérito maior do filme se concentra na opção que o cineasta faz de expor problemas que não se encontram apenas na revolta de um grupo de inconformados. O mais evidente deles é o da transformação do protagonista numa vítima, na medida em que, ao sentir suas certezas abaladas pela realidade, descobrir que a manipulação não se limita apenas a uma tarefa. Ele próprio passa a ser objeto de vigilância, depois de ter sua dignidade de ser humano violada. E há também a questão do abandono pelo pai. Ao investigar nos arquivos policiais o passado daquele, ele consegue reconstituir a trajetória paterna, mas a descoberta servirá apenas para acentuar seu vazio e sua impossibilidade de recompor a família. Não poderá, ele também, construir o microcosmo essencial. O filme de Wajeman coloca em cena temas essenciais e, se não os desenvolve de maneira a aprofundá-los e enriquecê-los, não chega a corrompê-los pela vulgaridade e as simplificações. O cineasta procura se aproximar da essência da revolta, focalizando situações reveladoras de imperfeições no relacionamento humano. Não tenta ministrar uma aula sobre o anarquismo, mas sim colocar na tela comportamentos que traduzem ingenuidades, na medida em que seus agentes não sabem que eles próprios estão sendo manipulados, transformados em peças de um jogo, personagens de uma peça na qual seus destinos estão traçados, criaturas incapazes de perceberem que os rostos são apenas máscaras, que os movimentos todos são rigorosamente controlados.
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