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Conjuntura

- Publicada em 13 de Março de 2016 às 21:24

Desaceleração da inflação deve ser lenta, alertam especialistas

Depois de alcançar a margem dos dois dígitos no ano passado, o principal índice de inflação do País, IPCA, deu sinais de recuo no mês passado, sem, no entanto, deixar de ser uma preocupação incômoda para os consumidores e intrigante para os economistas. Com alta de 10,67% em 2015, o índice manteve a trajetória de alta em janeiro deste ano, avançando mais 1,27% - fenômeno contraditório em um cenário recessivo.
Depois de alcançar a margem dos dois dígitos no ano passado, o principal índice de inflação do País, IPCA, deu sinais de recuo no mês passado, sem, no entanto, deixar de ser uma preocupação incômoda para os consumidores e intrigante para os economistas. Com alta de 10,67% em 2015, o índice manteve a trajetória de alta em janeiro deste ano, avançando mais 1,27% - fenômeno contraditório em um cenário recessivo.
Porém, as apostas dos especialistas, que, em sua maioria, projetam uma retração no índice para este ano, começaram a ganhar força em fevereiro, quando o IPCA regrediu para 0,9%. A tendência é de baixa, o que pode resultar em uma inflação anual em 2016 de entre 7% e 7,5%, segundo preveem os economistas. A redução de mais de três pontos percentuais (de 10,67% para 7,5%) é significativa, mas não elimina e nem sustenta o otimismo com uma acomodação de preços. Para os analistas, a inflação continua persistente, o que deve resultar em uma desaceleração lenta.
"Eu acho que neste ano vai cair", assinala Régis Bonelli, doutor em Economia e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). "A previsão, acho até que está um pouco baixa demais, é de que o IPCA feche o ano em 7,2%. Eu, particularmente, acho que vai ser mais do que isso", acrescenta. Bonelli sinaliza para um índice na casa dos 7,5%, que, frisa, "é ainda uma inflação muito alta e bastante resistente à baixa".
O que intriga o pesquisador da FGV, e muitos outros economistas, é que a inflação esteja tão resistente em um ano de retração. O que mantém os preços em elevação é a indexação, resultado de um ciclo de aumentos alimentado por altas que repercutem em todos os setores. O exemplo mais claro da indexação são os contratos, cujos reajustes estão atrelados aos índices inflacionários.
"Essa é uma força difícil de quebrar, tanto que notamos, aqui, que a inflação de serviços é uma das mais resistentes, e ela não era", avalia Bonelli. "No último surto de inflação forte que vivemos, entre 2002 e 2003, provocada pela desvalorização cambial, houve uma inflação de serviços relativamente baixa. E agora, não está havendo. Isso é um quebra-cabeça para nós, porque a mesma indexação que havia naquele período temos agora."
A lógica prega que, se a economia recua, a inflação cede. "Em tese, existe uma relação inversa entre a atividade econômica e a inflação. Quando a economia está em crescimento, a inflação aumenta. Quando a economia se retrai, é um pouco mais baixa", explica o doutor em Economia e professor titular da Ufrgs Marcelo Portugal. "A lógica é que as pessoas consomem menos e pressionam os preços para baixo, mas há casos em que isso não funciona."
O que faz essa relação se quebrar, explica Portugal, é o que está acontecendo agora: indexação da economia somada ao descontrole fiscal. "A inflação é um mal que depende de expectativas e liquidez." Segundo ele, o governo colabora nos dois sentidos para piorar as coisas. "Primeiro, ajuda as expectativas da inflação para o futuro a ficarem ruins. E, segundo, jogando liquidez na economia", justifica.
No primeiro ponto, o efeito é o das profecias que se autocumprem quando a projeção inflacionária se concretiza. "Se você vê que a inflação está em 10%, você quer reajuste de 10%, não 5% ou 3%." Isso repercute como um todo na economia, por conta da indexação. Assim, o que era expectativa vira realidade. Em relação ao segundo aspecto, o economista da Ufrgs complementa que, para que o circuito de indexação funcione, é preciso ter dinheiro na economia. "Essa é a liquidez, que é colocada pelo governo através da política fiscal ou da política monetária", define. "Toda vez que se tem uma política fiscal muito expansionista, como temos tido, estamos jogando liquidez na economia."
Com déficit primário em 2014 e 2015, a política econômica brasileira cai em descrédito, avalia. "O discurso é de que estamos apertando o orçamento, mas os números mostram que não é verdade - temos déficit primário em 2014, 2015 e teremos em 2016 de novo", salienta. Esses dois movimentos, de derrubada das expectativas inflacionárias e manutenção do déficit fiscal, sustentam a alta inflacionária em meio à recessão. "Se o Banco Central estivesse mais crível no combate à inflação e o governo tivesse uma política fiscal mais apertada, conseguiríamos puxar a inflação para baixo", sentencia Portugal.

Expectativas de preços no Brasil estão 'desancoradas'

O doutor em Economia e coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec/MG, Reginaldo Nogueira, compara a pressão inflacionária vivida atualmente pelo País com uma embarcação à deriva em alto mar. "As ondas estão nos levando, e não existe nenhum farol que indique a direção da praia", sustenta. A analogia serve para exemplificar a importância das âncoras para estabilização dos preços, termo bastante disseminado quando entrou em vigor o Plano Real.
"Uma âncora é algo que estabelece uma visão de longo prazo sobre os preços", explica. No início do Plano Real, essa âncora era o câmbio, que segurava os preços no longo prazo, detalha Nogueira. "Então, os preços variavam, mas, quando se olhava para o longo prazo, os preços brasileiros convergiam para preços internacionais." Essa âncora foi substituída posteriormente pela de inflação, que apontava para uma inflação relativamente baixa e estável no longo prazo. "Dessa forma, no curto prazo, os preços poderiam subir ou cair, mas as pessoas tinham uma visão sobre para onde os preços iriam flutuar." O tripé macroeconômico do Real era completado pela política fiscal.
O economista do Ibmec/MG indica que a ausência de âncoras para os preços justifica a persistência inflacionária. "O tripé macroeconômico foi dilapidado a partir de 2012 com a nova matriz macroeconômica. O que sobrou foi uma inflação à deriva e uma economia sem âncora em alto mar."
Na análise dos economistas, as expectativas estão desancoradas. "Que a inflação neste ano será menor do que a do ano passado, pouca gente duvida", sinaliza o pesquisador da FGV Régis Bonelli. "O que eu acho mais intrigante é como a inflação permanece tão resistente à baixa apesar da recessão", revela. A colocação se baseia no fato de que, segundo apontam as avaliações dos especialistas, a inflação do ano que vem feche no mesmo nível da que será alcançada em 2016, reforçando a ideia de inflação persistente.
"Só o Banco Central acha que em 2017 a inflação vai chegar a 6,5%", alfineta. Para ele, "o núcleo do nó é fiscal". "É uma recessão em L. Neste ano, vamos parar de cair, mas vamos continuar em nível muito baixo", avalia. Ou seja, a economia vai seguir se arrastando. "Eu estimo que, com o vento a favor, na próxima década, o PIB vá crescer entre 2% e 2,5%", projeta Bonelli.
No último relatório Focus, divulgado no dia 7, o mercado financeiro voltou a elevar suas projeções para a inflação deste ano, depois de uma semana de respiro. No levantamento anterior, as estimativas para o IPCA de 2016 haviam caído para 7,57%, mas agora engataram alta novamente e estão em 7,59%. O percentual se distancia ainda mais do teto da meta, 6,50%. A pesquisa conta com as previsões de cerca de 120 instituições.