Mais do que faturar com venda de produtos e serviços voltados para amantes das magrelas, empreendedores incentivam consumo consciente e qualidade de vida

Aumento do ciclismo urbano impulsiona negócios em Porto Alegre


Mais do que faturar com venda de produtos e serviços voltados para amantes das magrelas, empreendedores incentivam consumo consciente e qualidade de vida

Foi em 2011 que os namorados Roger Cardoso e Carolina Soares abandonaram de vez o carro. Em vez do veículo automotor, aderiram à bicicleta - e, consequentemente, a um novo estilo de vida. Aflorou, com isso, o espírito empreendedor.
Foi em 2011 que os namorados Roger Cardoso e Carolina Soares abandonaram de vez o carro. Em vez do veículo automotor, aderiram à bicicleta - e, consequentemente, a um novo estilo de vida. Aflorou, com isso, o espírito empreendedor.
Assim como eles, outras pessoas começaram a enxergar mercado para as bikes - que cresce na medida em que as ciclovias se alongam pelas grandes cidades. Hoje, não são raros os cafés, oficinas e marcas voltadas à temática.
Cardoso e Carolina que o digam. Dois anos depois de venderem o automóvel, fundaram a Cuore Veste Bici, fabricante de camisetas, leggings e bermudas especiais para ciclistas.
O negócio foi delineado durante o trabalho final da graduação de Carolina. Ela, que estudou para ser estilista industrial, já era do "rolê" e, percebendo a falta de produtos para ciclistas urbanos, decidiu projetar uma marca de roupas exclusivas.
Após a apresentação e conclusão do curso, o casal refletiu sobre o trabalho. Decidiram, então, preencher o gap no mercado. Convidaram uma sócia e, com investimento inicial de R$ 5 mil, passaram a fabricar os modelos. "Começamos vendendo para amigos e só depois expandimos", lembra Carolina, que tem 37 anos.
Carolina e Cardoso produzem vestuário para ciclismo urbano
Todas as peças contam com refletores. A bermuda Fluxo é confeccionada com jeans stretch (que estica) e conta com uma alça na altura do cinto que facilita o transporte das travas U-lock, aquelas em formato de "U" para cadear a bike.
As bermudas, shorts e calças também são reforçadas com o dobro de tecido no fundilho, evitando que o roçar no banco, com o movimento da pedalada, esfole a peça. Quanto às camisetas, a versão FixOlimpíadas possui bolso traseiro e barra nas costas prolongada - o que, segundo os empreendedores, ajuda a "esconder o cofrinho".
A inovação também abrange o modelo dryfit, comercializado com um saco impermeável. "Eu ia de bicicleta para a faculdade e chegava pingando de suor. Daí, surgiu a ideia do saquinho, que guarda a camiseta suada sem sujar nada na mochila", explica Cardoso, que, aos 31 anos, é formado em Design de Produto pela UniRitter.
Os itens são vendidos pelo site da Cuore ou em lojas de Porto Alegre, São Paulo e Rio. A mão de obra, porém, é toda local, assegurando uma cadeia de trabalho sustentável.
Desde o início das operações, a empresa passou por mudanças. A mãe de Cardoso, Ondina, substituiu a sócia inicial, e os investimentos aumentaram para R$ 50 mil, via empréstimo bancário. Assim, a casa onde moram virou atelier.
"A bicicleta já é um caminho sem volta", diz Carolina. "E a Cuore tem um bom trajeto para percorrer nele", emenda Cardoso.

O ponto da pausa nopedal para um café

Ao sair do emprego, em novembro de 2012, a jornalista Isadora Lescano já estava enturmada. Foi cobrindo assuntos de mobilidade urbana para um portal de notícias que ela se tornou amiga e adepta às bikes. O trajeto de casa até o antigo trabalho - saía da Cidade Baixa e ia até o Centro Histórico, em Porto Alegre - inclusive era feito de magrela. Só que, além do emprego, Isadora acabou perdendo outra coisa: o point do grupo, a Cidade da Bicicleta (a iniciativa funcionava como oficina colaborativa e centro cultural na Capital, mas foi desativada).
Para ter um emprego e um novo espaço de convivência, Isadora e outras duas amigas adeptas ao transporte alternativo abriram, em junho de 2013, a Vulp Bici Café, na Miguel Tostes. A cafeteria, hoje, funciona na rua Bento Figueiredo, 78, e é uma mistura de bar, loja de acessórios e oficina mecânica. 
O empreendimento é tocado a oito mãos: além de Isadora e das duas sócias-fundadoras, Sílvia Pont e Tássia Furtado, Bianca Rabello faz parte da gerência atual. O espaço também sedia eventos e oferece almoço vegetariano.

Bonés próprios para o transporte

Quando a Vulp Bici Café foi criada, em 2013, a artista visual Nídia Marilia foi procurada. O empreendimento estava em busca de produtos para compor seu portfólio.
Sugeriram a Nídia, ciclista e costureira, que fizesse uma pequena coleção de bonés com a marca Vulp para vender. Ela não só aceitou o pedido como, após aprimorar o produto, montou uma empresa especializada em caps para ciclismo, a Labuena.
O boné próprio para a pedalada é diferente do convencional - alguns estilistas classificam a peça como vintage no vestuário esportivo. Os caps possuem aba curta e inclinação suficiente para proteger os olhos do sol e não obstruir a visão do ciclista. Por ficarem ajustados na cabeça, cabem debaixo do capacete e ainda impedem que o suor escorra pelo rosto. Permitem, ainda, a identificação de forma clara - ideal para competições em que o patrocinador precisa de visibilidade.
Os atributos do produto fazem Nídia, que toca o negócio ao lado do namorado Cadu Carvalho, optar mais pelo consumidor intermediário do que pelo consumidor final. Os bonés já foram personalizados para marcas de diferentes cidades, como Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis e Belo Horizonte.
Feitos de forma artesanal - a única etapa terceirizada é a impressão -, cada boné leva em torno de 1h15min para ser confeccionado. A unidade custa em média R$ 60,00.
"O trabalho é parte da minha vida, mas não o motivo da minha vida", elucida Nídia, complementando que adora o que faz. "Mas não tenho a ambição de torná-lo maior ou mais lucrativo", destaca.
 

Nas marchas do empreendedorismo social

O publicitário Cadu Carvalho, 34 anos, criou a Libélula Ações Transformadoras, laboratório cujo objetivo é criar projetos de consumo consciente, mobilidade urbana e planejamento do espaço público. Um dos planos a se materializar em fevereiro é o Biciponto. Trata-se de estabelecimentos comerciais que disponibilizarão gratuitamente um painel com ferramentas para reparos em bicicletas. "O número de ciclistas está crescendo, mas muitos não optam, com medo que aconteça algum problema no meio do caminho e não consigam resolver", diz o idealizador. Os ciclistas poderão encontrar os locais por meio do aplicativo Biciponto. O investimento inicial será de R$ 45 mil, e Cadu ainda busca apoiadores. Primeiramente, a iniciativa terá 25 bicipontos espalhados pela região central, como na Vulp e Cuore, além da Sorveteria Bellona, a loja Banana Verde e o Baden Café.
 

Acessórios para o ambiente urbano

"Eu acabei largando a faculdade por algo que me dava mais prazer e sustento." É como justifica o ex-estudante de Artes da Ufrgs, Mário Terrazas, 32, sobre a criação da Cyco, que produz bolsas messenger, pochetes, pedaleiras e acessórios para ciclistas urbanos. Começou durante o Fórum Mundial da Bicicleta, na Capital, em 2012. "Eu vendia camisetas com a temática bike", conta. O carro-chefe da pequena empresa é o firma-pé, acessório acoplado ao pedal que proporciona uma pedalada mais firme. Todos os itens são fabricados por ele, e a matéria-prima é proveniente de cintos de segurança, câmaras de pneu e mangueiras de bombeiro descartados.
 

Para pedalar faça sol ou faça chuva

Chamada pelas sócias de “nanoempresa”, a Bikedrops atualmente produz capas de chuva para ciclistas por encomenda. O poncho é feito de nylon emborrachado e tem as costuras vedadas manualmente. O aspecto “bike friendly” fica por conta do formato, que, mesmo compacto, impede que o ciclista molhe o tronco e as pernas. De quebra, protege a bolsa ou mochila. Como as donas da marca Lívia Araújo e Marisa Dal Pizzol têm outras profissões, a produção é pequena, porém constante. Os principais clientes são ciclistas que enxergam na chuva a última fronteira para usar a bicicleta todos os dias, caso das fundadoras quando, dois anos atrás, lançaram a marca.

Uma comunidade para compartilhar as magrelas

A weBike nasceu no Desafio Empreendedor da Ufrgs, no ano passado. A equipe criou uma alternativa de mobilidade para Porto Alegre, contam Ricardo Pierozan e Alexandre Mattos. A ideia é oferecer pontos seguros em áreas onde há demanda por bikes para que as pessoas possam compartilhá-las. Entre eles, por enquanto, os campi da universidade, cafés, hostels e casas colaborativas do Bom Fim, Cidade Baixa, Moinhos de Vento, Floresta e Centro Histórico.
"A weBike não é só meio (bici), mas forma. Na onda da economia colaborativa, criamos uma comunidade para compartilhar bicicletas (quem tem a sua dá acesso a quem não tem)", explica Pierozan. A pessoa paga R$ 20,00 mensais e solicita o transporte no aplicativo, que indica a bike disponível mais próxima nos chamados wePoints. O usuário devolve a magrela no mesmo wePoint ou em outro.