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Cinema

- Publicada em 26 de Janeiro de 2016 às 13:44

A engrenagem

Depois de J. C. Chandor, que, em O dia antes do fim, havia focalizado a crise que abalou a economia mundial em 2005, agora é a vez de Adam McKay, também um dos roteiristas de A grande aposta, baseado em texto de Michael Lewis, voltar ao assunto. O tema é difícil de ser levado às telas, sobretudo numa época em que a grande indústria cinematográfica está como nunca mais interessada em grandes plateias do que na qualidade a ser oferecida ao público. O filme, portanto, independentemente de seus méritos, é um ato de coragem, do qual participa, por sinal, um astro como Brad Pitt, que, além de atuar, é um dos produtores. As plateias de nossa época mais interessadas em saber o destino dos personagens de Star wars, certamente permanecerão distantes desta ciranda de interesses escusos, desta dança macabra na qual os manipuladores são os operadores do mercado e as vítimas, os que pensaram em concretizar sonhos, materializando o desejo da casa própria. Se as grandes produtoras não estão interessadas em temas como este, a Academia de Hollywood parece não estar indiferente ao problema, tanto é assim que o filme de McKay foi indicado ao Oscar, estando, por sinal, entre os favoritos. O cinema americano tem esta tradição de insolência diante de certos fatos, e o filme de Chandor antes citado não é o único a investir de forma direta e agressiva contra mitos e valores cultuados pela sociedade que procura retratar.
Depois de J. C. Chandor, que, em O dia antes do fim, havia focalizado a crise que abalou a economia mundial em 2005, agora é a vez de Adam McKay, também um dos roteiristas de A grande aposta, baseado em texto de Michael Lewis, voltar ao assunto. O tema é difícil de ser levado às telas, sobretudo numa época em que a grande indústria cinematográfica está como nunca mais interessada em grandes plateias do que na qualidade a ser oferecida ao público. O filme, portanto, independentemente de seus méritos, é um ato de coragem, do qual participa, por sinal, um astro como Brad Pitt, que, além de atuar, é um dos produtores. As plateias de nossa época mais interessadas em saber o destino dos personagens de Star wars, certamente permanecerão distantes desta ciranda de interesses escusos, desta dança macabra na qual os manipuladores são os operadores do mercado e as vítimas, os que pensaram em concretizar sonhos, materializando o desejo da casa própria. Se as grandes produtoras não estão interessadas em temas como este, a Academia de Hollywood parece não estar indiferente ao problema, tanto é assim que o filme de McKay foi indicado ao Oscar, estando, por sinal, entre os favoritos. O cinema americano tem esta tradição de insolência diante de certos fatos, e o filme de Chandor antes citado não é o único a investir de forma direta e agressiva contra mitos e valores cultuados pela sociedade que procura retratar.
O tom farsesco adotado pelo cineasta não serve apenas para comunicações irônicas com a plateia. Ele também vira um valioso instrumento para fazer com que o espectador se transforme em participante da trama. Não se trata apenas de reconstituir um episódio da história econômica recente, mas de expor, através da encenação, verdades que, segundo o diretor, permanecem ocultas para a maioria das pessoas. O que o filme pretende mostrar é a ação dos componentes de uma engrenagem para a qual o ser humano não passa de um número, um pequeno ponto num gráfico no qual famílias têm seu destino traçado pelos deuses modernos. A grande aposta procura, através de situações, fazer com que o público se sinta como os que foram enganados, um personagem do filme, uma figura participante da farsa engendrada por um gênio enlouquecido que nem sempre consegue fazer com que sua agressividade fique limitada pelos golpes numa bateria. Tal agressividade ultrapassa os limites de uma fúria sob controle e se amplia pela sociedade inteira. Basta ver como o realizador orienta seus atores, voltados todos eles para a criação de personagens sempre próximos de uma explosão emocional e utilizando uma linguagem que não deixa dúvida sobre o estágio cultural em que se encontram.
Feita a constatação que certas formas dominantes na sociedade são produtos da agressividade humana, o filme prossegue seu discurso demolidor. Numa cena em que contemplamos um condomínio residencial abandonado, um réptil surge das águas, símbolo dessa violência que a todo momento emerge e passa a ditar suas leis. A cena na qual o personagem de Christian Bale se descontrola, e, deixando de ser baterista, se transforma em agressor, não é apenas muito bem realizada e interpretada: ela é a síntese eloquente e reveladora. A ameaça se concretiza na tela e, de certa maneira, até define certo tipo de expressão musical. E há também em cena a figura do homem que procura manter a integridade e não esquece aquelas regras que deveriam ser a base e o princípio de tudo. Mas até este, mesmo permanecendo lúcido até o fim, é obrigado a ceder espaço aos antivalores, como fica expresso no grande plano da sequência final, que quase o faz desaparecer da tela. A própria existência de um filme como este - e de outros que a ele se assemelham - é um desmentido da visão apocalíptica que McKay adota. Seu protesto feito através de um meio aceito e divulgado por um sistema de produção de imagens, cujo espaço alcançado não deve ser subestimado, mesmo que distante dos grandes espetáculos populares, se beneficia das conquistas antes obtidas pelos que, no cinema ou fora dele, não permaneceram calados diante dos mais variados gêneros de distorção.
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