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Teatro

- Publicada em 08 de Dezembro de 2015 às 15:23

Para sempre, Marília Pêra

Sábado passado, enquanto Bibi Ferreira, aos 93 anos, iniciava uma curta temporada de seu espetáculo dedicado a Frank Sinatra em Porto Alegre, a atriz Marília Pêra, aos 72 anos, falecia no Rio de Janeiro. Filha de atores, tanto o pai quanto a mãe lhe transferiram e concentraram o talento que ela soube exibir e utilizar magnificamente ao longo da vida. Estreou cedo nos palcos, aos 4 anos de idade, em Medeia, como uma das filhas da terrífica personagem de Eurípides. Transformou-se numa artista de amplas possibilidades, porque interpretava, dançava e cantava, era capaz de atrair crianças e adultos, fazia comédia, tragédia e drama. Sempre soube escolher repertório: para muitos, na verdade, não havia papel que Marília não fosse capaz de adaptar à sua personalidade.
Sábado passado, enquanto Bibi Ferreira, aos 93 anos, iniciava uma curta temporada de seu espetáculo dedicado a Frank Sinatra em Porto Alegre, a atriz Marília Pêra, aos 72 anos, falecia no Rio de Janeiro. Filha de atores, tanto o pai quanto a mãe lhe transferiram e concentraram o talento que ela soube exibir e utilizar magnificamente ao longo da vida. Estreou cedo nos palcos, aos 4 anos de idade, em Medeia, como uma das filhas da terrífica personagem de Eurípides. Transformou-se numa artista de amplas possibilidades, porque interpretava, dançava e cantava, era capaz de atrair crianças e adultos, fazia comédia, tragédia e drama. Sempre soube escolher repertório: para muitos, na verdade, não havia papel que Marília não fosse capaz de adaptar à sua personalidade.
Alcançou premiações raras, inclusive nos Estados Unidos. Recebeu a Ordem de Rio Branco, Grau de Oficial, em 1988, mas em 1960, participando do elenco de Roda viva, foi presa e obrigada a atravessar um corredor polonês de policiais, inteiramente nua. Era considerada, então, "comunista". Curiosamente, participou da campanha de Collor de Mello à presidência.
Sua carreira teatral inclui presença em espetáculos como Onde canta o sabiá, de Gastão Tojeiro, além da comédia Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come, o que a coloca na cena do teatro brasileiro de intenções políticas dos anos 1960. Isso fica mais claro se lembrarmos que ela participou da montagem de Roda viva, de Chico Buarque. Radicalizou ao interpretar A vida escrachada de Joana Martini e Baby Stampanato, de Bráulio Pedroso. Mas é em Fala baixo senão eu grito, de Leilah Assumpção (1969), que ela encanta de verdade a todos e ganha os principais prêmios do País. Assisti a esta peça em São Paulo. A personagem é uma jovem mulher que vive sozinha e um dia é visitada, durante a noite, por um ladrão. Voltaria a arrebatar seu público com Apareceu a Margarida, de Roberto Athayde (1973), vivendo uma professora traumatizada e histérica, peça a que também assisti com a atriz. Em ambos os casos, a forte denúncia social era literalmente gritada. Marília Pêra propunha uma interpretação expressiva, agressiva, mesmo. Mas magnetizadora. No cinema, emocionei-me (e quem não?) com sua interpretação em Pixote, de Hector Babenco. Aqui, ocorreu o contrário: a doçura, a contenção, a intimidade da atriz na figura de uma possível mãe em que se transforma diante daquele menino de rua. Nenhuma cena, até hoje, foi mais sublime que aquela em que ela amamenta o garoto, apoiado em seu colo.
Da comédia inusitada intitulada O mistério de Irma Vap (1986) a musicais como Vítor ou Vitória (2001), passando por filmes tocantes em que necessariamente não era a principal figura, como Central do Brasil (1998), fazendo telenovelas desafiadoras, como Beto Rockefeller (1968) ou Rainha da sucata (1990), a filha de Manuel Pêra e Dinorah Marzullo deu seu recado, honrou o palco em que pisou, mostrou como se faz teatro e, sobretudo, como se mantém a dignidade de um artista. Inclusive quando, depois do sucesso internacional do filme Pixote, que lhe propiciou os maiores prêmios norte-americanos, poderia ter iniciado carreira nos Estados Unidos. Mas reconhecendo que não tinha boa dicção em inglês, que a concorrência era predatória e, sobretudo, que seu universo, aquilo de que queria falar e aquilo que queria recriar, era o Brasil, resolveu ficar por aqui.
Mais que artista, Marília Pêra foi uma militante das artes cênicas. Por isso, apoiou, desde logo, a campanha encetada por Eva Sopher para a reconstrução do Theatro São Pedro e, sempre que veio a Porto Alegre, preferiu ter menor bilheteria para manter-se fiel ao teatro que ajudou a reconstruir e que sempre valorizou. Mas, como todo o ser humano, Marília foi contraditória. Veja-se estas duas frases suas, de épocas diferentes: "Ele transa bem? Leva você para comer bons queijos e vinhos? É seu amigo? Então, fica com ele. É o máximo que você vai conseguir de um homem", contrastada com essa outra, de outro momento: "Se tivesse que escolher entre um mundo que fosse comandado por homens ou mulheres, preferiria que fosse por homens". Qual a certa, qual a errada? Há contradições verdadeiras entre elas, ou apenas elas separam a vida privada e a vida pública, coisa que muita gente nunca conseguiu entender.
Morreu a pessoa Marília Pêra. Ficamos com a memória da atriz Marília Pêra.
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