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Cinema

- Publicada em 08 de Dezembro de 2015 às 18:53

Verão revelador

Hélio Nascimento
Decidida a não ser apenas uma figura destacada na tela, Angelina Jolie está em seu terceiro longa-metragem e já trabalha no quarto título de sua carreira de diretora. O terceiro filme ora em cartaz, À beira-mar, na sua proposta mais visível, difere dos anteriores, nos quais a realizadora demonstrou domínio do ofício. O primeiro, Na terra de amor e ódio, reconstituía um episódio desenrolado durante a guerra na Bósnia. O segundo, O invencível, focalizava os sofrimentos e a resistência de um atleta olímpico feito prisioneiro pelos japoneses durante a Segunda Guerra Mundial. O novo trabalho altera o tom e busca referências em obras realizadas nas décadas de 1950 e 1960. O filme, de certa forma, não deixa de ser um ato de ousadia. Abandonando referências atuais, a realizadora, nesse seu estudo sobre uma tentativa de sobrevivência a partir da procura de isolamento, foi buscar pontos de apoio em obras da cinematografia italiana realizadas numa época em que não foram poucos os cineastas que se aproximaram do tédio e da incomunicabilidade para realizar obras definitivas sobre o espaço que separa seres humanos e obstáculos colocados em sua trajetória. O novo filme de Jolie é, além de ousado, ambicioso. Mas não chega a alcançar o nível que ambiciona, pois, em seu desenrolar e, principalmente, na solução que revela, mostra limitações que reduzem seu significado diante da estatura das obras das quais tenta se aproximar.
Decidida a não ser apenas uma figura destacada na tela, Angelina Jolie está em seu terceiro longa-metragem e já trabalha no quarto título de sua carreira de diretora. O terceiro filme ora em cartaz, À beira-mar, na sua proposta mais visível, difere dos anteriores, nos quais a realizadora demonstrou domínio do ofício. O primeiro, Na terra de amor e ódio, reconstituía um episódio desenrolado durante a guerra na Bósnia. O segundo, O invencível, focalizava os sofrimentos e a resistência de um atleta olímpico feito prisioneiro pelos japoneses durante a Segunda Guerra Mundial. O novo trabalho altera o tom e busca referências em obras realizadas nas décadas de 1950 e 1960. O filme, de certa forma, não deixa de ser um ato de ousadia. Abandonando referências atuais, a realizadora, nesse seu estudo sobre uma tentativa de sobrevivência a partir da procura de isolamento, foi buscar pontos de apoio em obras da cinematografia italiana realizadas numa época em que não foram poucos os cineastas que se aproximaram do tédio e da incomunicabilidade para realizar obras definitivas sobre o espaço que separa seres humanos e obstáculos colocados em sua trajetória. O novo filme de Jolie é, além de ousado, ambicioso. Mas não chega a alcançar o nível que ambiciona, pois, em seu desenrolar e, principalmente, na solução que revela, mostra limitações que reduzem seu significado diante da estatura das obras das quais tenta se aproximar.
Na primeira cena de À beira-mar, o casal na estrada é uma referência direta à obra-prima que Roberto Rossellini realizou em 1953, Viagem na Itália. O filme em questão não é apenas um dos maiores daquele cineasta: é um dos maiores de todo o cinema. Nele, o que o realizador pretendeu foi chegar a um nível de reconstituição do real que afastasse qualquer sinal de que algo está sendo encenado. Mesmo trabalhando com intérpretes famosos - Ingrid Bergman e George Sanders -, o diretor procurou impedir que qualquer traço do que se chama de intepretação aparecesse na tela. Na época, tal proposta causou estranheza, e o filme, hoje cultuado, foi recebido com restrições, por uma crítica que parece não ter prestado a devida atenção aos filmes que haviam inaugurado o neorrealismo realizados antes. Jolie também trabalha com intérpretes muito conhecidos, ela própria e o seu marido, Brad Pitt, mas o resultado não é o mesmo, pois a busca da realidade é prejudicada por imagens de amplas dimensões e pela busca da beleza plástica, ambas destinadas a realçar o cenário no qual a trama se desenrola. São inegáveis, também, outras referências. As cenas em que a protagonista pensa em suicídio - e depois retorna como se fosse um fantasma ao hotel - quase reconstituem alguns planos de A aventura, o filme no qual Michelangelo Antonioni deu início, em 1959, à sua trilogia sobre a incomunicabilidade. O segundo filme do tríptico, A noite, é outro cujo perfil pode ser percebido em À beira-mar.
Essas citações terminam por revelar que falta à realizadora aquela percepção que fez das obras lembradas momentos que, por vários motivos, honraram o cinema. Quando o casal chega ao hotel, a protagonista troca olhares com uma criança, o que coloca em cena o tema central. E a prática do voyeurismo possibilitada por imperfeição no isolamento entre dois apartamentos é uma clara volta ao passado, um regresso através de dados reais, algo que Antonioni havia utilizado no já citado A aventura. Mas a solução final faz com que todo o drama, ao contrário do que acontecia nos títulos que servem de modelo, tenha uma origem que exclui os antivalores que regem o mundo no qual vivem os protagonistas. Trata-se, apenas, de uma questão pessoal, que certamente nunca deverá estar ausente de uma narrativa, mas que não pode ser isolada de um cenário mais amplo. Mas o filme tem méritos. Voltar à obra dos mestres sempre é salutar, e, mesmo não inovando, a diretora mostra segurança e atenção para pequenos detalhes, como os óculos cuja posição é sempre corrigida pelo marido e por saber dividir a ação em três tempos: o passado pela contemplação do amor do outro casal, o presente no drama dos protagonistas e o futuro na figura do dono do restaurante.
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