Rodrigo Ferreira
Jayme Caetano Braun, nascido em 1924 em São Luiz Gonzaga, no Interior do Rio Grande do Sul, é considerado o maior expoente da poesia regionalista gaúcha e um dos principais nomes no cenário nacional. Ícone do tradicionalismo gaúcho, dá nome a diversos CTGs e ao concurso de poesia gauchesca organizado pela Estância da Poesia Crioula, organização que ajudou a fundar. Com extensa obra publicada até 1999, ano em que faleceu, também atuou como radialista.
Agora, a Esfera Editora de Artes começa a reeditar seus livros em belos volumes ilustrados com desenhos a carvão. O primeiro contempla ainda outro forte aspecto da carreira do escritor: a força de seus versos escritos e musicados. Para isso, o produtor cultural Sérgio Paiva, responsável pela iniciativa, reuniu o músico e violinista Lucio Yanel e o declamador e solista Adalberto Machado para gravar as poesias de Braun.
Segundo Paiva, os trabalhos do poeta se destacam pelo vocabulário, pela sonoridade e pelo uso da sextilha. "Ele canta a terra, esse vivenciar do gaúcho. O amor pela terra. Os utensílios que usa, os vícios que tem com um linguajar muito rebuscado." Há quem diga que sua poesia é um dos maiores repositórios de palavras e expressões gauchescas, palavras que não foram dicionarizadas.
A sonoridade de seus poemas, canções e payadas - ou pajadas, poesia improvisada, forma de repente cantado sobre uma base musical, no Sul, normalmente, a milonga - é, para Paiva, uma consequência do uso da sextilha, estrofe com rimas deslocadas, constituída de seis linhas ou seis versos de sete sílabas, em que rimam as linhas pares entre si, conservando as demais em versos brancos. O produtor remete o uso desse estilo pelo gaúcho à influência de José Hernandez, argentino.
"A obra do Jayme é a contemporaneidade do Martín Fierro", referindo-se ao personagem máximo do poeta argentino. Apareceu pela primeira vez em 1872, em El gaucho Martín Fierro, obra clássica considerada patrimônio cultural do país do Prata. Nesse livro, também construído em estrofes-sextilhas, Hernandéz conta a vida de um gaúcho da região dos pampas, utilizando a linguagem informal do cotidiano campeiro e emprestando à narrativa um caráter heroico. Não à toa, "Jayme é extremamente expressivo nos países do prata, que cantam a terra, que tem movimento o gaúcho".
No entanto, para o entrevistado, o talento do poeta é natural: "É como tu perguntar qual a formação do Vinicius de Moraes pra se tornar poeta? Vai dizer que ele era diplomata? Do Jayme pode-se dizer a mesma coisa. É um dom mesmo".
Questionado sobre a atualidade do trabalho de Braun, Paiva atesta: "é fundamental que todas as gerações compreendam a importância de sua contribuição para a identidade do gaúcho". Mesmo com as transformações que o Estado viveu nas últimas décadas, chegando a ter 85% de sua população vivendo em zonas urbanas, Paiva pondera: "se puxar pelo lado da Fronteira, onde ainda existe o latifúndio, a criação extensiva, as coisasnão mudaram muito". Assim a obra de Jayme Caetano Braun "reproduz uma ancestralidade", é um "processo de raiz". "Não é o maior historiador do gaúcho, mas é o maior poeta".
Nesse sentido, escreve Paulo Bentancur em texto de apresentação das novas edições: "Jayme canta a dor e a alegria - mais a dor que a alegria - de ser gaúcho numa terra de gaúchos, sim, mas sofrendo uma espécie de desterro cronológico, já que terra e tipos apresentam-se ameaçados pelo estigma de terem sobrevivido mais como símbolo de um mundo vencido pelo tempo".
O lançamento do primeiro volume da obra essencial, que reúne os dois primeiros livros do autor, De fogão em fogão e Brasil Grande do Sul, acontece hoje, a partir das 19h, na Livraria Cultura do Bourbon Country (Túlio de Rose, 80), com coquetel, declamação e apresentação musical. A entrada é franca.