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Política

- Publicada em 23 de Novembro de 2015 às 22:16

Leis de mineração têm que mudar, diz Feldmann

Mariana se equipara a casos Chernobyl e Exxon, afirma Fabio Feldmann

Mariana se equipara a casos Chernobyl e Exxon, afirma Fabio Feldmann


FREDY VIEIRA/JC
Lívia Araújo
Para o ex-deputado federal Fabio Feldmann (PSDB-SP), que atualmente é consultor na área ambiental, apesar do caráter recente da ruptura da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, na cidade mineira de Mariana, o impacto do dano já pode ser classificado entre os cinco piores desastres ecológicos do mundo. A gravidade do fato, avalia, pode servir como um marco divisório no setor de mineração no País. “Vamos ter um antes e depois de Mariana. Isso vai exigir que se reveja a legislação, e obriga o Parlamento a agir com um mínimo de decência e responsabilidade em relação a esses temas”, avalia.
Para o ex-deputado federal Fabio Feldmann (PSDB-SP), que atualmente é consultor na área ambiental, apesar do caráter recente da ruptura da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, na cidade mineira de Mariana, o impacto do dano já pode ser classificado entre os cinco piores desastres ecológicos do mundo. A gravidade do fato, avalia, pode servir como um marco divisório no setor de mineração no País. “Vamos ter um antes e depois de Mariana. Isso vai exigir que se reveja a legislação, e obriga o Parlamento a agir com um mínimo de decência e responsabilidade em relação a esses temas”, avalia.
Feldmann, que além de três legislaturas na Câmara Federal, já foi secretário do Meio Ambiente de São Paulo durante o governo de Mário Covas e secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (criado em 2000, na gestão do tucano Fernando Henrique Cardoso), também não espera menos que o protagonismo do Brasil na 21ª Conferência do Clima (Cop21) que começa em Paris na próxima segunda-feira. Disso depende, segundo ele, a competitividade econômica do País. “Se o Brasil não se preparar para uma economia de baixo carbono, vai encontrar ainda mais dificuldades”, avalia, em entrevista ao Jornal do Comércio.
O tucano esteve em Porto Alegre na semana passada, para o Fórum dos Grandes Debates, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul.
Jornal do Comércio – Como acha que será a participação brasileira na Conferência do Clima em Paris, nesta semana?
Fabio Feldmann – Espero uma liderança do Brasil, primeiro no sentido de ter um acordo internacional, e que ele seja ambicioso, para que alcance a meta de não superar o aumento de 2º C. Espero que o País mantenha o protagonismo e assuma a liderança, que é a expectativa que se tem.
JC – E o País tem condições de assumir essas metas?
Feldmann – O Brasil tem uma vantagem, que é a redução do desmatamento. Isso dá um “colchão” grande para outras áreas. Mas eu acho que o Brasil terá que ser mais ambicioso do que sua proposta para o clima. A questão do carbono será claramente de competitividade. E o Brasil, se não se preparar para uma economia de baixo carbono, vai encontrar ainda mais dificuldades do que já encontra atualmente.
JC – Nossa classe empresarial já caminha em direção a isso ou ainda se apega a uma visão mais conservadora?
Feldmann – Há uma divisão, no Brasil, entre um setor empresarial mais cosmopolita e outro mais conservador. Acho que o setor empresarial deve assumir um protagonismo até porque isso pode afetar a competitividade no Brasil diante de mercados internacionais. Acho que, no caso de Mariana, isso afetará a mineração no Brasil e no mundo. Vamos ter um “antes e depois de Mariana”.
JC – E qual sua percepção?
Feldmann – Esse desastre, que ainda não conseguimos avaliar, está provavelmente inscrito entre os cinco maiores desastres do mundo, como o de Chernobyl, o da Exxon Valdez, no Alasca, o da British Petroleum no Golfo do México. Portanto, ele vai trazer graves consequências, algumas até positivas, pois teremos de passar a limpo o setor de mineração no Brasil.
JC – A regulação do setor deixa a desejar atualmente?
Feldmann – Eu ainda estou um pouco confuso, porque a Samarco não é uma empresa de fundo de quintal. Ela é considerada uma referência na área ambiental e que tem folga financeira... é muito difícil compreender o que aconteceu. Não era um período de chuvas, com volume de água anormal. Mas o que aconteceu é tão trágico, que vai exigir que se reveja a legislação, licenciamento ambiental... no caso da lei de mineração, a última versão tinha tirado do texto a parte que trata de sustentabilidade. Agora isso vai voltar, porque o desastre mostrou claramente a necessidade de uma legislação que trate dessa matéria com precisão, preveja consequências, garanta monitoramento e fiscalização. Acho que o desastre já mudou o que se previa para o Código de Mineração. Isso obriga o Parlamento a agir com um mínimo de decência e responsabilidade em relação a esses temas.
JC – Como está o Brasil na questão ambiental atualmente, em sua opinião?
Feldmann – De uns anos para cá, do ponto de vista político, os desafios relacionados à questão ambiental são muito mais difíceis do que eram há alguns anos. O melhor exemplo é a discussão do código florestal. Aqueles que se sentem prejudicados pela questão ambiental têm hoje uma capacidade muito maior de articulação e de utilização de recursos. Por outro lado, à medida em que esse tema ganhou a agenda política do mundo, especialmente no campo da mudança do clima, surgiram também novas alianças entre a sociedade civil e um setor empresarial mais cosmopolita. Então hoje o cenário é muito mais complexo.
JC – E como avalia o tratamento dado ao tema pelo nosso Parlamento e o governo federal?
Feldmann – Acho que o Parlamento no Brasil, nos últimos anos, perdeu muito a qualidade, pois os parlamentares, em função do financiamento das campanhas, estão muito mais comprometidos do que eram antigamente. Eu fui deputado em três legislaturas... hoje acho mais difícil, inclusive, porque há menos gente, menos parlamentares comprometidos com causas. Há deputados que eu considero distritais, que representam regiões ou municípios, e você tem muitos poucos parlamentares, como foi o meu caso, de “bandeiras”. Para a nossa área, de interesses difusos, como meio ambiente e questões indígenas, é muito mais difícil. Mas, por outro lado, os governos, que respondem à comunidade internacional, têm que defender nossos temas.
JC – Mas defendem?
Feldmann – Olha, em algumas situações, sim. Na questão do código florestal, o governo Dilma teve um papel importante, e eu não sou petista. Em determinados momentos, o governo tem que interferir. Quando o Brasil vai mal na área dos direitos humanos, quando há retrocessos, a pressão normalmente vem sobre o governo, o que o obriga a ter posições mais avançadas e isso é importante para nós, porque deixa o governo como avalista desse tema no Congresso. Mas isso não quer dizer que ele tenha capacidade de mobilizar suas bancadas.
JC – No caso do Executivo, tivemos declarações recentes da ministra da Agricultura, Kátia Abreu, contra o “preconceito” em relação ao uso de agrotóxicos.
Feldmann - Às vezes o governo fica dividido. A Kátia Abreu é um bom exemplo disso. Eu devo confessar que achava que, quando a Kátia Abreu virasse ministra da Agricultura, ela moderar seu discurso, exatamente por estar no governo, mas isso estranhamente não aconteceu. Ela continua com posições um pouco fora da linha, até em conflito com posições que são do próprio governo. Mas isso também é típico de um governo como o da Dilma, que tem muitos problemas, que é muito fragmentado. No caso da Kátia Abreu há outro aspecto: a agricultura de baixo carbono está virando um item importante da agenda mundial, o que obrigará a agricultura brasileira a se adaptar, porque depende de exportação. E o setor poderá perder mercado.
JC – Mas a atuação da bancada ruralista vai no sentido de manter os usos tradicionais do setor, a exemplo da lei que retira a rotulagem de transgênicos dos gêneros alimentícios.
Feldmann – Mas aí eles estão brigando também com o consumidor, pois se esquecem de que o consumidor é hoje muito mais exigente do que era anos atrás. Tanto que, no caso da agricultura, você vê que o espaço que os orgânicos estão tendo. Mas as bancadas, especialmente a ruralista, que é poderosa em qualquer governo, tem se marcado por posições muito conservadoras e arcaicas, até mais do que na época da Constituinte. Isso é um risco, pois eles vão acabar se prejudicando, porque tanto o mercado internacional quanto o doméstico têm um consumidor que faz opções em direção à sustentabilidade, cada vez com menos agrotóxicos, menos consumo de água, fertilizantes... eles estão olhando para trás e não para a frente. Mas a coisa é muito dividida... você tem o ministro Roberto Rodrigues (da Agricultura, 2003 – 2006), que é muito mais cosmopolita que a Kátia Abreu, que acho que não representa tanto a agricultura quanto fazia algum tempo atrás.
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